Foi a “maior concentração alguma vez registada de delegações estrangeiras” em Luanda para um evento, descreve a Presidência de Angola ao final do primeiro dia da sétima cimeira União Africana (UA) – União Europeia (UE).
Mais de 80 delegações estão presentes nos trabalhos de menos de 48 horas que assinalam 25 anos de relações entre os dois blocos que, unidos, representam 1,9 mil milhões de habitantes e 40% dos membros das Nações Unidas. “No transcorrer deste quarto de século, o conhecimento mútuo aprofundou-se, a cooperação bilateral solidificou-se e a parceria que mantemos ampliou-se para todos os campos e setores de interesse mútuo, com resultados que nos animam a seguir em frente, pois os bons resultados estão à vista e o futuro afigura-se cada vez mais promissor”, refletiu João Lourenço, Presidente da República de Angola e de Presidente em exercício da União Africana.
“Luanda ergue-se hoje como uma tribuna de esperança e o símbolo do querer e da vontade africana de estabelecer com a Europa relações que se aprofundem continuamente em busca de benefícios para ambos os lados, neste mundo cada vez mais conturbado que enfrenta desafios complexos que a todos afetam, marcado pelas crises de segurança, alimentar, energética, humanitária e sanitária, arrastando consigo as migrações em massa e o desemprego global”, acrescentou.
Copresidido pelo Presidente da República de Angola e pelo presidente do Conselho Europeu, António Costa, o encontro de altos dirigentes europeus e africanos trouxe, logo nas primeiras horas, a reafirmação do compromisso de investir 150 mil milhões em África até 2027 pela UE.
“Há 25 anos, na nossa primeira Cimeira do Cairo, a Europa e África decidiram construir em conjunto um futuro comum. Hoje, em Luanda, celebramos o espírito do Cairo. Estamos a levar a parceria única entre a Europa e África para o próximo nível. Com novos projetos no âmbito do Global Gateway, o plano de investimento da Europa para um mundo mais interligado, abrimos uma nova era no comércio e na cooperação entre os nossos dois mercados”, afirmou a Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. Através da estratégia comunitária Global Gateway, criada em 2021, o bloco já mobilizou 120 mil milhões de euros para 138 projetos em setores estratégicos como a energia verde, corredores de transporte, digitalização, sistemas de saúde, educação, entre outros.
Momentos antes, na abertura da cimeira ao lado de João Lourenço, Ursula von der Leyen e Mahamoud Ali Youssouf, Presidente da Comissão Africana, António Costa felicitou Angola pelos 50 anos da sua independência (e pela Presidência, “altamente bem-sucedida, sublinhou, da União Africana), mas também Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe, recordando “a luta de libertação dos povos africanos”.
“Acelerou a queda da ditadura no meu país e a queda da ditadura no meu país acelerou os processos de independência. Sem a queda da ditadura nunca o meu país seria membro da União Europeia e eu hoje não poderia estar aqui lado a lado com o Presidente da República de Angola. Foi este processo gémeo de libertação que nos aproximou e é essa experiência viva que nos deve inspirar e levar a União Europeia e a União Africana a um futuro partilhado de sucessos e intensa cooperação”, refletiu o político português, perante representantes de mais de 80 delegações.
E acrescentou: “as colónias europeias terminaram, mas infelizmente os efeitos do colonialismo não terminaram nessa altura e isso deve-nos inspirar a trabalhar em conjunto, porque só em conjunto podemos trabalhar para uma paz e uma prosperidade através do multilateralismo”. Lembrando, também, a cimeira do Cairo, António Costa diz que dela surgiu “uma nova dimensão estratégica à parceria global entre África e Europa para o século XXI, num espírito de igualdade, respeito, aliança e cooperação”.
“Uma verdadeira parceria de continente para continente, de povos para povos”
“Hoje podemos afirmar com orgulho que juntos concretizámos essa ambição. Temos agora uma verdadeira parceria de continente para continente, de povos para povos. Uma parceria que vai muito além das nossas duas Uniões, envolvendo também a sociedade civil, os parlamentos, o setor privado e, especialmente, a nossa juventude”, continuou, olhando para a “jovem geração africana” – “criativa, dinâmica e em rápido crescimento – como “um dos maiores trunfos para o nosso futuro partilhado”.
Segundo António Costa, a visão conjunta para 2030, que assenta “num compromisso para construirmos um futuro pacífico, próspero e sustentável, defendendo e melhorando o multilateralismo”, “é hoje mais relevante do que nunca”.
O governante socialista disse, ainda, que África e Europa “partilham a responsabilidade de fazer ouvir as suas vozes e de moldar uma governação global mais justa”. “Temos estado lado a lado na defesa de uma representação mais forte de África nas instituições internacionais. Juntos, garantimos a adesão da União Africana ao G20 e, pela primeira vez este ano, houve uma reunião do G20 organizada em África, pela África do Sul”, recordou.
Na cimeira, dois dias após o G20, que decorreu em Johanesburgo, João Lourenço recordou algumas das preocupações manifestadas na 4.ª Conferência Africana sobre o Financiamento das Infraestruturas em África. “Abordámos não apenas a necessidade urgente de garantir um acesso mais justo de África aos mercados globais de capitais, mas também a necessidade de se promoverem soluções lideradas por africanos no âmbito de parcerias público-privadas, no do investimento estrangeiro em infraestruturas no continente africano, de modo a tornar as nossas economias mais robustas, mais competitivas e com maior capacidade de se inserirem na economia global”, explicou.
Por sua vez, o presidente da Comissão da União Africana (UA), Mahmoud Ali Youssouf, defendeu mais transparência no acesso ao capital, denunciando desigualdades nos custos para empreendedores africanos e para empreendedores de outras regiões. Segundo o diplomata do Djibouti, o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial e a Organização Mundial do Comércio (OMC) concedem mais empréstimos, assistência financeira e ajudas na promoção do livre comércio à Argentina “do que todos os Estados africanos”. “Não é normal”, lamentou. Youssouf insistiu que “a sustentabilidade da dívida é uma questão essencial para o futuro das economias africanas”.
África ainda sem representação permanente no Conselho de Segurança da ONU: “injustiça histórica”
Também presente, António Guterres, secretário-geral da ONU, reiterou, à imagem do que tem feito em várias ocasiões, que África deve ter assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Uma mudança “fundamental para corrigir uma injustiça histórica e reforçar a capacidade do Conselho de entregar paz ao mundo”, afirmou. Guterres alertou, ainda para a instabilidade global que marca estes tempos, associada a uma multipolaridade emergente, aumento das desigualdades, crises ambientais e retrocessos na paz e segurança internacionais.
Para Guterres, a “multipolaridade em si não é garantia de paz e prosperidade”. Além disso, voltou a pedir alterações profundas na “injusta e ineficaz” arquitetura financeira internacional.
Luanda acolhe discussões sobre processo de paz da Ucrânia
António Costa e Ursula von der Leyen pronunciaram-se sobre as negociações de paz na Ucrânia, falando num novo “ímpeto”, apesar de “algumas questões ainda terem de ser resolvidas”. Mas a “direção é positiva”. “Um envolvimento europeu eficiente e coordenado, bem como uma forte presença europeia em Genebra, permitiram-nos fazer progressos significativos nas negociações para uma paz justa e duradoura na Ucrânia”, revelou Von der Leyen.
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