A criação de Alice, um dos primeiros aviões movidos a eletricidade, poderia ser um mote para o país das maravilhas de Lewis Carroll. Atravessando a toca do coelho branco, o tempo passa e os aviões são agora elétricos e o passaporte de Alice é israelita mas também português.
Com um portefólio recheado em Portugal, onde surgem nomes como TAP, CaetanoBus, Comboios de Portugal, Embraer e EMEF, a empresa AlmaDesign ficou responsável pelo interior de um dos aviões mais disruptivos desta década e da próxima.
O Jornal Económico falou com o diretor executivo da empresa de design, Rui Marcelino, que assumiu a felicidade de fazer parte do projeto. “Independentemente de aparecermos mais ou menos nas notícias, saber que estivemos envolvidos na estrela do Paris Air Show é um orgulho gigante”, garantiu o responsável.
“O contacto foi feito na conferência Future of Transportation sobre novas propulsões” há alguns anos. Com diversas apresentações em Paris, Rui Marcelino e Omer Bar-Yohay, fundador da Evation, trocaram cartões e surgiu a possibilidade de uma parceria. Por a Eviation ser uma startup “com alavancagem de dinheiro”, o diretor executivo brincou e apresentou a Alma Design como uma startup de 22 anos.
Apenas com o exterior de Alice construído e apresentado, Omer deixou um livro aberto para ser preenchido. No entanto, havia critérios a preencher. “Havia uma série de especificações escritas: nove pessoas, portanto, nove lugares, espaço para piloto e co-piloto, mesma frescura e modernidade de um avião que vai ser elétrico e inovador”, sublinhou o português ao JE. Por ser elétrico e ecológico, Rui percebeu que este tinha de ter um aspeto premium para quem aprecia e valoriza a mobilidade mais sustentável. “Num projeto destes não podemos começar por baixo”, explicou.
Unicamente com o espaço dos passageiros para decorar, a equipa de Rui Marcelino foi dando provas de que estavam à altura do desafio. Iniciaram-se com a introdução da iluminação e dos bancos e após provas, a Eviation disse à equipa portuguesa que o avião tinha de ser vista como um todo e que o ambiente tinha de ser todo integrado e apresentar a mesma imagem.
Além da Alma, o diretor executivo afirma que a Alice foi construída com 80% de indústria nacional, “com peças desenvolvidas, engenharizadas e construídas por empresas portuguesas”. “Temos uma responsabilidade enorme em partilhar com os outros o que se faz bem em Portugal. Como português acredito na capacidade das nossas empresas e do que os nossos técnicos conseguem fazer”.
A Alice foi apresentada no passado mês de julho, sendo um projeto “que demorou cerca de um ano e meio a estar concluído”. Após a apresentação mundial e encomendas no valor de dois dígitos, Rui Marcelino sustentou que “aquilo que mais nos pode satisfazer é ver as coisas que fizemos e que batalhámos para ser úteis a proporcionarem uma melhor experiência de mobilidade do que aquela que havia antes”.
Questionado sobre a diferença da Alice para os restantes aviões inovadores, o responsável da Alma sublinha que disponibilizaram uns assentos diferenciadores “que rodam para a janela e para o meio do corredor, o que significa que se fica com mais espaço e que há mais visibilidade para o exterior” da aeronave.
Rui Marcelino tece ainda diversos elogios ao apoio do fundador da Eviation ao longo do projeto. “A Eviation é uma equipa especial. É bem montada em termos de financiamento e estão e fazer um avião elétrico pela primeira vez em termos mundiais”, sustentou, afirmando em tom de brincadeira que a equipa “lhe chama o Elon Musk dos aviões”, devido à sua “visão espetacular”.
Com cada unidade avaliada em quatro milhões de dólares, que equivale a 3,5 milhões de euros, a empresa gerou algum barulho na indústria. Os custos de operação da aeronave são inferiores aos praticados, fixando-se perto dos 200 dólares por cada hora de voo, enquanto as turbinas dos aviões regulares custam mil dólares.
O primeiro voo da aeronave já está agendado para este ano, embora a produção só se deva iniciar em 2021, no Arizona e em Washington. Esta ‘máquina’ tem um alcance de 1.046 quilómetros com uma única carga disponível na bateria, o que por enquanto serve apenas para pequenas viagens, mas pode dar uma vantagem ao mercado aéreo de passageiros.
Apesar desta aeronave ser mais lenta do que as convencionais movidas a combustível fóssil, a empresa admite que não fica longe dos modelos de turbo-propulsor, sendo possível chegar ao destino a horas certas.
Tendo a Cape Air como primeiro cliente, foi concordado um número de dois digítos de encomendas, sendo que Rui sabe que foram mais de 10 aviões encomendados. Sabe-se que a United Continental Holdings e a JetBlue Airways Corp também estão na corrida para assinar com os israelitas.
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