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Vacinação dos jovens. A antecâmara para a vacinação obrigatória em Portugal?

A vacinação dos jovens contra a Covid-19 que foi determinada não deixa de corresponder apenas à abertura de uma opção, ou seja, a possibilidade dos jovens, querendo, poderem ser vacinados, não existindo no atual quadro legal em vigor a possibilidade de impor obrigatoriamente essa vacinação contra a Covid-19.
30 Agosto 2021, 07h15

Neste período de férias escolares, a primeira “novela” de Verão prendeu-se com a vacinação dos jovens dos 12 aos 15 anos e os sucessivos avanços e recuos sobre esta matéria por parte da DGS. Reconheço que existe uma invariável incerteza científica no que concerne à Covid-19, uma vez que, a velocidade com que o vírus se propagou a nível global cria forçosamente um grau de incerteza maior, nomeadamente devido ao facto da necessidade que existiu em acelerar o processo de investigação, produção e administração de vacinas a nível global, muito para além do que seriam os timings normais de um processo desta natureza.

Em jeito de aparte, queria deixar uma palavra de apreço ao Miguel Albuquerque, o nosso Presidente do Governo Regional da Madeira, que no meio de uma gestão de uma pandemia sem precedentes, tem demonstrado ser o protótipo do governante moderno, acima de tudo, por ter sido corajoso e ter confiado no seu bom senso para tomar as decisões que precisavam de ser tomadas, no momento em que precisavam de ser tomadas. Foi assim quando tomou a decisão de encerrar o aeroporto da Madeira no auge da primeira vaga (altura em que o desconhecimento sobre o vírus era quase total), quando implementou um programa de testagem massiva à população madeirense que permite que qualquer residente possa ser testado a cada período de duas semanas de forma gratuita e, agora, quando determinou a possibilidade de se proceder à vacinação dos jovens dos 12 aos 15 anos na Madeira, mesmo antes da orientação da DGS (que recentemente veio a acontecer).

Não me irei obviamente pronunciar sobre as valências técnicas da vacinação, mas não posso deixar de concordar com a ideia, em abstrato, de recorrer às “armas” que temos ao nosso dispor contra o vírus da Covid-19, agora, de modo a nos preparamos da melhor forma possível para o início do novo ano letivo. E essa preparação do ano letivo por intermédio da vacinação dos jovens, de facto, só poderia ocorrer agora em agosto, de modo a evitar os constantes isolamentos profiláticos de turmas inteiras e a forte perturbação que tal representa no nosso sistema de ensino no seu todo e para a sociedade civil em geral.

A vacinação dos jovens contra a Covid-19 que foi determinada não deixa de corresponder apenas à abertura de uma opção, ou seja, a possibilidade dos jovens, querendo, poderem ser vacinados, não existindo no atual quadro legal em vigor a possibilidade de impor obrigatoriamente essa vacinação contra a Covid-19.

Não obstante, também não nos podemos esquecer que em Portugal existe vacinação obrigatória contra a difteria e o tétano e também não podemos deixar de ter presente que um português para se matricular num estabelecimento de ensino ou fazer um exame em tal estabelecimento de ensino tem de comprovar que foi vacinado contra a difteria e o tétano.

Poderá a vacina contra a Covid-19 seguir o caminho da obrigatoriedade em Portugal?

De um ponto de vista técnico-jurídico diria que sim, que existe essa possibilidade técnica, não obstante, existem um conjunto de questões e dúvidas que a implementação da vacinação obrigatória encerra de um ponto de vista constitucional, decorrente do confronto entre direitos constitucionais que nesta matéria podem vir a ser considerados antagónicos, nomeadamente a inoculação forçada poder-se considerar que constitui uma violação da dignidade da pessoa humana, e por outro lado, se poder entender que a imposição da vacinação obrigatória poderia decorrer do direito de proteção da saúde que incumbe ao Estado implementar e assegurar, até porque, de um ponto de vista técnico, poderá ser chave para se alcançar a tão almejada imunidade de grupo.

Poder-se-á até defender que é benéfico para a sociedade proceder-se à discussão na sociedade civil sobre a vacinação obrigatória em detrimento de tal imposição tácita, ao impor, na prática, testagens sucessivas para atos simples na sociedade, como frequentar um restaurante ou ir a um bar em zonas geográficas do país consideradas como sendo de risco elevado.

Em suma, naturalmente que a imposição de uma vacinação obrigatória e universal poderá levantar legítimas dúvidas quanto à necessidade, eficácia e proporcionalidade da medida, não obstante, poder-se-á admitir que, em sectores e atividades específicas, alicerçado em raciocínios escrutinados de proporcionalidade e adequação, a vacinação obrigatória possa surgir em segmentos identificados e mais vulneráveis da nossa sociedade, sendo que, para esse efeito, terá sempre de existir um instrumento legislativo para o efeito, discutido e aprovado na Assembleia da República, que é e continua a ser, o centro da nossa democracia.

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