Um estudo recente revelou que, em Portugal, um terço do total de pobres (32,9%) tem trabalho e salário certo no final do mês. Visto noutra perspetiva, 11% dos trabalhadores portugueses vivem no limiar de pobreza, ou seja, com menos de 540 euros líquidos por mês. E a maior parte destes trabalhadores pobres até tem vínculos estáveis, muitos há mais de 10 anos. Estes números retratam a insuficiente valorização do trabalho no nosso país e as dramáticas consequências sociais dos baixos salários.

Até à liberalização do comércio internacional, a competitividade das empresas portuguesas resultava, em muitos casos, do baixo custo do fator trabalho, aliado a uma moeda com fraco valor cambial, o escudo. Com a entrada em força no mercado global de produtos provenientes de países com salários ainda mais baixos, como a China, e mais tarde com a introdução do euro, o tecido empresarial português teve de encontrar fatores de competitividade (qualidade, design, inovação, branding, tecnologia, etc.) alternativos ao preço dos bens e serviços.

Em muitos setores e empresas foi, de facto, possível subir na cadeia de valor e gerar maior valor acrescentado. Ainda assim, os salários permaneceram genericamente mais baixos do que os praticados nos nossos parceiros europeus, em particular nos setores de mão-de-obra intensiva. Os ganhos remuneratórios dos últimos anos resultaram, sobretudo, da subida do salário mínimo definida a nível governamental. Mas, como o estudo indica, pagar salários mínimos não chega para garantir padrões de vida dignos, para além de não resolver o problema da falta de competitividade do tecido empresarial.

As empresas queixam-se, e com razão, que não podem pagar bons salários devido à carga fiscal sobre o trabalho, aos custos de contexto e à baixa produtividade laboral. Por conseguinte, a promoção de remunerações mais dignas deve passar pela melhoria do ambiente empresarial, e não apenas pela imposição anual de uma subida do salário mínimo.

Para termos bons salários, é preciso baixar a fiscalidade sobre as empresas (em particular a TSU), aliviar os custos de contexto (eletricidade, telecomunicações, combustíveis, transportes, licenciamentos, litígios, etc.) e aumentar a produtividade do trabalho. Isto sem esquecer que, do lado dos empresários, tem de haver sensibilidade social e consciência cívica para estabelecer políticas salariais mais justas.

Importa acrescentar, a propósito, que a produtividade por cada hora laboral em Portugal representa apenas 65% da média dos países da UE. Isto significa que o nosso país tem de fazer, neste indicador, um grande esforço de convergência em relação aos seus parceiros comunitários. Sendo certo que, entre nós, a falta de produtividade não radica no absentismo ou na indolência dos trabalhadores.

Na economia portuguesa trabalha-se arduamente e durante mais horas do que na maioria dos países europeus (média de 40,8 horas cá e de 40,2 horas na UE). Portanto, o problema está na formação dos trabalhadores e também na organização, eficiência e flexibilidade das empresas, ou seja, na qualidade da sua gestão, que ainda é tendencialmente baixa.

É necessário otimizar todos estes fatores – fiscalidade, custos de contexto, formação e gestão –, de forma a adotarmos um paradigma salarial que dignifique o trabalho e, por esta via, não só combata a pobreza como reforce a competitividade. Enquanto os salários forem baixos, as empresas não têm incentivos para introduzir tecnologia ou investir em inovação. Vão continuar orientadas para o mercado de volume, ao invés de apostarem no valor acrescentado dos produtos – fator que depende muito do capital humano e do seu grau de satisfação profissional.