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Venda de barragens da EDP: “Estamos a analisar esta operação”, revela diretora-geral da AT (com áudio)

Helena Borges está a ser ouvida no Parlamento na sequência de um requerimento apresentado pelo PS para esclarecimentos sobre eventual existência de planeamento fiscal abusivo no trespasse da concessão de seis barragens no Douro entre a EDP e a Engie. Diretora geral da AT escuda-se no sigilo fiscal para falar no caso em concreto, mas garante que fisco está a analisar a operação e que usará os mecanismos legais para atuar caso seja necessário liquidar impostos em falta.
14 Abril 2021, 12h15

A diretora-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), Helena Borges, assegurou hoje no Parlamento que a operação de trespasse da concessão de seis barragens no Douro entre a EDP e a Engie está a ser analisada pela administração fiscal e que o fisco usará todas as prerrogativas que a lei lhe confere para atuar no caso de ser necessária a liquidação de eventuais impostos em falta. A garantia surge no âmbito da polémica venda das barragens da EDP aos franceses, depois das suspeitas de “borla fiscal” denunciadas pelo PSD e BE num negócio que, dizem, devia ter-se traduzido em 110 milhões de euros em impostos.

“Estamos a analisar esta operação como outras com características similares ou diferentes. Surpreende-me quando oiço dizer que a AT verifique esta operação. Nunca esteve em causa”, afirmou Helena Borges na audição na Comissão de Orçamento e Finanças (COF) onde está a ser ouvida nesta quarta-feira, 14 de abril, para esclarecer se houve ou não planeamento fiscal agressivo ou abusivo no negócio de venda das seis barragens da EDP à francesa Engie por 2,2 mil milhões de euros.

A responsável da AT sublinhou, porém, aos deputados que na sua intervenção na COF não poderia falar sobre casos concretos devido ao sigilo fiscal. Ainda assim alerta: “não podendo responder diretamente a algumas questões que o senhor deputado coloca, digo, sim, a AT está a tratar do tema e usaremos todas as prerrogativas que a lei nos confere”, numa alusão, por exemplo, a uma eventual ação contra planeamento fiscal abusivo através aplicação da cláusula anti-abuso que é aplicada a este tipo de negócios.

A resposta de Helena Borges foi dada ao deputado do PS, João Paulo Correia, que questionou a diretora da AT quanto à atuação do fisco neste negócio, nomeadamente se vai intervir aquando da entrega da declaração da modelo 22 do IRC, referente a 2020, pela EDP, ou se já foi aberta alguma ação inspetiva a esta operação.

A diretora geral da AT explicou aos deputados que “este tipo de operações é objeto não apenas de análise da operação em concreto” como também a AT tem os seus recursos “a fazer o acompanhamento das operações dos setores que atual no mercado”.

Já em resposta ao deputado do PSD, Afonso Oliveira, que questionou Helena Borges sobre o papel da AT nesta operação, nomeadamente quando ao pagamento do Imposto do Selo quando foi concretizada a venda das barragens, a responsável sublinhou que o fisco não pode ter qualquer intervenção sem dispor primeiro de informação completa sobre o negócio. “A informação que dispomos em relação a operação pode não ser completa, por isso, não podemos afirmar se enquadra ou não no artº 60 do Estatuto dos Benefícios Fiscais [cuja alteração no OE/2020 isentou de Imposto de Selo a transmissão de concessões no caso de reestruturações empresariais], porque não temos todos os elementos”.

Decisões da AT precisam de ser fundamentadas

Helena Borges vincou ainda a necessidade de fundamentação da ação do fisco: “devemos ter presente que atos de liquidação que envolvam operações com características como as que se discutem hoje exigem fundamentação dos actos tributários”, acrescentando que “há atos preparatórios que são decisivos para a fundamentação que tem de ser sólida e robusta”.

A responsável da AT sublinhou ainda ter “pleno conhecimento” do que são as obrigações da administração tributária, mas avisou: “temos de escolher o momento para agir para ter segurança que a decisão é suficientemente sólida”, lembrando que este tipo de questões é “normalmente nos tribunais que depois se fixa o direito”.

Helena Borges frisa aqui que “cada vez que a AT intervém também tem de assumir as suas responsabilidades e se a decisão não for suficientemente fundamentada pode ser lesiva para o interesse público”.

Partidos unânimes no pedido de esclarecimentos

Os deputados da Comissão de Orçamento e Finanças aprovaram a 30 de março por unanimidade o requerimento do PS para audição urgente da diretora-geral da AT sobre esta questão.

Além do IS, os deputados querem saber se há outros impostos a serem pagos no âmbito desta operação, como o IMT, IMI, imposto de selo ou IVA, e qual o valor a que vão ter direito os municípios onde estas barragens do Douro estão localizadas. O Movimento Cultural da Terra de Miranda (MCTM) acusa o Executivo de dar uma “borla” fiscal à EDP que ronda os 300 milhões de euros na sequência da venda de seis barragens transmontanas.

No requerimento, os deputados do PS sublinham ser “crucial esclarecer e concluir se houve ou não planeamento fiscal agressivo ou abusivo na transmissão dos títulos” das barragens e justificam a chamada de Helena Borges por caber à AT “inspecionar o negócio”.

“A EDP e a Engie adotaram um modelo de negócio para a transmissão dos títulos de utilização dos recursos hídricos das seis barragens do Douro no valor de 2.200 milhões de euros”, refere o requerimento, assinalando que o negócio ficou concluído no final de 2020, tendo sido “sujeito a um modelo que consideramos complexo e, no mínimo, criativo”.

Os deputados do PS referem ainda que a comissão de Orçamento e Finanças já ouviu, no âmbito deste processo de venda, o presidente executivo da EDP, Miguel Stilwell d’Andrade, mas consideram que o gestor “foi incapaz de dar respostas claras que contribuíssem para o esclarecimento da operação”.

Em 13 de novembro de 2020 foi anunciado que a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) tinha aprovado a venda de barragens da EDP (Miranda, Bemposta, Picote, Baixo Sabor e Foz-Tua) à Engie.

A EDP concluiu, em 17 de dezembro, a venda por 2.200 milhões de euros de seis barragens na bacia hidrográfica do Douro a um consórcio de investidores formados pela Engie, Crédit Agricole Assurances e Mirova.

O negócio tem levado os partidos da oposição a lançar várias dúvidas, nomeadamente sobre o facto de a EDP não ter pagado o Imposto do Selo no valor de 110 milhões de euros.

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