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“Web Summit pede-nos esforço de 90 milhões”

Jorge Rocha de Matos defende a urgente negociação de uma solução provisória para o alargamento da FIL no Parque das Nações, de forma a responder às necessidades do Web Summit. Para o presidente da Fundação AIP, só será possível construir o projeto de expansão definitivo da FIL durante um período dilatado de 10 anos. Será um investimento, faseado, de 150 milhões de euros, incomportável se for concentrado em três anos.
  • Cristina Bernardo
30 Junho 2019, 08h00

Jorge Rocha de Matos defende a urgente negociação de uma solução provisória para o alargamento da FIL no Parque das Nações, de forma a responder às necessidades do Web Summit. Para o presidente da Fundação AIP, só será possível construir o projeto de expansão definitivo da FIL durante um período dilatado de 10 anos. Será um investimento, faseado, de 150 milhões de euros, incomportável se for concentrado em três anos.

Em ano é que a Fundação AIP acabará de pagar a dívida bancária que constituiu para construir as atuais infraestruturas de feiras e congressos que tem em Lisboa?
Era em 2020. Mas em 2010 tivemos de renegociar financiamentos, quando percebi que íamos entrar numa espiral de crise e complicações. Mas, para não entrarmos em incumprimento, fizemos um acordo com o sindicato bancário, com moratória de capital, continuando a pagar juros, com 1% de penalização. Perguntaram-nos quando é que voltávamos a pagar capital. Disse-lhes que nunca antes de 2018. Dada a situação do país, foi o que nos pareceu adequado. Em 2014 começamos a negociar com os bancos a reestruturação do capital cujo contrato acabava em 2020. Nós sabíamos que não conseguíamos pagar até 2020 e por isso estudámos o tipo de reestruturação que poderíamos fazer. Em 2017 e 2018, com as sucessivas mudanças de administrações na CGD – eram umas atrás das outras –, não foi nada fácil. Acordámos que o capital que deveria acabar a amortização em 2020 fosse reestruturado até 2033. As fichas técnicas foram rubricadas pelas partes e começamos a amortizar capital a partir de 1 de janeiro de 2018. Temos cumprido rigorosamente os pagamentos de capital e juros.

A actividade de congressos e feiras já recuperou a quebra dos tempos da crise?
Durante a fase da crise, a Fundação registou quebra na faturação, que passou de 38,4 milhões em 2011 – em 2012 não fizemos o consolidado –, para 18,9 milhões em 2013, mas ainda baixou para 13,8 milhões em 2014, e melhorou para 22,3 milhões em 2015, para voltar a cair para os 17,1 milhões de euros em 2016. É preciso ter em conta que nos anos ímpares temos eventos bianuais que implicam vendas mais elevadas. Nos anos pares, o desempenho é inferior. Em 2017 subiu para 25,98 milhões. Em 2018 estabilizou nos 25,67 milhões. Sobre o EBITDA, note-se que em 2011 tivemos um EBITDA de 4,6 milhões e em 2013, quando começamos a reestruturação, o EBITDA ficou negativo, caindo para 328 mil euros negativos e em 2014 para 815 mil euros negativos, mas em 2015 voltamos a ter um EBITDA positivo, com 2,7 milhões de euros, subindo para 4,5 milhões de euros em 2016 e 8,3 milhões de euros em 2017. Face aos resultados operacionais de 96 mil euros registados em 2011, depois de passada a crise e o processo de reestruturação, em 2017 multiplicámos por 59 esses resultados operacionais, pois registamos 5,7 milhões de euros em resultados operacionais em 2017, semelhantes aos que foram obtidos em 2018, que foi o ano em que a Fundação AIP confirmou o sucesso dos ajustamentos que fez anteriormente no seu processo de reestruturação. É pertinente notar que na comparação das vendas com os resultados, confirma-se que em 2017 e 2018, com menos faturação que em 2011, a Fundação AIP teve melhores EBITDA, resultados operacionais e resultados líquidos, o que significa que o modelo da reestruturação funcionou.
Tivemos de ir preparando a organização, o grupo, para os novos desafios. Não há resposta adequada se não tivéssemos recursos humanos preparados para estes desafios. Negociámos com os trabalhadores perto da idade próxima da reforma, entre saídas e acordos de saída – pagámos 900 mil euros em compensações para que o período de reforma pudessem ter compensações. E fomos admitindo pessoas altamente qualificadas. Entre 30 novas pessoas recrutadas, só duas é que não ficaram. O ordenado mínimo situa-se nos 950 euros. Atualmente temos 170 trabalhadores no total.

As instalações de feiras e congressos tem capacidade para crescer ou estão saturadas?
A capacidade das nossas instalações ainda tem uma folga, pois não está completamente esgotada, temos uma folga de 20% nas feiras e nos congressos estamos a 30% da utilização total das instalações. Desde 2015 que fazemos congressos na FIL. É altura de atrair para a cidade de Lisboa grandes eventos internacionais que possam tirar partido de toda a imagem muito favorável que o país começa a ter, beneficiando da situação geográfica de Lisboa e da afabilidade das pessoas, do clima ameno que temos, e da situação da cidade virada para o estuário do Tejo e para a orla marítima Atlântica.

Relativamente à Web Summit, o seu responsável Paddy Cosgrave, exige um maior investimento na FIL?
O modelo de crescimento da Fundação AIP pretendia fazer crescer as instalações da FIL num horizonte de 10 anos. Numa lógica que nos parece certa, conforme íamos descendo o nosso endividamento, íamos fazendo novos investimentos, de forma a acomodarmos o novo investimento sem acumularmos um custo financeiro excessivo. Face às necessidades da Web Summit, constatamos que o nosso modelo não estava preparado para a área total pretendida. Em termos efetivos, pedem-nos para antecipar a oferta de instalações até 2022. Mas primeiro temos de ver como é que é o financiamento. Nós não temos condições para fazer isso. O nosso projeto de crescimento é faseado a 10 anos e aí estamos preparados para o enfrentar. Mas uma antecipação terá custos acrescidos que nós não temos condições de enfrentar.

Custos acrescidos de que ordem?
A antecipação das instalações significa qualquer coisa como 90 milhões de euros.
Qual é o total dos custos previstos?
O que estava inicialmente previsto eram 150 milhões de euros. Note-se que esta antecipação não ia alterar esses 150 milhões. Simplesmente ia concentrar em três anos um valor de 90 milhões de euros que antes ficava distribuído ao longo de vários anos.

Com a sobrecarga de 90 milhões em três anos, como ficará o projeto de expansão da FIL?
Continuamos a fazer o nosso projeto de expansão da FIL na linha programada a 10 anos. O ano de 2019 pode implicar uma diferente base negocial, em tempo – que ainda estamos a negociar – por isso defendo que temos de encontrar soluções transitórias que permitam responder às necessidades do Web Summit, e que não sejam já com instalações definitivas. Portanto, precisamos de soluções de transição. Entre os quatro pavilhões da FIL há espaços abertos consideráveis, que podem ser fechados. Cada pavilhão tem 10 mil metros quadrados e as áreas abertas entre pavilhões têm cerca de 3000 metros quadrados, o que corresponderá a um total de 12 mil metros quadrados nos espaços que queremos aproveitar para fechar, o que equivale a mais do que a área atual de cada pavilhão. Defendo que temos de encontrar uma solução transitória para que possamos utilizar os atuais espaços abertos entre pavilhões. Isso é importante porque o Web Summit é feito em novembro, numa altura do ano em que pode chover. Outra fase de crescimento da FIL passa por construir um primeiro andar por cima da zona lateral comum aos quatro pavilhões, o que representa uma área total de mais 16 mil metros quadrados, ou seja, mais de um pavilhão e meio, e que fica abaixo da cércea dos pavilhões. Essas alterações permitirão passar dos atuais 41 mil metros quadrados para 73 mil metros quadrados com estas duas obras.

Mas estas obras farão parte do projeto definitivo?
Sim. São o projeto definitivo. Mas até lá teremos de encontrar soluções provisórias.

Além dessas duas obras ainda falta área construída…
Sim. Até aos 110 mil metros quadrados. Para isso teríamos de utilizar a praça Sony, que é de uma das nossas participadas, para interligarmos todo o projeto.

Quanto tempo levará a construir todo esse projeto?
Para nós, 10 anos.

Mas a Web Summit têm um cronograma diferente…
São 90 mil metros quadrados até 2023. Significa que nós vamos atrair para a cidade de Lisboa novos eventos que podem significar, em 2025 e 2026, mais dois terços das atuais vendas. As atuais vendas de 2018 são 25,6 milhões. A Fundação AIP contribui para Lisboa, em média, com 135 milhões de euros por ano ao nível do Valor Acrescentado Bruto, o que, segundo o relatório da BDO, tem um impacto complementar dos expositores e um impacto indireto nos consumos de restaurantes, transportes, hotelaria, – de 135 milhões por ano – mas também tem um contributo para impostos, numa média anual de 28 milhões. Tudo isso dá sustentabilidade a 5700 postos de trabalho permanentes.

De que forma se pode resolver a área em falta à Web Summit?
Pura e simplesmente numa coisa: substituir por soluções precárias. Atinge-se o mesmo resultado, possivelmente com menos qualidade.

Antes de construir as soluções definitivas, terá sempre um ónus com as soluções precárias?
Parte desse ónus é partilhado. Somos uma fundação de utilidade pública e pagamos impostos, temos uma benesse relativamente ao imposto do selo, que é comum a todas as fundações, mas pagamos IRC, pagamos a segurança social dos nossos colaboradores, que é a nossa obrigação, pagamos a componente do IRS correspondente à parte da entidade patronal, e pagamos IVA. Temos muitas responsabilidades e muitos valores a pagar, por isso não podemos abrir mão das instalações. Não podemos dizer: os pavilhões da FIL estão aqui, usem-nos. Porque depois não teríamos dinheiro para pagar ordenados, nem o IVA.

Este projeto de expansão já foi autorizado?
O projeto ainda não está formalmente entregue na CML. Quando a praça Sony foi adquirida e paga à Parque Expo, o objetivo era fazer um centro de congressos. A ideia era termos um centro de congressos a Oriente e outro a Ocidente. No meio, ficava o vértice de Sete Rios com o grande fluxo hoteleiro da cidade de Lisboa, para instalar as pessoas que vêm aos congressos e às feiras. Nós estamos disponíveis a avançar com este processo, mas precisamos de ter uma fase transitória. Isso obriga a entendimentos entre as partes. O Conselho de Administração da Fundação AIP está disponível e interessado em contribuir para isto. Estamos a negociar com a entidade que tem sido nossa parceira desde o tempo de Jorge Sampaio na CML. O nosso interlocutor privilegiado é a CML.

Lisboa precisa de ter quantos eventos, além da Web Summit?
Lisboa precisa de mais 38 eventos ao longo do ano. É esse o nosso objetivo. Para que o pico de novembro da Web Summit possa ser diluído ao longo dos meses do ano, garantindo maior estabilidade às atividades económicas da cidade de Lisboa e para que, ao mesmo tempo, aquilo que é o turismo tradicional possa ter uma mudança qualitativa substancial. A qualificação mais pertinente nesta evolução é o turismo de negócios, que são os grandes eventos. Um congressista hoje, vai ser um turista amanhã, porque trará a mulher e os filhos. Não podemos esquecer que este janeiro, comparativamente com igual mês do ano passado, tivemos uma descida no turismo.

Como serão esses 38 eventos?
Não quer dizer que sejam da dimensão do Web Summit, que tem uma característica específica, porque não é igual à esmagadora maioria dos eventos que nós temos. Na área médica, por exemplo, temos as 16 mil pessoas que vêm a Lisboa ao congresso da Diabetes, durante cinco dias. O grande encontro internacional dos Rotários reuniu 28 mil pessoas. Um evento com 20 mil pessoas por dia, em cinco dias são 100 mil pessoas.

Artigo publicado na edição nº 1993, de 14 de junho do Jornal Económico

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