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Webinar Especial Fraude e Corrupção: todas as respostas

O Jornal Económico, em parceria com a EY, realizou no dia 21 de maio um webinar sobre o mais recente survey global EY sobre fraude e corrupção. A emissão, em direto, contou com a presença de Pedro Subtil, partner da EY. Se não teve oportunidade de acompanhar, ou se algumas questão ficou por responder, veja aqui as respostas às perguntas.
28 Maio 2018, 07h15

1) De uma forma global este estudo diz que a fraude e a corrupção nos negócios não diminuíram nos últimos dois anos, porquê?

De facto Os números são alarmantes. O estudo acaba por remeter as conclusões para temas de integridade, valores e ética para quem trabalha nas empresas. Mas pode haver aqui outra hipótese que é se de facto não estamos a ter uma justiça mais atuante com muito mais fiscalização e mais mediatização dos casos. Isto pode levar à percepção de que o fenómeno está a alastrar e não está a ser contido, apesar de todas estas multas que têm sido aplicadas.

2) É importante fazer essa diferenciação, não estamos a falar necessariamente de números reais, mas sim da percepção das pessoas que participaram neste inquérito.

Exatamente. Não se trata de um estudo quantitativo, é um estudo de percepções. Nós em Portugal entrevistámos 50 empresas e basicamente o que perguntámos foi num conjunto de dimensões quais as opiniões em relação a este tema da fraude e corrupção. Este estudo revela que este fenómeno não tem vindo a ser travado mas há outras entidades que corroboram isto. O Banco Mundial também tem produzido estatísticas neste sentido, a própria Transparency Internacional, outro indicador olhado nestes temas, também comprova isto.

3) A verdade é que a fiscalização e a regulamentação estão a aumentar. Mas então o que é que está a falhar no seu entender?

Pode haver aqui duas leituras. A primeira é um desfasamento entre aquilo que é a produção de novas leis e a sua interiorização por pare das empresas. Há sempre aqui um desfasamento de 2 a 4 anos. Tipicamente o que as empresas fazem tratam de reforças a sua política de procedimentos ou tratam de dar alguma formação, mas pouco mais do que isto até haver multas. E mais do que as multas, a sua publicitação. Este é o fator que leva as empresas a fazer algo de mais estruturante, ou seja, sempre que há algum dano da reputação, aí sim tentam mudar alguma coisa. A outra tem a ver com os programas de compliance das empresas, nem sempre esta informação é transversal a toda a empresa.

4) Ou seja, os colaboradores não estão em linha com aquilo que são as normas e as orientações da empresa.

Muitas vezes há essa distorção e nós reparámos nisso no estudo. Áreas de compliance, auditoria interna têm presentes estas noções, mas quando falamos com áreas de marketing ou comerciais, não têm a mesma percepção. Há aqui uma distorção entre o que é a intenção da administração e a prática dos colaboradores.

5) O que é que as empresas podem fazer para prevenir práticas de corrupção, visto que as formações tradicionais já não surtem efeito?

As formações são necessárias mas não suficientes. É necessário introduzir novos mecanismos, como os códigos de conduta, mas não fazer simples cópias. Há que dar vida a esse código, comunicá-lo e introduzir sanções quando não é cumprido.

Outros mecanismos têm a ver com canais de denúncia. Tipicamente, são uma fonte privilegiada para garantir a identificação de casos, garantindo o anonimato das denúncias. São exemplos do que complementa a formação.

6) Quando diz que as sanções existem, elas devem ser aplicadas para não haver a sensação de impunidade?

Sim, é correto. Aliás, no estudo 78% acham que há penalizações, mas depois quando lhes foi perguntado se presenciaram essas penalizações, só 54 % é que confirmaram. Mais um desfasamento entre aquilo que acham que a empresa vai fazer e o que realmente acontece.

7) Não lhe parece que há aqui uma questão de base, que tem a ver com educação e ética? Como é que isto se ensina a adultos que já estão no mercado de trabalho?

O estudo aponta precisamente para a ética e integridade. Isto começa em casa com a educação e no ensino, também. O Conselho de Prevenção à Corrupção em Portugal tem tido muito mérito ao desenvolver ações educativas, mas é preciso fazer mais. As empresas precisam passar esta mensagem e dar o exemplo a partir de cima e praticá-lo.

8) Vocês têm até uma frase no estudo muito interessante: “Fazer o que é correto porque é correto e não porque o código de conduta impõe”.

É esse o ponto. As pessoas precisam de interiorizar estes valores, não apenas para evitar qualquer tipo de sanção.

9) Estamos habituados a ver Portugal na cauda da Europa e somos os primeiros a dizer mal do próprio país. Mesmo sem ver os números, parece-me óbvio que a corrupção em países africanos, por exemplo, devem ser muito mais elevados que em Portugal. Podem confirmar?

Os estudos reconhecidos internacionalmente apontam para isso. Neste estudo, a amostra que utilizámos foi de 55 países e só tinha 3 países do continente africano. Desses 3 países a percepção não tem a ver com os 38 % a nível global, mas sim com 86%. Portanto, nos países africanos este índice de percepção é muito mais elevado.

10) Pode acontecer que a percepção seja muito diferente da realidade ou vice versa?

Pode acontecer, sim. Nalguns países africanos o suborno faz parte de alguma forma de fazer negócios. É cultural e é muito difícil explicar a uma pessoa que aquilo não é uma conduta correta.

11) Quanto tempo demora a alterar essas práticas?

Várias gerações e passa muito pela educação, começando em casa, ensino e depois as próprias empresas.

12) Portugal é realmente um país de corruptos ou a ideia que temos de nós próprios é pior do que a realidade?

Olhando para os índices, nós estamos em linha com a média europeia. O que pode estar a acontecer neste momento, é um enorme número de processos, sem precedentes em Portugal, e uma grande mediatização. Essa mediatização tem influência na percepção das pessoas. No entanto, estamos em linha com os níveis da Europa e dos países desenvolvidos. Numa escala de 180 países estamos na posição 29. Não é uma situação alarmante.

13) Na minha opinião, em Portugal é muito fácil passar dinheiro por baixo da mesa para fugir aos impostos e conhecemos casos de empresas que o fazem para ganhar contratos.

A fuga aos impostos é cada vez mais difícil com a nossa máquina fiscal. Quanto ao passar dinheiro por baixo da mesa para ganhar contratos, infelizmente detectámos isso. 13% dos inquiridos considera normal pagar para ganhar um negócio. Isto é grave e esta situação é ainda mais preocupante nas gerações mais novas.

14) Os millenials. Poderá aqui criar uma questão ética?

Nós assistimos a estas gerações muito ligadas ao mundo digital, que nem lhes passa pela cabeça ter de pagar para fazer download de música e filmes. Isso causa um dano preocupante. A longo prazo mais ainda, se mantiverem esta atitude quando estiverem à frente de empresas.

15) Um dos fatores que em Portugal pode contribuir negativamente para estes valores, é o facto de não existir uma entidade independente com poderes de fiscalização e penalização.

Nós temos em Portugal o Conselho de Prevenção à Corrupção, ligado ao Tribunal de Contas, que neste momento só produz recomendações e orientadas ao sector público. Mas era necessário ter uma entidade independente, ligada ao Ministério da Justiça, que pudesse não só produzir recomendações, como fiscalizar e sancionar. Há muitos países que avançaram nessa linha. O mais recente é a França que criou a agência anti corrupção. Produziu regras que são obrigatórias e quando não cumpridas são alvo de penalização. Porventura, isto é um instrumento que poderá vir a existir em Portugal para ajudar a dissuadir este fenómeno.

16) Há muitos anos que em Portugal o chico espertismo é corrente, infelizmente os grandes nunca são apanhados porque têm bons advogados e os mais pequenos é que sofrem.

Cada vez menos, a ver pelos casos em aberto e pelas pessoas que já foram condenadas, cada vez menos isso é verdade. Estou de acordo que era uma percepção no passado, mas não hoje em dia.

17) Já falámos na morosidade da justiça, que cria um sentimento de impunidade junto de algumas empresas. Há alguma forma de contornar essa tendência?

As leis existem e enquadram este tipo de crimes. Ainda na semana passa o Presidente da República reforçou a importância da revisão das leis anti corrupção. Acredito que haja falta de meios para tantos casos, mas tem sido uma justiça mais atuante. A questão de valores é essencial e tem de ser abordada. No final do dia são as pessoas que contam e são elas que vão ajudar a combater esse fenómeno.

18) Ouvimos dizer que a lei vai mudar e que há mudanças que terão de ser implementadas. Eu tenho um pequeno negócio e não posso suportar tais custos, qual a alternativa?

Olhando para o tecido empresarial português em que cerca de 80& são pequenas e médias empresas, não há estrutura para implementar uma área d compliance ou auditoria interna. A ajuda será de associações sectoriais como a ASAE, a ANACOM, o IMPIC. Serão elas a suportar as PMEs, visto que as grandes empresas, sim, têm capacidade de implementar programas de compliance.

19) Muitas vezes os pequenos negócios, nem sabem por onde começar….

É certo. Aí passa muito pelo exemplo que dão aos seus colaboradores sobre o comportamento e conduta. Se os empresários tiverem um comportamento menos ético, quem está nessa estrutura, poderá seguir esse exemplo e ser influenciado.

20) Como é que têm evoluído os índices de uma forma geral, visto que este já é o 15o estudo realizado pela EY?

Não têm evoluído de forma positiva. Nós temos alternado entre um estudo global e um estudo regional, que abrange basicamente a Europa, África e Médio Oriente. Quer na perspectiva global, quer na perspectiva regional, os indicadores não têm vindo a melhorar. O fenómeno da corrupção sempre existiu, mas agora com mais escrutínio, dá-se um aumento da percepção.

21) Qual o verdadeiro papel dos organismos nacionais, como o Observatório de compliance, criados para combater práticas fraudulentas? Têm poder judicial ou atuam apenas no reforço da aplicação das leis?

Só no reforço da aplicação das leis, na divulgação, sensibilização, organizam fóruns para discussão, Vai haver um esta semana, precisamente para debater esta questão. Têm por isso um papel muito válido na divulgação destas mensagens. Não têm um papel sancionatório.

22) Segundo o vosso estudo, o uso cada vez maior de tecnologias nas empresas torna-as mais expostas a práticas de fraude e corrupção. Em que medida?

As empresas estando mais conectadas, ficam mais vulneráveis aos chamados ciber ataques. Por isso, a digitalização do mundo dos negócios, poderá ser uma fonte de maior risco. No nosso estudo isso é comprovado. Quando perguntámos às pessoas quais eram os principais ricos, os ciber ataques aparecem em terceiro lugar.

23) Esse risco é tanto maior quanto maior for a empresa?

Sim. Mais conectada, mais interação com mais clientes e, portanto, mais risco de ataques que poderão vir de qualquer país. Esta digitalização traz muitas vantagens, mas acarreta riscos. O maior deles vem de fora. Eu diria que os riscos internos sempre existiram, mas os que vêm de fora são sempre mais graves.

24) 11% das empresas admite ter tido casos de fraude nos últimos dois anos. Olhando assim, nem parece uma percentagem muito grande, mas estamos a falar de casos graves.

Casos graves e que são de conhecimento, porque há muita fraude que não é detetada. Poucas são as empresas que já possuem canais de denúncia de forma anónima.

25) É possível aferir quais os sectores de negócio que estão mais expostos a fraude e corrupção?

Estudos internacionais apontam à cabeça o sector financeiro, depois o sector público, depois indústria, depois saúde e retalho. Por esta ordem. São os mais sensíveis a este tipo de crimes.

26)  Em relação aos subornos e práticas de corrupção, quais os países que se destacam pela negativa?

Aparece logo o Brasil, depois a Colômbia, vários países da América Latina. Depois olhando para outros índices aparece África, Ásia, América Latina. Nos países desenvolvidos esta percepção está nos 20% e nos emergente é mais do dobro com 52%.

27) Entre os jovens abaixo dos 35 anos parece haver uma maior aceitação para práticas de corrupção. Para desenvolver mais esta questão, como é que se explica esta abordagem? É porque estamos a competir à escala global?

Sim, há mais pressão, maior competição, maior descompromisso com interesses comuns. É muito alarmante que 1 em cada 5 jovens considere normal estas práticas. Mais grave ainda é em tempos de crise. O combate volta a ter início na educação em casa, no ensino e os governos terá de criar meios de atuação eficaz. Depois as empresas terão de ter mecanismos próprios de combate.

28) Pelos números que aferiram ficaram com a sensação de que há um sentimento geral de impunidade dentro das empresas?

Sim, 78% consideram que serão aplicadas sanções, mas ao perguntar se tinham conhecimento que isso tinha ocorrido, só 57% é que responderam sim. Em Portugal foi ainda mais baixo, com 40%.

29) Nas práticas fraudulentas admitidas pelos inquiridos, quais as que se destacam?

Estamos a falar de alterações de report financeiro, reconhecimento antecipado de receitas, prolongar o prazo de report para inclusão de mais receitas etc. São muito relacionadas com temas financeiros.

30) No que toca às tecnologias, muitas delas como a Inteligência Artificial, já são de uso comum nas empresas, de que forma vão ajudar no combate à fraude e corrupção?

Os mecanismos tecnológicos estão a evoluir. Por exemplo, as análises massivas de informação com o intuito de detectar padrões de fraude já estão a ser utilizadas nalgumas empresas. A Inteligência Artificial já permite dar orientações às áreas de negócio. Há todo um conjunto de novas tecnologias que estão a ser positivamente incorporadas.

31) Falando em lei, o RGPD (Regulamento Geral da Proteção de dados) é uma ameaça ou uma oportunidade para as empresas?

É uma oportunidade. Há um conjunto de requisitos que visam salvaguardar a informação de clientes e há que ter mecanismos de governance e utilização devida. Na minha opinião é um benefício.

Em Portugal, importa saber quem vai supervisionar a aplicação da proteção de dados. A CNPD já veio dizer que não tem meios suficientes. Este enforcement tem de ser claro para haver cumprimento.

32) Olhando para o futuro, o que será necessário mudar no compliance para acompanhar a evolução dos sistemas de negócio?

Eu diria que a simples existência de uma área de compliance é importante para sectores que, até agora, não tenham este tipo de áreas intermédias. Garantir o cumprimento de regulamentação é essencial. A evolução da compliance deve passar por ser mais interventiva e ajudar as áreas de negócio. Ser mais proativa e utilizar algumas das tecnologias disponíveis que aqui foram faladas.

 

Este conteúdo patrocinado foi produzido em colaboração com a EY.

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