“Apesar do aumento da mobilidade [dos capitais], há um processo internacional no sentido de remover ocultações e promover a troca de informação”, sobre os caminhos que seguem os rendimentos tributáveis – tanto do capital como do trabalho – quando atravessam a fronteira do país de origem disse Fernando Rocha Andrade, deputado do PS e ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
Falando no 3º Congresso Luso-Brasileiro de Auditores Fiscais e Aduaneiros, na qual o Jornal Económico é media partner, Rocha Andrade recordou que, apesar disso, o problema atual, ou um deles, é que a desmaterialização de alguns ativos – marcas e patentes, por exemplo – que não têm uma um posicionamento físico conhecido. A tendência para a desmaterialização da economia fará com que estes exemplos sejam replicados”, o que torna a coleta fiscal um enorme problema.
E, para já, Rocha Andrade não tem na manga uma resposta a este problema, num mundo em que os capitais viajam por todo o lado e o modelo progressivo de tributação deixou de fazer qualquer sentido, recordou A possibilidade de deslocalização dos rendimentos para paraísos fiscais não permite nenhuma boa resposta para a falência daquele modelo.
Mariana Mortágua, deputada do Bloco de Esquerda, recordou outro problema – que também tem a ver com justiça fiscal: a ‘intromissão’ do objetivo da competitividade da máquina fiscal como um elemento diferenciados do posicionamento de determinado país face aos seus ‘concorrentes’.
E afirmou que é neste quadro que, apesar de tudo o que se sabe sobre paraísos fiscais, eles continuam a existir: “toda a gente é contra os paraísos fiscais, menos contra o seu próprio paraíso fiscal”, disse, para se referir ao ‘off shore’ da Madeira.
Mariana Mortágua referiu-se também à questão dos perdões fiscais, que “perceciona que não existe justiça fiscal”. “Tudo isto é um regime transversal de injustiça”, afirmou.
Num painel constituído apenas por deputados – prestes a correr para o Parlamento por causa da votação sobre a lei da eutanásia – Mariana Mortágua recordou que a crise que a Europa viveu a partir de 2008 fez com que a tributação do capital conseguisse uma vez mais distanciar-se da tributação do trabalho.
“É preciso encontrar uma forma de taxar progressivamente todo o património: trabalho, propriedade e capital”, afirmou. Para isso é preciso um acordo internacional alargado; limitar a livre circulação de capitais; taxar o rendimento onde ele é gerado; e a troca de informações são respostas possíveis (em conjunto ou separadamente) a esse desafio.
A ex-ministra das Finanças do PSD, Maria Luís Albuquerque, preferiu ater-se à decisão política que está por trás da decisão sobre impostos. “Vamos buscar impostos às pessoas para quê? Responder a esta pergunta faz parte da justiça fiscal”. O problema, como recordou, é que a resposta não é nem linear nem tão pouco consensual, mas “é cada vez mais relevante”.
Mas a deputada do PSD regressou à questão da mobilidade do capital tributável, para recordar que o rendimento do trabalho também já é igualmente deslocalizado com enorme dificuldade, “o que até hoje não acontecia, o que vai dar um novo quadro à competitividade fiscal”.
Divergindo de Mariana Mortágua, Maria Luís Albuquerque recordou que é necessário introduzir um elemento de pura praticabilidade: é a competitividade fiscal que permite que o bolo fiscal seja (ou não seja) suficiente para cobrir todas as necessidades sociais, pagas pelo Orçamento do Estado.
Pelo CSD estava Francisco Mendes da Silva, que, não sendo deputado, tem responsabilidades no partido em matéria fiscal. “Não sabemos do que falamos quando falamos de justiça fiscal”, disse. O sistema fiscal português é hoje um aglomerado de soluções avulsas, onde a justiça fiscal é apenas o pretexto para o crescimento da acumulação de dinheiro do lado do Estado”.
“Faltam critérios mais objetivos”, recordou, para introduzir uma verdadeira perceção de justiça no sistema. Perceção, disse ainda, que pode ser desfeita com os impostos indiretos. A justiça fiscal progressiva é, no seu entender, um embuste, uma vez que alguns dos seus pressupostos não são verdadeiros. Se a isso se acrescentar a morosidade dos tribunais – para onde segue qualquer litigância entre ‘tributador e tribitado’ – a justiça fiscal não passa de uma utopia.
Ao contrário, “a política fiscal é um poderoso instrumento para introduzir justiça social e retributiva”, disse por seu turno o deputado do PCP Paulo Sá. Nesse quadro, “a questão fundamental é a distribuição da carga fiscal e como ela se reflete no rendimento” e “não a discussão sobre o aumento ou diminuição de umas décimas a cada ano”.
E é aí que os rendimentos de capital, tributáveis autonomamente, e os rendimentos mais elevados não são tributados da forma, segundo o PCP, que deveria a mais justa. “Um elemento central do caminho para a justiça fiscal é englobar todos os rendimentos”, sem que sobre qualquer deles incidam especificações que reduzem a base tributária e reduzem a justiça fiscal.
Da mesma forma, a tributação do património, “feita de forma imperfeita ou inexistente, é também um elemento de injustiça fiscal”, afirmou Paulo Sá. “Há uma grande imperfeição no que tem a ver com a tributação do património”, parte dela já tendo sido sanada. Mas é no património mobiliário que ainda há muito a fazer, “o que exigirá concertação internacional”. “É difícil, mas não impossível”, concluiu.
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