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Portugal sem dívida? Economista defende novo modelo de crescimento

O especialista norte-americano em economias sustentáveis, Robert Young Jr. apresentou pela primeira vez o seu plano de desenvolvimento interno independente em Portugal. Em entrevista ao Jornal Económico, o economista explicou como é que Portugal vê o país a ser economicamente auto-sustentável e a pagar a dívida pública em 25 anos.
Rafael Marchante/Reuters
14 Junho 2017, 09h50

O que é um modelo económico auto-sustentado? Como é que funciona?

O nosso modelo baseia-se numa abordagem sistémica ao desenvolvimento doméstico, no qual se investe nas nossas comunidades para assegurar que temos energia limpa, água e ar, bem como que as pessoas estão ativamente a trabalhar num modelo de crescimento sustentável ao longo tempo. Por exemplo, em vez de toda a gente gastar dinheiro em energia importada, o que resulta numa saída de capitais de Portugal e oferta de lucros a estrangeiros, podemos criar os nossos próprios sistemas de produção de energia, que resulta na manutenção do capital em Portugal.

Lucramos com o investimento em fontes de energia próprias. Este modelo é agora muito mais praticável graças a avanços tecnológicos para a geração de energias renováveis e à crescente importância de eliminar os combustíveis fósseis para limitar as alterações climáticas. Este mesmo pensamento aplica-se a sistemas de água, agricultura e produção alimentar, assim como à forma como gerirmos desperdícios.

Como ou porque é que deu atenção a Portugal como opção para um modelo económico auto-sustentado?

Por uma série de razões, Portugal está em posição de liderar a realização deste modelo. Primeiro, Portugal tem uma abundância de recursos que podem gerar energia, água e alimentos para toda a gente. Segundo, Portugal está a emergir de um período de investimento que foi profundamente não sustentável, resultando em níveis de endividamento enormes e em falta de crebilidade. Como resultado, estamos tanto mais vulneráveis como mais pobres. A experiência deste processo criou uma atitude que procura ir numa direção melhor, de investir de formas que fortalecem Portugal e asseguram que temos capacidades de continuar a crescer de forma sustentável no futuro.

Terceiro, Portugal é uma nação pequena e o tamanho é uma oportunidade para fazer coisas novas mais rapidamente e de forma mais eficiente do que regiões maiores como a Europa inteira ou os EUA. Finalmente, este trabalho emergente relaciona-se com a história de Portugal. Através da exploração e coragem, Portugal liderou a ascensão das sociedades ocidentais, que proporcionou a Renascença e séculos de prosperidade. Consideramos que tal liderança é necessária, mas desta vez para investir internamente na nossa própria prosperidade.

O que é que a experiência em Oregon diz sobre o modelo? O que é que foi alcançado? Quais foram os desafios?

Oregon conseguiu implementar algum deste desenvolvimento doméstico e os seus primeiros sucessos refletiram o facto de ser um local de pequena dimensão e com abundância de recursos. Através de uma liderança empenhada, conseguiu rapidamente mostrar que investimentos em desenvolvimento sustentado resulta em prosperidade económica e em qualidade de vida para os cidadãos. Preparam-se novas leis e direcionam-se os recursos para este novo modelo, e o sucesso segue-se.

Queremos, no entanto, enfatizar que a experiência de Oregon oferece tanto lições sobre o sucesso como realça onde é que os esforços podem ficar àquem do potencial. Aprendemos muito com os nossos esforços iniciais que não foram bem-sucedidos e essas lições ajudam a clarificar a nossa visão para o futuro.

O que é necessário fazer em Portugal para que se possa pagar a dívida soberana em 25 anos, como refere ser possível?

Primeiramente, e mais importante, Portugal tem de se comprometer com um modelo de crescimento circunspecto e sustentável. Portugal precisa de criar um novo enquadramento para a educação e para o trabalho, que possa responder às suas necessidades e acrescentar valor que possa ser usado para resolver a dívida ao longo do tempo.

É importante enfatizar que o modelo económico do passado é que criou esta dívida, retirando recursos e lucros para benefício de financiadores distantes. Jovens e educados portugueses foram encorajados, e até forçados, a abandonar o país por forma a procurar avançar na carreira e assegurar um futuro. Estas dinâmicas criaram uma espiral negativa que só poderia resultar em dívida e dependência.

Segundo, Portugal tem de adotar imperativos de sustentabilidade e auto-confiança, e fazê-lo no âmbito do enquadramento europeu. Sabemos que o futuro se vai basear em abudância de recursos renováveis que estão disponíveis em Portugal. Mas o nosso sistema antigo não encoraja ou oferece essa verdade. Portugal pode e deve investir em novas e mais limpas infraestruturas e negócios que apresentem, a longo-prazo, prosperidade sustentável nas nossas comunidades. Temos de assumir responsabilidades por criar esses investimentos.

Como vê os mais recentes desenvolvimentos na economia portuguesa? Que estratégias são ainda necessárias?

A comunidade internacional reconheceu a beleza de Portugal e o dinheiro que acompanha essa atenção, principalmente no setor do turismo, está a começar a criar valor. No entanto, sem que seja tomada atenção, este fluxo interno de pessoas e de capitais pode ser direcionado de forma errada para ativos em Portugal detidos por estrangeiros. Essa propriedade tende a ser de natureza ausente e vê o valor simplesmente de extrair lucros para fora de Portugal, em vez de criar riqueza dentro das comunidades.

Os portugueses são uma representação fantástica da integração de vários povos, mas os capitalistas globais que procuram comprar e deter ativos em Portugal não estão interessados em ser integrados como parte da cultura portuguesa. A ironia desta dinâmica tem de ser realçada. O que atrai este investimento é distintamente português, mas o investimento externo massificado e a extração de lucros diminuem o carácter único da cultura e da beleza do local.

As mais-valias portuguesas encontram-se na sua cultura e nas suas pessoas. Este novo modelo pode elevar essas qualidades e princípios. A nossa abordagem foca-se diretamente em pôr essas qualidades únicas no centro do modelo económico para que a economia trabalhe para as pessoas, em vez de serem as pessoas a trabalharem para a economia.

O seu modelo económico foi apresentado ao Presidente da República e ao primeiro-ministro no final de 2016. Qual foi a reação?

Recebemos o reconhecimento das nossas propostas iniciais e garantiram-nos que serão analisadas. Estamos à espera de resposta e começámos a procurar oportunidades e a construir relações próximas de trabalho com líderes locais que estão empenhados no novo modelo.

Finalmente, como é que Portugal pode mudar o mundo, outra vez?

Portugal pode voltar a liderar o mundo, mostrando características de paz e tolerância, que são vitais para a nossa governança e para a nossa economia. O nosso sucesso vai depender no investimento nos jovens, cuidando daqueles que precisam de assistência e lembrando que até mesmo os pais do capitalismo sabiam que os valores eram centrais para o empreendimento. Durante os tempos de austeridade, a mais humilde das sociedades teve de suportar um grande fardo. Mostraram que conseguiam carregar esse fardo e a nossa função é reconhecer e premiar a fé em Portugal, tornando este país inclusivo e sustentável para todos. É agora o momento.

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