Nos últimos anos têm surgido vários partidos novos em Portugal, ou tentativas de os criar, mas os casos de sucesso (designadamente a eleição de deputados à Assembleia da República) têm sido raros. Como é que se explica esta dificuldade de entrar no sistema político-partidário? “Em muitas democracias, as leis eleitorais foram desenhadas para evitar muitos partidos, ou seja um sistema partidário fragmentado, mas não foi o caso português. No nosso caso, com 3% ou 4% e voto concentrado chega-se ao Parlamento. Temos cinco partidos médios e grandes. À esquerda, a diversidade impera. À direita, menos, mas o facto de existirem já dois tem bloqueado o aparecimento de outros. Repare-se que várias iniciativas ao centro também falharam. Até agora, crises de confiança e outras não deram origem a novos partidos. Aparentemente, os portugueses preferem a abstenção ao voto de protesto”, explica o politólogo António Costa Pinto.
Da mais recente fornada, há algum novo partido ou movimento que terá condições para singrar no futuro próximo? “À direita, talvez. São 40 anos com uma representação partidária congelada. A direita mediática não está contente com o PSD e pode eventualmente patrocinar. Também temos protagonistas veteranos descontentes, como Santana Lopes. À esquerda, é duvidoso. Repare-se que muitas vezes erupções eleitorais não conduzem a partidos consolidados, como o caso de Marinho e Pinto, por exemplo. Outros casos, como a Iniciativa Liberal, por exemplo, podem significar pequenos grupos transitórios destinados a ser deglutidos pelos partidos já existentes ou novos. Veja o convite do PSD para presidente da Assembleia da República a Fernando Nobre, outro que poderia ter tentado passar o seu movimento a partido”, argumenta.
Movimento pan-europeu à procura de assinaturas em Portugal
O Volt Portugal é um novo movimento que está a recolher assinaturas para se constituir legalmente como partido e concorrer às eleições europeias e legislativas em 2019. Trata-se de um movimento pan-europeu, com partidos nacionais já formados em vários Estados-membros da UE, nomeadamente na Alemanha, Bélgica, Bulgária, Espanha, Holanda, Itália e Suécia. “O projeto surgiu há dois anos, em reação ao ‘Brexit’, por iniciativa de um grupo de amigos que na altura estavam a estudar nos EUA, entre os quais Andrea Venzon, o fundador e presidente do Volt Europa”, explica Tiago Guilherme, presidente do Volt Portugal. “Foi criada uma página no Facebook e rapidamente começaram a surgir pessoas de todos os Estados-membros da UE que se fizeram membros e criaram equipas nos seus países e nas suas cidades. Pode dizer-se que o Volt surgiu contra o populismo e contra o nacionalismo”.
Porquê a denominação como Volt, o que significa? “Volt vem de voltagem, não são siglas. O nome significa que queremos dar um novo impulso e energia a Portugal e à Europa. Queremos ser diferentes e mudar a forma como se faz política nos nossos Estados e na UE. Tirando casos pontuais, não temos experiência política, não temos os vícios dos partidos clássicos. E isso é uma mais-valia no nosso entender. É sangue novo que está a entrar na política”, responde Guilherme, o qual foi militante da JS e do PS entre 1995 e 2001. “Tanto quanto sei, os restantes membros da direção do Volt Portugal não pertenceram a nenhum partido. Do que me dá a entender, em geral, os membros que têm vindo a inscrever-se eram possíveis eleitores do PS e do PSD”, salienta. A média de idades dos dirigentes do movimento situa-se “entre os 30 e os 35 anos”, ligeiramente superior à dos militantes já inscritos.
O processo de recolha de assinaturas “está ainda muito no início, começámos neste mês de julho e, neste momento, temos pouco mais de 300 assinaturas”, revela Guilherme. Para se constituir legalmente como partido, o Volt Portugal necessita de obter 7.500 assinaturas válidas. “O objetivo é termos as 7.500 assinaturas até ao final de outubro, mas se resvalar até ao final de dezembro ainda vamos a tempo de concorrer às eleições europeias”, agendadas para maio de 2019. Quais são as maiores dificuldades que um projeto de novo partido tem que enfrentar em Portugal? Em comparação com outros países onde o Volt já formou partidos nacionais, é mais fácil ou mais difícil? “Em Portugal é muito mais difícil”, lamenta Guilherme. “Só para dar uma ideia, na Grécia são necessárias apenas 200 assinaturas. Em Espanha basta fazer um registo. Em Portugal optou-se por dificultar o surgimento de novos partidos e são necessárias 7.500 assinaturas”.
Como é que o Volt Portugal se posiciona ideologicamente? “O Volt acredita que as terminologias de esquerda e de direita estão ultrapassadas. A política do século XXI vai basear-se muito mais nas ideias e nas propostas concretas do que nas bases ideológicas, que tiveram o seu papel histórico, mas que já não estão a dar respostas e esperança aos cidadãos. Se o Volt entrar para a Assembleia da República irá sentar-se entre o PS e o PSD, é o posicionamento mais neutro que existe no hemiciclo nacional. O Volt não é definível ideologicamente, os seus valores são os dos países fundadores da então CEE, hoje UE: a paz, a democracia, a solidariedade, a igualdade de oportunidades, a prosperidade, o desenvolvimento, mas também a igualdade de género, a defesa das minorias, a proteção da natureza e dos animais”.
Partido liberal de “rebeldes responsáveis” ao ataque nas legislativas
A Iniciativa Liberal (IL) constituiu-se como partido, junto do Tribunal Constitucional, em dezembro de 2017. Tornou-se assim o 22º partido político português e vai concorrer às eleições europeias, regionais e legislativas agendadas para 2019. Foi difícil o processo de recolha de assinaturas? Fácil não é com certeza. Como se pode ver pela dificuldade de surgirem novos partidos nestes últimos 44 anos. Há uma distância abissal entre a alegada liberdade que a Constituição diz permitir e a realidade burocrática com que os partidos do regime criam muros para não deixar entrar mais ninguém. Mesmo o Tribunal Constitucional, com toda a sua boa vontade, não consegue escapar a esta lógica”, responde Miguel Ferreira da Silva, presidente da IL. “Houve obviamente algumas dificuldades, sobretudo pelo afastamento que os cidadãos têm da política. Só com muito planeamento, pragmatismo e envolvimento de um conjunto vasto de cidadãos motivados e perseverantes foi possível”.
Em que é que a IL mais se distingue dos restantes partidos portugueses? “Coragem de assumir que estamos fartos disto tudo. Que a política portuguesa precisa de uma profunda renovação. Não daquelas com paninhos quentes, entre PSD e PS, nem das revolucionárias extremistas, mas de sermos os ‘rebeldes responsáveis’. Garantir a participação dos cidadãos na construção do Portugal que queremos. Já não há paciência para aturar reuniões de partidos tradicionais para fazermos ouvir a nossa voz. A IL não é só um partido, como nos obriga a lei, é uma plataforma de cidadania ativa”, enaltece. “Mas também coragem de sermos assumidamente liberais. Pela primeira vez neste regime há quem diga no seu programa que quer menos Estado, que o número de funcionários públicos tem de diminuir, que a vampirização dos nossos rendimentos tem de parar. A IL vem resistir a um sistema partidário que, da direita à esquerda, nos diz que a solução para tudo é o Estado, controlado por eles. Que se foca só no ‘dinheiro público’, como se esse não fosse o dinheiro que cada português é forçado a dar pelos descomunais impostos”.
Com que objetivos é que a IL parte para as três eleições de 2019? “A IL quer fazer um feito inédito: eleger nas legislativas, em pouco mais de um ano e meio de existência formal. Nas últimas décadas, as tentativas que existiram foram destruídas logo no primeiro ciclo eleitoral. A IL está cá para 20 ou 30 anos ou mais, independentemente dos resultados de 2019. Mas somos os que querem correr o risco, aceitar o desafio de alterar o regime dos ‘donos disto tudo’, de partidos com 40 anos e sem capacidade de se renovarem”, sublinha o líder da IL.
Como é que tem sido a recetividade ao projeto, às ideias do partido, a mobilização e reações das pessoas? “A recetividade foi muito boa. É notório o cansaço com os atuais políticos e com o sistema vigente. Mas há também aquela desconfiança, saber se não é mais do mesmo. Aliás, é precisamente aí que notamos uma enorme recetividade ao projeto da IL. Muitos descobriram-se liberais ao falar connosco, muitos mais encontraram finalmente um espaço de participação e de cidadania ativa fora do carreirismo partidário”, afirma Silva. “A divulgação e participação nas redes sociais tem sido absolutamente extraordinária, sobretudo por aqueles que depois vêm aos nossos eventos e acabam por confirmar que podem ser ouvidos e participar diretamente nas nossas plataformas colaborativas. Que finalmente encontram na IL quem não usurpe a sua voz e acolhe de facto as suas propostas. Aqui não é preciso ser militante, ou amigo de um cacique local para se participar”.
Movimento de direita liberal enfrenta barreira da legalização
O Democracia21 é um movimento assumidamente de direita e liberal, em processo de recolha de assinaturas para se constituir legalmente como partido e assim poder concorrer às eleições legislativas e europeias de 2019. A fundadora, Sofia Afonso Ferreira, explica que “o Democracia21 surge pelo desejo antigo de um partido liberal e a defesa dos seus valores no país, além do descontentamento face à situação atual da direita”. Em que é que se distinguirá dos partidos já existentes? “Distingue-se logo por ser um partido liberal, algo que tem estado ausente na história do país. Temos partidos que defendem medidas liberais, mas não era suficiente. Será também essencial para o equilíbrio de forças à direita, visto que nas últimas quatro décadas a discrepância de peso entre a esquerda e a direita não tem sido a mais positiva”, responde Ferreira.
Será um partido conservador nos costumes e liberal ao nível económico? Considera que há um espaço vazio na política portuguesa para um partido com essas características? “Impõe-se esclarecer algo muito importante: também somos liberais nos costumes, mas partimos de pressupostos diferentes da esquerda, defendendo que a interferência do Estado deve ser diminuta na economia e nos costumes. Acreditamos que é a sociedade que deve decidir sobre as suas escolhas e o Estado apenas regular, ao passo que a esquerda defende que o Estado deve interferir e estar presente em todos os aspetos”, sublinha a porta-voz do Democracia21.
A recolha de assinaturas está em curso e “contamos ter as necessárias e dar entrada do pedido de candidatura no Tribunal Constitucional em setembro”, prevê Ferreira. “O nosso objetivo é concorrer às eleições europeias e legislativas no próximo ano. Vamos apresentar várias medidas entre setembro de 2018 e abril de 2019. Uma menor intervenção do Estado, redução da carga de impostos e reformas profundas em setores cruciais como a Saúde e a Justiça serão as nossas premissas e prioridades”, afirma.
Considera que há uma espécie de “cartelização” por parte dos partidos com representação parlamentar, no sentido de dificultar o surgimento de desafiadores, a entrada de novos partidos no sistema? Essa eventual “cartelização” verifica-se mais no financiamento, nos entraves burocráticos, no sistema eleitoral? “O excesso de burocracia, a começar pela exigência das 7.500 assinaturas, é o primeiro entrave a novos movimentos e partidos. Não existem dúvidas quanto à ‘cartelização’ por parte dos partidos já instalados, basta seguir os últimos eventos referentes à nova lei de financiamento. Isso é um dos motivos para defendermos o fim do financiamento público dos partidos”, critica.
Partido de extremo-centro quer maior atenção mediática
Constituído em 2015, o Nós, Cidadãos! (NC) quase elegeu um deputado nas legislativas desse ano e conseguiu mesmo eleger um presidente de câmara municipal nas autárquicas de 2017. A partir dessa conquista obtiveram mais ou menos atenção mediática? Considera que há um défice de atenção relativamente aos partidos mais pequenos e sem representação parlamentar? “Elegemos 65 autarcas, dos quais um presidente de câmara, cinco vereadores, vários presidentes de juntas de freguesia e membros e deputados municipais. Tudo isto em sete concelhos. É pouco face ao universo de do poder local, mas é muito em comparação a grandes partidos como o BE que nem um presidente de câmara municipal tem. A atenção ainda não cresceu o suficiente, mas aqui serão os resultados dos nossos autarcas que devem falar”, responde Mendo Castro Henriques, líder do NC.
Como é que o NC se posiciona ideologicamente? “É um partido social e uma alternativa ao bloco central dos interesses. O NC é um partido que quer a mudança europeia e, como tal, é contra os burocratas de Bruxelas e contra os populismos e soberanismos. Se existisse o termo, diria que estamos no extremo-centro do espectro político convencional e atraímos pessoas de todos os quadrantes. As nossas propostas procuram ser inovadoras no cruzamento da social-democracia, do liberalismo social e da doutrina social cristã”, define Henriques. E o que distingue o NC dos demais partidos? “É um partido que não aceita a divisão entre esquerda e direita e tem um programa em que os interesses dos cidadãos e das empresas portuguesas estão primeiro do que os interesses do sistema financeiro internacional e seus agentes políticos em Portugal. Enquanto não fizermos esta ‘revolução coperniciana’ na política, enquanto não dermos esta volta de 180 graus, estaremos sujeitos a doses maciças de corrupção que só agora começa a ser penalizada em Portugal”.
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