Ainda este ano o Banco de Portugal vai rever o cálculo da taxa de stress aplicável ao juro do crédito à habitação, uma medida que resulta de uma recomendação aos bancos. Desta forma o banco central procura que mais famílias possam aceder ao crédito à habitação. Quem o diz é a Vice-Governadora do Banco de Portugal, Clara Raposo, em entrevista à Antena 1 e ao Jornal de Negócios.
Clara Raposo já tinha admitido rever em baixa essa taxa de stress que acresce à taxa de juro final do crédito à habitação, mas diz agora que essa decisão vai ser tomada ainda este ano para os novos créditos.
Em fevereiro o Banco de Portugal tinha admitido rever a medida macroprudencial adotada em 2018 que forçou a banca a ser mais cautelosa na avaliação do risco dos clientes que querem contratar crédito da casa a taxa variável, obrigando-a a somar 3% à taxa final para calcular a taxa de esforço. Uma regra que, por exemplo, o Santander Portugal já tinha afirmado precisar de alterações, numa altura em que as Euribor estão a tocar máximos à boleia dos juros do Banco Central Europeu (BCE).
“Faz sentido revermos a recomendação macroprudencial e temos agora aqui este período do Verão e uma melhor capacidade de previsibilidade da evolução futura das taxas de juro, se calhar aqueles 300 pontos base podem vir a ser revistos”, diz Clara Raposo na entrevista.
A responsável do BdP notou que esta medida acabou por ser eficaz, tanto para os clientes como para os bancos, sobretudo porque foi adotada em 2018 quando o cenário de stress foi definido numa altura em que os juros estavam negativos, mas os juros “subiram 4% este ano”.
A mudança só será aplicável a novos empréstimos e poderá levar a uma maior concessão de crédito às famílias.
De acordo com dados divulgados no fim de Junho pelo Banco de Portugal, o montante total de empréstimos para habitação em Maio era de 99,5 mil milhões de euros, menos 118,3 milhões de euros (-0,12%) do que no final de Abril. Foi o quinto mês consecutivo em que o volume de crédito à habitação concedido pela banca registou evoluções mensais negativas.
Recorde-se que um dos motivos da queda que se tem verificado no crédito à habitação é precisamente as condições ao nível da taxa de esforço que corresponde à percentagem do rendimento do agregado familiar alocada ao pagamento de produtos de crédito. A taxa de esforço é calculada através da divisão do valor dos encargos financeiros pelo rendimento líquido total do agregado. Este número é multiplicado por 100, resultando num valor percentual.
Em concreto, a taxa de esforço é, nada mais nada menos, que o Debt Service-to-Income ratio (DSTI). É, portanto, esta sigla que traduz o “rácio entre o montante total das prestações mensais associadas a todos os empréstimos detidos pelo mutuário e o seu rendimento mensal líquido de impostos e contribuições obrigatórias à Segurança Social”, tal como explica o Banco de Portugal (BdP) no seu site.
Para além da taxa de stress e da taxa de esforço que limitam o acesso ao crédito, há ainda as regras recomendadas pelo supervisor bancário relativo ao Loan-to-value (LTV) que corresponde ao rácio entre o valor financiado pelo banco para a compra de casa e o valor do imóvel (é considerado o valor mais baixo, entre o valor de aquisição e o valor da avaliação).
De acordo com as regras do Banco de Portugal, o limite ao LTV no crédito habitação, de forma a que os clientes e bancos não assumam riscos acima do recomendável, é de 90% para crédito habitação destinado à aquisição ou construção de habitação própria e permanente, e 85% para créditos com garantia hipotecária ou equivalente para outras finalidades (habitação secundária). Ainda que, isso não impeça que certas entidades bancárias possam decidir baixar a percentagem máxima que concedem em determinado empréstimo.
Valores do crédito malparado não sofreram alterações significativas, diz Vice-Governadora
Sobre as renegociações dos créditos à habitação, Clara Raposo não avança com números concretos, mas adianta que os dados que existem não são preocupantes. Os valores do crédito malparado não sofreram alterações significativas entre o final do ano passado e o primeiro trimestre deste ano, reforça.
Clara Raposo diz ainda que compreende as preocupações dos ministros das Finanças que acham que as subidas já foram suficientes para evitar um efeito mais recessivo. A Vice-Governadora esclarece que as medidas implementadas pelo governo português para minimizar o impacto da subida das taxas de juro e da inflação, não vão contra as determinações do BCE, mas admite que possa existir uma revisão cirúrgica para manter alguma disciplina orçamental.
Já questionada sobre a política do BCE de aumento das taxas de juro, Clara Raposo diz não ter certezas sobre a necessidade de aumentar as taxas de juro em julho, porque é preciso dar tempo para que as subidas anteriores produzam efeitos na economia, ainda que, “psicologicamente, os agentes já estejam preparados para esse aumento”.
Clara Raposo também apelou às empresas para que façam refletir nos preços ao consumidor e nas suas margens de lucro a reversão que já se verificou no mercado da energia e que levou ao aumento dos custos nas empresas. A responsável pelo BdP não considera que tenha havido um aproveitamento deliberado das empresas do aumento da inflação, mas admite que houve um aproveitamento da situação por alguns sectores já identificados e isso, considera, tem um limite.
Neste sentido, apela a um contributo geral de empresas e trabalhadores e pede um compasso de espera para que se consiga uma descida de inflação que convença todos na Europa.
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