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CFP pede limites no uso da ‘almofada’ das pensões para não prejudicar gerações futuras

A lei não especifica se o Fundo “pode ser totalmente esvaziado ao longo desse período de utilização ou se deverá preservar alguma ‘almofada’ mínima”, uma das várias situações que leva o CFP a pedir maior clareza e transparência.
Nazaré da Costa Cabral, presidente do Conselho de Finanças Públicas | Cristina Bernardo
27 Março 2024, 07h30

O Conselho de Finanças Públicas (CFP) deixa vários reparos ao regime jurídico do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS), pedindo clarificação quanto aos critérios de acesso e utilização dos montantes do mesmo e alertando para o uso discricionário que o atual regulamento sugere. Nesta linha, devem ser definidos montantes máximos para recurso a este fundo, sob pena de, em caso contrário, saírem prejudicadas as gerações futuras.

O relatório do CFP sobre o fundo deixa algumas recomendações para aumentar a sustentabilidade e transparência do sistema de pensões e da ‘almofada’ constituída para a sua estabilidade financeira, a começar pelo modo de utilização destes montantes. A instituição liderada por Nazaré da Costa Cabral, coautora do estudo com Noémia Goulart, começa por sublinhar a pouca clareza sobre as situações em que o FEFSS pode ser utilizado, focando-se depois na total ausência de indicações sobre como deve ser usado.

Em particular, a lei não especifica se o Fundo “pode ser totalmente esvaziado ao longo desse período de utilização ou se deverá preservar alguma ‘almofada’ mínima – um capital mínimo que garanta a própria sobrevivência do FEFSS enquanto património”. Como tal, o CFP advoga que sejam esclarecidas “as condições e os limites financeiros para a sua utilização, incluindo ‘dotação’ inicial ou acervo patrimonial mínimo para começar a ser utilizado e eventualmente a exigência de manutenção de um capital mínimo mesmo durante a utilização”.

“Poderá ser ainda equacionada a definição de tetos ou limites máximos anuais para a sua utilização (ou seja, durante a fase de desacumulação), por exemplo, por referência ao próprio retorno anual esperado em termos reais ou limitar a sua utilização anual ao valor dos rendimentos gerados em cada ano”, sugere o relatório, lembrando a importância destes detalhes para a sustentabilidade e transparência do sistema.

Outro foco de dúvidas prende-se com a interação entre o regulamento do FEFSS e a Lei de Bases da Segurança Social (LBSS), que parece sugerir três cenários possíveis para a interpretação da expressão ‘por um período mínimo de dois anos’ inscrita em vários artigos destes códigos. Segundo a análise do CFP, há pelo menos três hipóteses diferentes que deveriam ser clarificadas, isto apesar de, independentemente da interpretação da lei, o Estado não a estar a cumprir.

“Se se olhar para o Relatório de Sustentabilidade da Segurança Social que é anualmente apresentado em anexo à proposta de lei do OE, o que se vê é que o decisor (o Governo) vai transferindo os saldos existentes previstos e não baliza as transferências com este objetivo, nem para a acumulação nem para a sua utilização. Ou seja, este objetivo ‘dos dois anos em pensões’ atualmente, na prática, não tem consequências”, lê-se no documento.

Perante este cenário, o CFP questiona se “o atingimento desta dimensão financeira funciona também como condição necessária para que o FEFSS seja utilizado pela primeira vez”, algo que parece não se verificar. De facto, nas crises de 2012 e da pandemia, a solução encontrada não passou pelo fundo, levantando questões sobre a sua utilidade prática.

Também as condições em que será possível mobilizar este instrumento de estabilidade financeira não são totalmente claras. Como tal, tanto o recurso, como o timing do uso do FEFSS se traduz numa discricionariedade não desejável para este tipo de instrumentos, defende o CFP, dado que pode minar a transparência ou ser usado como arma de intromissão política.

“A decisão de acionar o FEFSS, na ausência de regras claras quanto ‘trigger’, fica sempre dependente das decisões discricionárias do Governo, e estas vão variando ao longo do tempo”, refere o relatório, lembrando que o regulamento do fundo “nada clarifica quanto à razão determinante nem quanto ao exato destino dessa decisão”.

Outra das recomendações é, portanto, uma clarificação dos motivos que levariam o Estado a acionar o FEFSS, o que aumentaria a sua transparência. Pelo contrário, este “tem vindo a assumir essa dimensão mais estrutural, aproximando-se de um ‘fundo em favor das futuras gerações’, ainda que ostente no nome o de fundo de estabilização que aponta para uma dimensão conjuntural ou de curto prazo”.

“Neste sentido, não seria de excluir a redenominação do FEFSS para ‘Fundo de Reserva da Segurança Social’ (ou, mais especificamente, ‘Fundo de Reserva do Sistema de Pensões português’), o que acentuaria essa sua feição ou vocação estrutural e o aproximaria da denominação que é usada noutros fundos internacionais congéneres e do tratamento que lhes é dado pelas organizações relevantes”, continua o relatório.

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