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Atraso da garantia pública com “impacto marginal” na compra de casas

A maioria das mediadoras imobiliárias ouvidas pelo JE revelam que muitos jovens até 35 anos têm procurado informar-se sobre a melhor forma de poderem adquirir uma habitação, mas que este atraso não se tem feito sentir na concretização de negócios. De 1 de agosto a 17 de setembro foram concedidas 894 isenções, com o Governo a trabalhar para que o acesso à garantia pública aconteça em dezembro.
Cristina Bernardo
26 Setembro 2024, 07h30

O atraso na regulamentação da garantia pública para empréstimos à habitação dos jovens até 35 anos não está a fazer-se sentir na compra de casa. Segundo a maioria das mediadoras imobiliárias ouvidas pelo Jornal Económico (JE), o “impacto tem sido marginal e pouco significativo”, numa medida que entrou em vigor a 1o de julho e que visa colmatar a dificuldade que a maioria dos jovens nesta faixa etária tem em assegurar parte do valor de aquisição da casa, vulgarmente designada de entrada.

Na Zome, reconhecemos a importância da medida de garantia pública para facilitar o acesso ao crédito à habitação para jovens até 35 anos, especialmente num contexto em que as condições de aquisição de casa própria são cada vez mais exigentes. No entanto, o adiamento da implementação desta medida tem tido, até ao momento, um impacto marginal nos negócios concretizados”, refere Júlio Quintela, Chief Operations Officer da mediadora.

No entanto, e apesar deste atraso na garantia pública, muitos dos jovens até 35 anos têm procurado informar-se sobre a melhor forma de poderem adquirir uma habitação. “Temos muitos pedidos de informação, de esclarecimento. Temos algumas viabilidades, ou seja, contratos aprovados, que as pessoas estão a pedir para aguardar por esta decisão, para ver se podem enquadrar ou não e poderem ampliar o seu financiamento a 100%”, indica Ricardo Sousa, CEO da Century 21 Portugal.

O responsável defende que o “impacto é pouco significativo” nos negócios feitos pela mediadora, dado que os jovens e as pessoas até 35 anos não são muito representativos daquilo que é o número total de transações e que caracteriza a procura atualmente. “O grande desafio dos jovens no acesso à habitação são os rendimentos que eles têm e a precariedade destes primeiros trabalhos que eles conseguem ter. Hoje em dia viver junto é quase um luxo em Portugal”, salienta.

Quem classifica esta medida de “excelente” é Rui Torgal, CEO da ERA Portugal, assumindo, contudo, que a mesma não está a ter impacto na mediadora. “Qualquer empresa que diga que esta medida neste momento teve ou tem um impacto significativo naquilo que são os seus resultados acho que está a mentir ou está a ser demasiado otimista, ou então as duas coisas”, sublinha.

Recorde-se que, em vigor há mais de dois meses, o decreto-lei n.º 44/2024, de 10 de julho, estabelece as condições em que o Estado pode prestar garantia pessoal a instituições de crédito com vista à viabilização de concessão de crédito à habitação própria e permanente a jovens até aos 35 anos. Mas ainda não pode ser aplicada, uma vez que a medida precisa de ser regulamentada, tendo o prazo para regulamentar a medida terminado a 9 de setembro e sido prolongado para acomodar as observações do Banco de Portugal (BdP) que chegaram em meados de setembro ao Ministério das Finanças.

A expetativa é a de que a regulamentação esteja pronta ainda este mês para que a garantia pública esteja disponível no final do ano. Isto porque, depois da publicação do documento, os bancos admitem precisar de “aproximadamente 60 dias” para a sua implementação.

De acordo com a última versão da portaria a que a Lusa teve acesso, caberá ao Ministro das Finanças definir o montante máximo da garantia pública ao crédito à habitação que será repartido entre os bancos que assinarem o protocolo com o Estado (só os bancos aderentes poderão conceder empréstimos com garantia pública).

Demora em processos de negociação e aumento da procura

No entanto, existem exceções à regra, como é o caso da mediadora RE/MAX, que assume demoras em alguns processos de negociação na compra de casa. “Sim, os atrasos na regulamentação da garantia pública e a previsível demora de cerca de 60 dias para os bancos aderentes a implementarem têm provocado demoras em vários processos que temos em curso, alguns ainda numa fase inicial, outros já aquando da celebração do Contrato de Promessa Compra e Venda”, afirma ao JE, Manuel Alvarez, presidente da RE/MAX Portugal.

Em sentido inverso está a mediadora de luxo Engel&Volkers, que sentiu um aumento da procura por parte dos jovens para avançar com a compra de uma primeira habitação aquando da entrada em vigor desta medida. “Desde então temos vindo a notar um aumento de potenciais clientes de uma faixa etária mais jovem, que especulamos que seja resultado desta medida que pode vir a beneficiar os jovens, embora não venha a solucionar os problemas de habitação que se vivem atualmente, mas ainda assim é um bom apoio e um começo, particularmente para os jovens que pretendem adquirir uma primeira casa”, refere Daniela Rebouta, diretor de vendas da Engel & Völkers Lisboa e Oeiras.

Contactado pelo Jornal Económico, o Ministério da Juventude e Modernização refere que desde o dia 1 de agosto, altura em que deu entrada em vigor a isenção do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) e Imposto do Selo (IS) na compra de casa para jovens até aos 35 anos, e até ao dia 17 de setembro, foram concedidas 894 isenções para efeitos de compra da primeira habitação própria e permanente por parte de jovens até aos 35 anos de idade, de acordo com os dados fornecidos com a Autoridade Tributária (AT).

“O Governo considera que esta é uma medida [garantia pública] de grande impacto social que permitirá aos jovens aceder com maior facilidade à sua primeira habitação, resolvendo um problema de liquidez”, aponta o ministério liderado por Margarida Balseiro Lopes, assumindo que encontra-se a ultimar a portaria para publicá-la ainda este mês, de forma que os jovens possam ter acesso à garantia pública durante o mês de dezembro.

Quando apresentou a medida da garantia pública, o Governo (PSD/CDS-PP) disse que a intenção é o Estado garantir até 15% do valor de aquisição do imóvel (funcionando nesta proporção como fiador) criando condições para que os jovens consigam aceder a um empréstimo até 100% do valor da casa.

Segundo o decreto-lei, a garantia destina-se a pessoas entre 18 e 35 anos de idade (inclusive), residentes em Portugal, com situação regularizada nas Finanças e Segurança Social, com rendimentos até ao 8.º escalão (81.199 euros de rendimento coletável anual), e que estejam a comprar a primeira de habitação própria permanente cujo valor não exceda 450 mil euros.

“Quem não tem poupança deve optar pelo arrendamento”

Para que os jovens possam avançar na compra de casa têm habitualmente de dispor entre 10% e 15%, que os bancos, salvo em algumas excepções, estão impedidos de financiar. Contudo, boa parte deste segmento da população não possui tal capacidade financeira e como tal o arrendamento é apontado pelas mediadoras como uma solução.

“Quem vai ao mercado é uma pessoa que teria a capacidade para pôr os 10%. Se não tiver a capacidade, se não tiver uma poupança, nem é aconselhável que vá ao mercado. Se eu só posso comprar se for com 100%, claramente o conselho é não o fazer. Quem não tem poupança não deveria comprar e optar pelo arrendamento”, refere Ricardo Sousa.

Por sua vez, Manuel Alvarez, presidente da RE/MAX Portugal, defende que um dos impactos diretos é o aumento da procura e dos níveis de preços procurados, pois em complemento às isenções/reduções do IMT e do Imposto de Selo (IS), a garantia bancária permitirá a muitos jovens aceder a imóveis de preços mais elevados, porque poupam no custo fiscal da aquisição.

“É necessário evitar que alguns desses jovens contraíam empréstimos superiores à sua capacidade real de pagamento, gerando endividamento excessivo e incumprimentos futuros. Adicionalmente, ao beneficiar-se apenas algumas faixas etárias, estar-se-á, paralelamente, a dificultar a aquisição por parte de outros grupos etários que possuem as mesmas dificuldades financeiras que esses jovens beneficiários”, salienta.

Para Rui Torgal, esta é uma medida que vai eventualmente ser complementada com outras rubricas, seja na taxa de esforço, seja em garantias públicas, realçando que o mercado neste momento está de alguma forma a voltar ao normal. “Acredito na economia de mercado, e o mercado a funcionar vai fazer com que provavelmente entrem mais casas, porque há proprietários que se sentem mais confiantes para pôr as suas casas à venda”, afirma.

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