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EUA: O que distingue (e aproxima) Kamala e Trump na vertente económica

Apesar dos discursos opostos, a vice-presidente e o antigo presidente têm pontos em comum na vertente económica, favorecendo um endurecimento da política migratória ou o fracking, por exemplo. Ainda assim, na vertente fiscal as diferenças são abundantes, enquanto Trump adota uma postura mais protecionista.
4 Novembro 2024, 07h30

A eleição presidencial norte-americana de 2024 tem sido apontada como determinante para o futuro do país, não só em termos políticos, como económicos. No detalhe, as políticas propostas por Harris e Trump acabam por se focar nos mesmos assuntos, com a subida do custo de vida à cabeça, embora com abordagens ligeiramente distintas – mas, em ambos os casos, os detalhes quanto ao financiamento destas medidas são escassos.

A economia norte-americana até tem crescido bastante acima do registado na zona euro, suportada por um consumo privado forte, mas um dos tópicos mais relevantes para os eleitores (economicamente, o tópico mais relevante) é a crise do custo de vida. A luta contra a inflação parece estar bem encaminhada, mas um grupo de economistas avisou recentemente que várias medidas sugeridas pelos candidatos, sobretudo por Trump, arriscam um ressurgimento da pressão nos preços.

Para compreender os avisos, importa primeiro olhar para as políticas propostas. Dando continuidade ao protecionismo norte-americano da última década, Kamala Harris deve manter as tarifas impostas por Trump a bens chineses, tarifas essas expandidas para sectores vistos como estratégicos pelo presidente Biden. Na mesma linha, a vice-presidente foi das poucas democratas no Senado a opor-se ao prolongamento do NAFTA, o acordo de comércio livre da América do Norte, um sinal das suas linhas gerais em termos de comércio externo.

No entanto, as propostas de Trump prometem uma distorção do mercado ainda maior: o antigo presidente quer taxar os bens importados da China em 60% (sugerindo taxas até 200% para sectores específicos, como os automóveis elétricos), impondo ainda uma tarifa geral de 10% em todas as importações para os EUA. Tal levaria a novo aumento dos preços, alertam vários economistas.

Outra fonte de pressão nos preços é o plano de deportação de imigrantes ilegais de Trump, dada a falta de mão-de-obra no país. Os EUA têm registado taxas de desemprego historicamente baixas há vários trimestres, sublinhando a rigidez do mercado laboral e a dificuldade em recrutar – uma dinâmica que acabará agravada caso o 45º presidente e candidato a 47º avance com os seus planos de deportar grandes números de trabalhadores sem documentos.

Ainda assim, os planos de Harris envolvem igualmente um agravamento das leis migratórias, sobretudo no que respeita a pedidos de asilo de migrantes que entram pela fronteira Sul, o que também arrisca agravar a situação laboral.

Na vertente fiscal, Trump sugere o fim dos impostos sobre gorjetas (uma fonte importante de rendimento para o sector da restauração e hospitalidade), bem como sobre as contribuições para a Segurança Social. Simultaneamente, o antigo presidente quer manter os cortes que decretou em 2017 – que Kamala pretende reverter para os trabalhadores com rendimentos acima dos 400 mil dólares por ano – e baixar a taxa de IRC para 15%.

Em sentido inverso, Kamala quer avançar com impostos sobre os trabalhadores com mais rendimentos, propondo ainda uma subida do imposto sobre as empresas de 21% para 28%, embora com taxas reduzidas para as empresas com ganhos de capital anuais abaixo de um milhão de dólares.

As propostas para limitar a escalada dos preços são, portanto, modeladas de outra forma. Kamala pretende avançar com uma lei que proíba as empresas de aumentarem preços em caso de calamidades, além de propor incentivos fiscais a promotores imobiliários que se dediquem a construir habitação de baixo custo.

Por sua vez, Trump defende que a solução passa por incentivar a produção nacional (em linha com o protecionismo que apregoa), aumentando a produção petrolífera norte-americana e limitando juros nos cartões de crédito. Na vertente imobiliária, um dos principais motores da inflação nos EUA, a resposta passa novamente pela deportação de migrantes sem documentos, argumentando que estes aumentam a pressão imobiliária.

Um forte defensor da desregulamentação, Trump garante que irá novamente retirar o país do Acordo de Paris, revertendo investimentos em energia verde e removendo uma série de regulamentos e leis ambientais (muitos deles da presidência de Biden). Já Kamala, apesar de favorecer a transição para uma economia mais assente em fontes energéticas não-fósseis, voltou a apoiar o fracking, ou fraturamento hidráulico, uma prática polémica pelos impactos ambientais, sobretudo ao nível dos lençóis freáticos, e nas populações circundantes.

Ainda na linha da desregulamentação proposta por Trump, e numa sequela da relação difícil que cultivou com o presidente da Reserva Federal, Jerome Powell, o candidato republicano já sugeriu que poderá demitir o responsável pela política monetária, outro fator que agrava o risco de nova onda de inflação.

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