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Carlos Costa: “orgulho-me do que foi feito”

Em audição na Assembleia da República, o antigo governador do banco central recorda a dificuldade da operação que resultou na constituição do Novobanco. Principalmente “nas condições em que nos encontrávamos em 2015”.
11 Fevereiro 2025, 16h31

Em audição sobre o fim do acordo de capital contingente – emanada de um requerimento apresentado pelo grupo parlamentar apoiado pelo Chega, pelo PS e pela Iniciativa Liberal, o deputado socialista Miguel Costa Matos disse que “a resolução, imposta pelo BCE, foi má” e que, nesse quadro, perguntou ao antigo governador do Banco de Portugal se se arrepende da resolução do banco. “O Banco de Portugal sob sua gestão falhou” na supervisão do Banco Espírito Santo, acrescentou. O processo de resolução e venda do BES foi uma confusão, disse. Carlos Costa lembrou que “é a 14ª vez que falo sobre o assunto” e que não estava ali para rever todo o processo. “Orgulho-me do que foi feito”, disse em resposta. “As únicas decisões que estavam em decisão do Banco de Portugal. A bondade da resolução está evidente” pela própria existência do Novobanco.

“O banco foi objeto de um processo de venda transparente e a proposta que foi retida foi a melhor proposta”, disse salientando ainda que, em 2014 tal como em 2017, “todos os bancos têm imparidades nos seus ativos. Não há registo de imparidades por antecipação. Relativamente ao capital do banco, o processo de resolução envolve a constituição de um balanço inicial”. “Até final de 2015, o Novobanco estava em condições de cumprir os rácios de capital”, recordou. “Tenho muito orgulho de ter desencadeado uma operação que não é comum em Portugal”, afirmou. Mas “o processo não foi concluído”, tendo faltado “a fase de contraditório”. “É uma operação muito difícil”, recordou. “Não estávamos a lidar com operações normais, o balanço era uma caixa negra”.

O segundo processo de venda, que não fracassou, aconteceu de forma favorável para o Fundo de Resolução, depois de dois anos de gestão operacional “que trouxe mais certeza” à venda, cujo processo está neste momento a decorrer. Carlos Costa disse ainda que o papel comercial do BES que não transitou para o Novobanco, dado que o banco não contraiu as dívidas que o seu antecessor criou – para responder à questão dos lesados do BES.

Depois de largos minutos de perguntas dos diversos grupos parlamentares – que serviram essencialmente para cada um deles zurzir os seus adversários políticos – o antigo governador do Banco de Portugal foi chamado a responder sobre se estaria de acordo com a absorção do Novobanco pela Caixa Geral de Depósitos. Isto para além de alguns dos grupos parlamentares quererem saber se o acordo de capital contingente foi a melhor solução para resolver os problemas de capital do banco.

Sobre a possibilidade da CGD comprar o Novobanco, notícia avançada pelo Jornal Económico, Carlos Costa respondeu que é uma operação de “natureza empresarial” mas que caberia à DG Comp (Concorrência Europeia) avaliar.

“Considero todas as questões legítimas, mas nem todas elas devem ser dirigidas” ao ex-governador do Banco de Portugal. “O supervisor tem obrigação de agir quando” um banco entra em deficiência de capital, recordou. O dilema era resolução, liquidação ou venda a uma terceira entidade. As opções que se colocavam remetiam para o Banco de Portugal; compra por uma instituição terceira, o que não existia – o que obrigava o banco central a liquidar ou a uma resolução. Carlos Costa lembra que o processo de venda ao Lone Star foi finamente escrutinada. “Como governador tinha que preservar a estabilidade do sistema financeiro””, disse – para explicar que a solução encontrada “foi a via possível”. “Resgatar quem não devia ser resgatado” era uma das suas preocupações.

“Todos têm de ter consciência que as asneiras de uns são pagas por todos”, disse, para explicar porque razão o sistema financeiro foi chamado a contribuir para a resolução. “Se o BES não tivesse sido resgatado, o rating da República teria ido por aí abaixo”. “O dinheiro que foi investido (e não gasto) na recuperação de um banco que entrou em resolução aproveitou todo o sistema, todos os portugueses – todos ganhámos com isto. E evitámos a fuga da poupança para outros mercados financeiros”, para além de, por exemplo, o financiamento das PME e de toda a economia não sofreu qualquer ‘solavanco’. “O banco está aí, e está de boa saúde porque aproveitaram a oportunidade que lhe foi dada”, disse Carlos Costa. “Fizemos o possível – o Banco de Portugal e o Fundo de Resolução – o possível num quadro que era uma situação limite”. Se o Lonestar não tivesse comprado – “numa operação que foi aberta” – o banco entraria em liquidação. “Aquilo que conseguimos deu frutos e os frutos estão aí”.

Quanto ao fim do acordo de capital contingente, todos ganharam. Entre outras coisas porque a questão das transferências para o Novobanco acabou. E com isso ganham todos, nem que seja por via da estabilidade do sistema bancário português. “Ponham de lado as questões políticas (mas não as abandonem) e dirão que o resultado é o melhor e será um caso de estudo na Europa”. “A venda de ativos fez-se nas condições que eram possíveis”, disse Carlos Costa, para comentar a venda, que alguns dizem ter sido feita ‘ao desbarato’, de ativos do Novobanco.

“Em vez de estarem preocupados em saber quem vai controlar o Novobanco, seria melhor querermos saber quanto teremos instrumentos e dívida e de capital com vista à economia”, disse. “Só conseguimos uma união monetária estável quando conseguirmos uma partilha de risco a nível europeu”, o que serve para explicar os diversos instrumentos de partilha de risco do sistema bancário nacional. “A culpa vai morrer solteira? Em termos sancionatórios já não morrerá solteira. A culpa do foro criminal não depende do Banco de Portugal”, concluiu. E, evidentemente, não respondeu à pergunta sobre se a Caixa Geral de Depósitos deve ou deixa de dever comprar o Novobanco.

Carlos Costa concluiu com um reparo, para lembrar aos deputados (e à comunicação social, disse), que “o Banco de Portugal não é uma entidade reguladora, a Assembleia da República é que é a entidade reguladora. O Banco de Portugal é uma entidade supervisora”. Para bom entendedor…

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