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“É indispensável” estimular complementos de reforma para aliviar a pressão na Segurança Social

Valdemar Duarte, diretor-geral da Ageas Pensões, considera que é preciso acelerar a criação de incentivos para os complementos de reforma, que incluem os PPR e os fundos de pensões, de maneira a que os portugueses possam ter uma pensão digna no futuro. 
24 Março 2025, 07h00

A criação de incentivos fiscais para os complementos de reforma poderá ser uma das propostas apresentadas pelo grupo de trabalho criado pelo Governo ainda em funções para estudar a sustentabilidade da Segurança Social, acredita Valdemar Duarte, diretor-geral da Ageas Pensões. Numa altura em que paira a dúvida sobre a continuidade deste grupo perante a queda do Executivo e a ida a novas eleições, o responsável diz, em entrevista ao Jornal Económico, que é preciso dar rapidamente este passo para se aliviar a pressão no sistema e para que os portugueses possam ter reformas dignas. “Quanto mais tarde, pior”, alerta. 

O que mudou no último ano em termos da sustentabilidade da Segurança Social?

Muita coisa aconteceu e nada aconteceu. Saiu o “ageing report” que tornou ainda mais evidente as questões demográficas e de sustentabilidade. Não vou falar de sustentabilidade, mas de adequação das pensões dos portugueses. Agravaram-se substancialmente a taxa de dependência [relação entre a população jovem e idosa e a população em idade ativa] e a taxa de substituição [rácio entre a pensão de reforma e o último salário do trabalhador]. Aconteceu a publicação do Livro Verde, que se esperava que estivesse para acontecer até ao verão.

Como vê as recomendações do Livro Verde? 

Tem medidas claras de necessidade e de indispensabilidade de incentivo fiscal para a promoção dos planos complementares [para a reforma, como é o caso dos fundos de pensões]. 

Como é que podemos promover os fundos de pensões? 

Penso que os fundos de pensões são o instrumento mais adequado para fazer a gestão de benefícios da reforma para indivíduos ou para empresas. Como é que eles se estimulam? O fundo de pensões tem associado uma falta de liquidez. Não faz qualquer sentido dizerem para se colocar dinheiro de lado sobre o qual perdem o acesso e não vos puder dar nada em troca. Sem um estímulo fiscal é difícil que as coisas tenham tração. No passado, os Plano Poupança Reforma (PPR), que até eram produtos ilíquidos, tinham benefícios fiscais, começaram a ser produtos mais líquidos e a perder benefícios fiscais sobre a subscrição. A generalidade da população não conta com eles com benefício fiscal. Conta como um produto de investimento, de poupança de médio e longo prazo. 

Mas não para a reforma…

Existirão pessoas que o fazem para a reforma. Não digo o contrário. O que eu acho é que são muito poucas. E basta ver que o grosso da população que tem PPR está bem acima dos 45 anos.

Acha que este incentivo fiscal vai chegar? 

Até diria que vai ter de chegar. E quanto mais tarde, pior. Não há, imagino eu, ninguém que não concorde que a complementaridade é indispensável. Não conheço ninguém que ache que o peso da Segurança Social deva diminuir. A questão fundamental é que ela seja sustentável, que tenha equidade intergeracional, ou seja, que aquilo que se está a exigir às novas gerações, em termos de pagamento, possa depois ser sustentado por gerações que hão de vir. Até ao final do ano, acredito que possam surgir propostas de reformas da Segurança Social e propostas relativamente à introdução de incentivos para a complementaridade [por parte do grupo de trabalho criado pelo Governo para analisar o futuro da Segurança Social]. É um grupo de trabalho composto por dez pessoas, liderado por Jorge Bravo. São pessoas que conhecem a máquina por dentro e sairão propostas. [Mas] propostas não são decisões. 

Estas propostas podem passar pela recomendação de incentivos fiscais? 

Diria que passarão pela recomendação de incentivos fiscais. A questão é se a fórmula é esta ou aquela, ou mais para produtos individuais ou mais para produtos de empresa. Aí, não sei. Os fundos de pensões são um instrumento natural para esse efeito. Podem existir outros produtos. Agora, têm de ser produtos com características em que a liquidez é muito reduzida. Ou seja, poder aceder em circunstâncias de necessidade clara e objetiva. Se dermos a possibilidade de reembolso antecipado por problemas, esta poupança nunca vai chegar à idade da reforma. 

Como é que a queda do Governo afeta o trabalho que estava a ser feito por este grupo? 

Tudo indica que o grupo de trabalho se vai manter em funções e, considerando que foi recentemente lançado, o atraso de dois meses não tem grande peso e pode ser utilizado para a realização de trabalhos preparatórios. De qualquer forma, o objetivo de apresentar resultados preparatórios no primeiro semestre deverá ser ultrapassado. A questão importante é saber quem ganha as eleições. Se for o atual governo, à partida o grupo de trabalho será mantido, registando-se apenas um ligeiro atraso. Caso o PS ganhe as eleições e venha a formar governo, face ao que já foi afirmado, é expectável que este grupo seja cancelado e é imprevisível o passo seguinte. Por um lado, o PS tem associado a poupança privada para a reforma ao jogo com forte risco de perdas, por outro lado, o Livro Verde, que é uma iniciativa do anterior governo, contém importantes propostas de estímulo e incentivo à poupança de longo prazo para a reforma, tanto de cariz individual como empresarial.

Qual o impacto de se adiar novamente a criação de incentivos para complementos de reforma? 

Depende de quanto é o tempo do adiamento. Se for curto, não tem impacto adicional para além daquele que já hoje existe e que é considerável. Se estivermos a falar de um prazo mais alargado, por exemplo de 15 anos, passamos a ter as pensões dos que se reformam a representar cerca de 40% ou menos dos seus últimos salários e, sem fontes de rendimento adicional, não é possível que se consiga viver condignamente. 

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