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Fecho da fronteira energética com Espanha pesa mais de 17 milhões na fatura

O bloqueio às compras de eletricidade a Espanha, para estabilizar a rede depois do apagão, está a penalizar os preços grossistas, que têm sido bem mais elevados face aos registados no país vizinho nos últimos dias. A partir de hoje, o bloqueio vai ser levantado parcialmente.
8 Maio 2025, 07h00

Desde que o apagão ocorreu a 28 de abril, a fronteira energética com Espanha tem estado fechada no sentido das importações, implicando custos adicionais para Portugal. A fatura já atinge os 17,4 milhões de euros, com os preços grossistas para Portugal a serem superiores aos que estão a ser praticados em Espanha, segundo as contas do JE. Com a fronteira fechada, Portugal não pode importar eletricidade espanhola a preços mais baixos.

O apagão teve origem no sul de Espanha e estendeu-se a Portugal, levando a REN – Redes Energéticas Nacionais a decidir fechar a fronteira no sentido Espanha-Portugal até ontem, dia 7 de maio. “Processo de estabilização em curso” foi a justificação apresentada pelo gestor da rede nacional para travar as importações de eletricidade.

A partir desta quinta-feira, as importações serão retomadas, mas de forma parcial, pois continua a decorrer o “processo de estabilização em curso”, com cerca de um terço da capacidade importadora a ser reposta. O dia “mais caro” para Portugal foi 6 de maio, com o sobrecusto a superar os 5 milhões de euros. Foi também nesse dia que foi atingido o maior diferencial de preços entre Portugal e Espanha: 37,68 euros por MWh.

Entre 8 e 12 de maio, a capacidade de interligação entre Portugal e Espanha estará limitada, no sentido importador, a 1.000 MW, ou seja, esta limitação aplica-se apenas à eletricidade que vem do outro lado da fronteira.

Na sequência do apagão, a REN entregou ao regulador ERSE um relatório preliminar sobre o evento, com o relatório final a ser entregue 20 dias após o apagão que deixou Portugal e Espanha às escuras durante a maior parte do dia 28 de abril.

E de onde vem a eletricidade consumida em Portugal desde o apagão? Na sua grande maioria (326 GWh), tem tido origem nas centrais hídricas, seguidas das eólicas (222 GWh), gás natural (110 GWh) e solar (105 GWh). Já em termos de exportação, Portugal comprou 77 GWh a Espanha no mês de maio, segundo os dados da REN.

Os impactos na fatura para os consumidores domésticos não se deverão fazer sentir, pois os contratos são feitos a médio e longo prazo, adiando qualquer subida para mais tarde, mas somente se os preços elevados em relação a Espanha persistirem. Resta saber como os consumidores vão reagir a partir de hoje com o regresso de um terço da interligação com Espanha. No entanto, quem tem tarifas dinâmicas poderá começar a sentir preços mais elevados. No caso dos consumidores industriais, com contratos mais curtos e mais expostos, resta saber se este sobrecusto vai ser refletido nas suas faturas.

O primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, prometeu na quarta-feira “chegar ao fundo” das causas do apagão e vai exigir “responsabilidades” aos culpados que deixaram a Ibéria às escuras durante a maioria do dia 28 de abril. Sánchez disse no Parlamento espanhol que estão a ser analisados 756 milhões de dados do sistema elétrico sobre o incidente, prometendo tornar público “tudo o que se descubra”, embora “levará tempo”, rejeitando culpar as energias renováveis.

Analisando as diferenças de preços entre Portugal e Espanha, o especialista em energia António Vidigal apontou no dia 6 de maio que “a consequência foi uma profunda divergência dos preços da eletricidade entre Portugal e Espanha. Portugal manteve a sua soberania energética, mas para não importar eletricidade, pagou-a mais cara. Espanha está com excesso de produção solar de baixo custo que Portugal não está a aproveitar. Para substituí-la, está a fazer funcionar os ciclos combinados a gás natural, com um custo que deve ser de 100 €/MWh”.

“Coloca-se a pergunta: ‘É melhor importar gás natural para produzir eletricidade a 100 €/MWh, ou importar diretamente eletricidade de Espanha a um preço perto de zero?’ Para mim, a escolha é óbvia, embora para muitos não o seja. Satisfeitos devem estar os produtores de LNG dos Estados Unidos, que são os maiores fornecedores da Europa. Portugal é um dos países mais avançados na adoção de energia renovável, o que obriga a que consiga ser também o mais avançado em relação aos modelos de mercado”, acrescentou o perito.

“Espero que esta situação de separação económica acabe rapidamente. Para isso acontecer, os dois TSOs – REE e REN – deverão rapidamente identificar a causa raiz do apagão de 28 de abril de 2025, de forma a conseguirem atuar no sentido de minimizar a sua repetição. Portugal beneficia de estar integrado no Mercado Ibérico de Eletricidade, mas há muito trabalho a fazer entre os TSOs dos dois países, ao nível técnico, para aumentar a resiliência do Sistema Ibérico”, defendeu António Vidigal.

“Eletricidade vem de Espanha porque é mais barata. Não querem ter eletricidade mais barata?”

António Sá da Costa disse que Portugal compra eletricidade a Espanha durante certas horas do dia porque os preços são mais baixos. Os dois países estão inseridos no mercado ibérico de eletricidade e as compras são feitas consoante preços competitivos.

“A eletricidade vem de Espanha porque é mais barata. As pessoas não querem ter a eletricidade mais barata possível? Não há volta a dar”, disse o especialista em energia ao JE após o apagão ibérico registado na semana passada.

“Não podemos estar desligados de Espanha. Quem diz isso não sabe do que fala”, referiu sobre as críticas feitas por certos comentadores acerca de Portugal estar a comprar 30% da sua eletricidade a Espanha durante o apagão.

O responsável apontou que o problema teve origem em Espanha e que Portugal foi apanhado pelo apagão energético. “Por muito cuidado que eu tenha a guiar o meu carro, não consigo evitar que o condutor do outro veículo venha bater no meu carro. Espanha não fez de propósito, não são inconscientes. Há um conjunto de circunstâncias”, resumiu o antigo líder da Associação Portuguesa de Energias Renováveis (APREN).

“A rede elétrica europeia vai do Cabo da Roca aos Urais. É a maior máquina que o homem já construiu. Está tudo ligado. Tem grandes vantagens, mas também inconvenientes. O balanço é positivo, mas nenhuma máquina é 100% fiável”, defendeu.

Sobre a necessidade de centrais a gás como backup do sistema, afirma que defende a sua existência, mas que qualquer outro tipo de tecnologia falharia quando o apagão teve origem em Espanha. “Qualquer tipo de central, o incidente teria sido o mesmo. Os procedimentos de segurança e de rede seriam iguais, com outras centrais a funcionar naquele momento”, concluiu.

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