[weglot_switcher]

Providência Cautelar para suspender conversão de ações da Inapa sustentada no benefício “ilegal” aos acionistas maioritários

A conversão de ações preferenciais em ações ordinárias da Inapa, e o rácio de conversão aprovado, configura um “especial beneficio” para os acionistas maioritários (BCP e CGD) que fizeram a proposta e num prejuízo para o acionista minoritário, Nova Expressão. “Sendo assim, essas deliberações, manifestamente abusivas, são anuláveis”. Este é o argumento que sustenta a Providência Cautelar que aguarda decisão do juiz.
Cristina Bernardo
3 Abril 2019, 07h45

A Nova Expressão aguarda a decisão do juiz do Tribunal do Comércio de Lisboa à Providência Cautelar, interposta no final do ano passado (a 26 de novembro), para suspender as deliberações sociais da Assembleia Geral da Inapa de 15 de novembro de 2018, de conversão das ações preferenciais da Inapa, sem direito de voto, em ações ordinárias, ao rácio de 1,25.

As audiências do juiz para avaliar a Providência Cautelar acabam hoje, quarta-feira, dia 3 de abril, sendo que a Nova Expressão – acionista minoritária da Inapa – espera que a decisão do Tribunal seja conhecida “poucos dias depois”, tal como explicou Manuel Falcão, diretor geral da Nova Expressão, ao jornal online ECO e que o Jornal Económico confirmou junto de Pedro Baltazar, Presidente do Conselho de Administração.

A Providência Cautelar antecede a ação principal que consiste no pedido de anulação das duas deliberações da assembleia de 15 de novembo. A ação principal será interposta por este acionista minoritário da Inapa que se considera prejudicado por uma deliberação proposta pelos acionistas maioritários (os bancos CGD e BCP) e que os beneficiou em detrimento dos acionistas minoritários.

A Providência Cautelar, depende assim de uma ação principal que ainda vai entrar no tribunal. A Nova Expressão pretende, com esta Providência, salvaguardar “o risco da verificação de prejuízos entre a data da deliberação e a data em que venha a ser proferida a sentença de anulação das deliberações sociais, caso venha a ser procedente, como se espera, o pedido a formular”, refere o documento a que o Jornal Económico teve acesso.

Pedido de anulação com base no artigo 58º do Código das Sociedades Comerciais

Esta Providência Cautelar, assinada pelos advogados, Luís Froes e Ana Grosso Alves, sustenta o pedido de suspensão das deliberações sociais (conversão das ações preferenciais em ordinárias ao rácio de 1,25) na convicção que essas deliberações “foram tomadas em grave prejuízo” do acionista minoritário, Nova Expressão, e com o “abusivo propósito de obtenção de benefícios especiais para os acionistas maioritários” da Inapa, sendo, por essa razão, “anuláveis”, com base no nº1, alinea b) do artigo 58º do Código das Sociedades Comerciais (Deliberações anuláveis) e que diz que “são anuláveis as deliberações que sejam apropriadas para satisfazer o propósito de um dos sócios de conseguir, através do exercício do direito de voto, vantagens especiais para si ou para terceiros, em prejuízo da sociedade ou de outros sócios ou simplesmente de prejudicar aquela ou estes, a menos que se prove que as deliberações teriam sido tomadas mesmo sem os votos abusivos”.

O Procedimento Cautelar de suspensão das deliberações sociais relata os vários passos que levaram a Nova Expressão SGPS de uma participação na Inapa de 13,2% de ações ordinárias e 0,45% de ações preferenciais, que lhe davam uma posição de 4,69% dos votos; para uma posição de 4,08% dos direitos de voto, após decisão de conversão das ações preferenciais da Inapa, sem direito de voto, em ações ordinárias, ao rácio de 1,25.

A Inapa, que está cotada em Bolsa, tem ainda como acionistas, a Parpública, que tinha 32,72% à data da assembleia-geral e 8,22% dos votos, e com a conversão aprovada em AG passa para 9,33% do capital.

A participação imputável à CGD era de 49,75% de ações preferenciais e 0,002% de ações ordinárias, o que configurava uma percentagem de votos de 24,94%, passou a deter 35,37% da Inapa após a conversão.

O BCP que tinha, direta e indiretamente, 8,47% de ações ordinárias e 40,39% de ações preferenciais, o que lhe dava 29,77% dos direitos de voto, passou para uma participação de 31,29% com voto.

Finalmente, o Novo Banco, que tinha 9,16% de ações preferenciais e 6,55% dos votos e passou a ter 6,11% do capital e votos da Inapa, após a conversão a que Nova Expressão pretende anular.

Estas ações preferenciais não tinham voto mas era suposto darem direito a receber um dividendo prioritário que correspondia a 5% do valor unitário da emissão (como a emissão foi a 0,18 euros o dividendo seria de 0,0009 euros), no entanto tal acabou por nunca acontecer. Mas as ações preferenciais passavam a ter direito de voto caso não houvesse dividendos por dois anos seguidos, o que aconteceu e assim desde 2014 que os bancos passaram a ter direitos de voto na Inapa. Isso alterou significativamente os direitos de voto na empresa.

É de salientar que em janeiro deste ano, a Caixa Geral de Depósitos anunciou ter vendido uma participação de 33,01% da Inapa e ações preferenciais sem voto representativas de 49,47% (mais de 148 milhões de ações), ao Estado português deixando de ter qualquer participação na Inapa.

Em 2017 começou a ser abordada pela administração da papeleira Inapa, a hipótese de conversão das ações preferenciais sem voto em ações ordinárias com voto.

A Nova Expressão suspeita que a projetada conversão das ações teria origem num plano previamente concertado entre os quatro principais acionistas da Inapa (Parpública, CGD, BCP e Novo Banco) com o propósito de obterem um “benefício abusivo” com a conversão.

O que alega a Nova Expressão na Providência Cautelar?

Que os bancos BCP e CGD encetaram uma estratégia de pressão, junto da administração da Inapa, para que se operasse a conversão das ações preferenciais em ordinárias, o que, segundo alega a Nova Expressão, beneficiaram os bancos na estrutura acionista da papeleira.

“O Grupo CGD e o Grupo Millennium BCP ver-se-iam premiados com um beneficio especial na conversão em detrimento dos acionistas com um peso inferior na estrutura de capital da Inapa”, alega a Nova Expressão, acionista minoritário, que nunca subscreveu qualquer deliberação de conversão das ações.

A Nova Expressão recorda que essa pressão foi exercida por os bancos terem uma dupla qualidade: de acionistas (o BCP e CGD tinham juntos 89,86% das ações preferenciais e 11,002% de ações ordinárias) e de credores, pois a Inapa tinha em 31 de dezembro de 2017 uma dívida em empréstimos e outros financiamentos de 315,7 milhões de euros, dos quais os empréstimos bancários representavam uma fatia significativa. Entre os principais credores estava o BCP e a CGD (e também o Novo Banco).

A Providência Cautelar argumenta que “é fácil perceber as vantagens para os bancos [BCP e CGD] tanto no plano das suas posições de capital social, como no plano dos respetivos direitos de voto, resultantes da conversão”.

A Nova Expressão traz ainda ao conhecimento do juiz a existência de um relatório elaborado pela PwC, de 21 de agosto de 2018, a pedido da administração da Inapa, que apontava para um rácio de conversão das ações entre o 1,05 e o 1,40. Sendo que o teto máximo considerava o pressuposto de que a empresa distribuiria a totalidade dos dividendos preferenciais a partir do exercício seguinte (e de forma perpetua), e o teto mínimo (termo de troca 1,05) que considerava o pressuposto de que a Inapa não efetuaria a distribuição de dividendos, ou a efetuaria apenas no longo prazo). Segundo o documento da Providência Cautelar, “após a observação da expetativa dos investidores ou do montante do dividendo prioritário distribuído o termo de troca fixou-se entre 1,05 e 1,5”.

Ora, alega a autora da Providência Cautelar, que no dia 25 de outubro de 2018, sob pedido do Conselho de Administração da Inapa, foram convocadas três assembleias-gerais para o dia 15 de novembro, e que nas duas primeiras o ponto em agenda era a conversão das ações preferenciais em ordinárias, e que a proposta levada pela administração da papeleira era que cada ação preferencial correspondesse a 1,10 ações ordinárias. Mas que no mesmo dia, a acionista Parcaixa (da CGD) requereu a inclusão de duas propostas de deliberação que consistiam na conversão das ações preferenciais em ações ordinárias ao rácio de 1,25. “Esse termo de troca era superior não só ao proposto pelo Conselho de Administração, mas também ao limite máximo do intervalo de conversão (1,05 a 1,15) apurado pela PwC”, alega a Nova Expressão que alerta que a proposta da Parcaixa não foi acompanhada de nenhuma fundamentação.

“A CGD lançou uma contraproposta altamente favorável aos seus interesses, pois a adoção de um rácio de conversão de 1,25 permitira alargar de forma extraordinária o universo de ações ordinárias, e consequentemente o seu poder de voto”, diz a autora da ação que reclama existir um prejuízo para si com esta conversão, dado que vê as suas participações diluídas de forma desproporcional.

A Nova Expressão conclui que a aplicação deste rácio de conversão às ações da Inapa, “para além de dar lugar a um benefício ou prémio na conversão das ações que carece de qualquer justificação plausível, é suscetível de beneficiar determinados acionistas com uma posição maioritária em detrimento dos acionistas com um peso inferior na estrutura acionista” e como tal “esta ação e votação desses acionistas maioritários será manifestamente abusiva, priorizando arbitrária e indevidamente os seus interesses individuais face aos legítimos interesses da sociedade e dos acionistas minoritários, e como tal é ilegal e ilegítima”, lê-se no processo.

A conversão das ações teve os votos favoráveis do BCP, Ocidental, Parpública, Parups e Parcaixa. Sendo que na conversão a Parpública diluiu o seu poder de voto, dado o maior rácio de conversão, o que a Nova Expressão chama de “pendor altruísta” a favor da CGD, ambas do Estado.

Depois a autora da ação desmonta o argumento “que a administração da Inapa passou a veicular, a partir de certo momento, que a conversão das ações se afigurava necessária à concretização da aquisição da empresa alemã Papyrus Deutschland”, cujo acordo de compra e venda foi assinado a 24 de outubro de 2018. Dizendo que “os contactos preliminares com a OptiGroup AB, datados de finais de 2017, são posteriores ao momento em que a administração da Inapa iniciou o estudo do dossier respeitante à conversão das ações preferenciais, que se reporta pelo menos a agosto de 2017”, altura em que foi pedido um primeiro relatório à PwC para análise da conversão dos títulos.

O preço de aquisição da Papyrus seria pago através da entrega à dona da empresa alemã (OptiGroup AB) de obrigações convertíveis em ações ordinárias que seriam emitidas pela Inapa no valor de 15 milhões de euros e o pagamento adicional ao fim do um ano de um valor sujeito a ajustes. “Uma quantia a ser diferida por um período de um ano através da emissão de um instrumento de crédito (vendor loan note), cujo valor preliminar está sujeito a ajustes nos termos do acordo de compra e venda de ações”, referia na altura o comunicado da compra.

Foi defendido pela Inapa que a conversão das ações facilitaria a aquisição da Papyrus e houve até uma carta conforto assinada pelos acionistas da papeleira (exceto pela Nova Expressão) entregue à OptiGroup, onde aqueles se comprometiam com a conversão das ações.

Por tudo isto, a Nova Expressão alega que as deliberações tomadas nas AG de 15 de novembro, são inválidas porque “foram tomadas com o intuito de obtenção de benefícios especiais para os acionistas dos Grupos BCP e CGD e despoletadas por esses acionistas” e por isso “são anuláveis” à luz do artigo 58º do Código das Sociedades Comerciais, conclui a acionista minoritária.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.