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União Europeia e Reino Unido debatem espaço necessariamente comum

Pela primeira vez desde o Brexit, os dois blocos europeus debatem o espaço comum, finalmente percebendo que o Canal da Mancha é demasiado estreito para servir de barreira aos entendimentos necessários. O acordo já está nas mãos dos governos dos 27.
FILE PHOTO: Britain’s Labour Party leader, Keir Starmer leaves his home in London, Britain May 10, 2021. REUTERS/Toby Melville/File Photo
19 Maio 2025, 09h44

Napoleão Bonaparte demorou dez anos a percebê-lo e os nossos contemporâneos nove (o referendo ao Brexit teve lugar em junho de 2016): o Canal da Mancha é demasiado estreito para servir de barreira aos entendimentos comerciais, logísticos, de segurança e de defesa para manter a União Europeia e o Reino Unido afastados. Foram precisos vários anos para os ‘hardbrexiters’ perceberem que o orgulho britânico de continuarem sozinhos não levaria a lado nenhum – até porque o previsto entendimento de largo espectro com os Estados Unidos nunca aconteceu. E essa é a primeira causa – e segundo será certamente a insegurança que a guerra na Ucrânia lançou sobre todo o continente e as suas insularidades – para a cimeira que tem início esta segunda-feira entre os dois blocos.

Nesse contexto, e segundo os analistas, o Reino Unido está prestes a concordar com a redefinição mais próxima dos laços com a União Europeia desde, tentando encontrar uma colaboração mais estreita nas áreas do comércio e da defesa para ajudar a fazer crescer a economia e aumentar a segurança do continente.

O primeiro-ministro Keir Starmer, que apoiou a permanência britânica na União, apostou que aliviar os atritos comerciais e garantir benefícios tangíveis para os britânicos. E se, em casa, vai ter de se haver com as acusações de “traição” sobre ele lançadas pelo extremista Nigel Farage, Starmer sabe – depois de mais uma vez ter sido mal recebido em Washington – que a aproximação entre Londres e Bruxelas é imperativa. “É hora de olhar para a frente – para seguir em frente deixando para trás as velhas lutas políticas e encontrar soluções práticas e de bom senso que melhorem a vida do povo britânico”, disse Starmer para explicar a sua ‘traição’.

No centro da redefinição das relações entre os dois blocos está um pacto de defesa e segurança que pode permitir que as empresas de defesa britânicas participem no programa de 150 mil milhões de euros para rearmar a Europa. Por outro lado, os dois lados concordaram em abrir acesso às águas pesqueiras por 12 anos – uma medida que provavelmente será criticada por políticos e pela indústria – removendo controlos de fronteira e a papelada que impediram muitos pequenos pescadores de ‘fazerem pela vida’ desde 2020. O Reino Unido também esperava garantir o acesso a portões eletrónicos mais rápidos para viajantes do país nos aeroportos da União – mas mantendo um regime limitado de mobilidade de jovens (apesar de querer participar no programa Erasmus).

As negociações continuaram durante a noite para ficar garantida uma base aceitável que pudesse transformar o encontro entre Starmer com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e o presidente do Conselho Europeu, António Costa, num facto com consequências positivas.

Convém recordar que, desde o Brexit, os conservadores viram cinco primeiros-ministros tentarem e não conseguirem encontrar um caminho alternativo à Europa. Starmer – cuja folgadíssima vitória sobre os conservadores que dá o direito político de tentar outra via – não quer repetir os clamorosos falhanços dos seus antecessores. E para isso conta com a ‘preciosa’ contribuição de Donald Trump: a ‘loucura’ das tarifas e a perspetiva de encerramento das fronteiras norte-americanas convenceu até os mais reticentes (com a exceção do grupo Farage) de que a Europa é a alternativa mais aceitável para o crescimento económico do Reino Unido. As sondagens mostram que a maioria dos britânicos está arrependida de ter votado favoravelmente o Brexit.

O primeiro-ministro britânico e o presidente francês, Emmanuel Macron, estabeleceram um relacionamento sólido sobre o seu apoio à Ucrânia, e a partir daí tudo se tornou claro: os dois blocos precisam de um entendimento. Os benefícios económicos serão com certeza limitado pela promessa de Starmer de não voltar ao mercado único ou à união aduaneira, mas o primeiro-ministro britânico procurará negociar um melhor acesso ao mercado em algumas áreas – uma tarefa difícil quando a UE se opõe à chamada “escolha seletiva” dos benefícios da UE sem as obrigações de adesão.

A remoção da burocracia no comércio de alimentos exigirá que a Grã-Bretanha aceite a supervisão da UE sobre os padrões de produção, mas Starmer provavelmente argumentará que vale a pena ajudar a reduzir o custo dos alimentos e promover a economia por essa via.

Para todos os efeitos, a União Europeia e o Reino Unido chegaram a um acordo provisório sobre defesa e segurança, pesca e mobilidade de jovens antes da cimeira, abrindo caminho para que empresas britânicas participem nos grandes contratos de defesa. Representantes de governos da UE em Bruxelas receberam o texto desse entendimento comum e o documento será em princípio aprovado por todos os 27 governos da União.

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