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Gaza: Reino Unido, França e Canadá ameaçam retirar apoio a Israel

Os países europeus estão a reagir à decisão israelita de aumentar a pressão da guerra no enclave de Gaza. Multiplicam-se as iniciativas em favor do regresso da ajuda humanitária, mas os analistas sabem que só uma ordem de Washington poderá mudar a postura de Netanyahu.
FILE PHOTO: Flames and smoke rise during Israeli air strikes amid a flare-up of Israel-Palestinian violence, in the southern Gaza Strip May 11, 2021. REUTERS/Ibraheem Abu Mustafa
21 Maio 2025, 07h00

Vários países tradicionalmente aliados de Israel prometeram tomar medidas concretas caso Israel não suspenda a sua ofensiva sobre o enclave de Gaza e impeça a entrada de ajuda humanitária aos palestinianos. Três dos aliados de Israel – Reino Unido, França e Canadá – emitiram uma declaração conjunta manifestando a sua oposição à expansão da ação militar de Israel na Faixa de Gaza, que o governo de Benjamin Netanyahu apresenta como a solução final para acabar com o Hamas no enclave.

O primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, prometeu que Israel “assumirá o controlo” da Faixa de Gaza, numa escalada do conflito que os seus aliados classificaram como “flagrante”. As condições em Gaza são “intoleráveis”, afirmaram os três países, que apelaram ao líder israelita para “permitir a entrada imediata de ajuda humanitária em Gaza”. Desde 2 de março, Israel não permite a entrada de ajuda no enclave, agravando uma situação que se vem deteriorando desde o início do conflito e que tem sido repetidamente condenada por grupos de ajuda humanitária, incluindo as Nações Unidas.

Os membros de extrema-direita do gabinete de Netanyahu criticaram a decisão de permitir a entrada de ajuda em Gaza, que o primeiro-ministro aceitou sob pressão internacional. No entanto, tudo continuou a ser insuficiente para solucionar uma situação que todos os observadores no terreno descrevem como desesperada. Os três países afirmaram que a ajuda humanitária prestada é “totalmente inadequada” e que a negação de assistência essencial à população civil é inaceitável, correndo o risco de violar o Direito Internacional Humanitário. Os três governos ameaçaram com “ações concretas” se Israel não puser termo à ofensiva e não permitir o regresso da ajuda à Faixa de Gaza.

No entanto, nada disso demove Netanyahu, que respondeu à mensagem conjunta insistindo que Israel prosseguiria as suas ações até à vitória total. “Os líderes de Londres, Otava e Paris estão a oferecer um enorme prémio pelo ataque genocida contra Israel em 7 de outubro, ao mesmo tempo que convidam a mais atrocidades deste tipo”, afirmou, citado pela imprensa internacional, repetindo uma retórica que tem utilizado desde o início do conflito. O primeiro-ministro israelita apelou a todos os “líderes europeus” para que sigam a “visão” do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Trump criticou a crise no enclave durante uma visita à região, que não incluiu uma paragem em Israel, na semana passada. O Estado hebraico lançou uma nova ofensiva terrestre em Gaza quase imediatamente após o fim da visita de Trump.

Os jornais indicam que uma vaga de ataques aéreos matou centenas de pessoas durante o passado fim de semana, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, que não faz distinção entre civis e combatentes. Do seu lado, Netanyahu afirmou que “os combates são intensos e estamos a fazer progressos. Vamos tomar o controlo de todo o território da Faixa”.

A declaração do Reino Unido, França e Canadá reiterou o apoio a um cessar-fogo e a uma “solução de dois Estados”, preconizada pela ONU, segundo a qual um Estado palestiniano existiria ao lado de Israel. As três nações – que têm vindo a convergir em diversos dossiês de política internacional – disseram ainda que se opõem a “qualquer tentativa de expandir os colonatos na Cisjordânia”, que consideram “ilegais”.

Uma outra declaração emitida pelos ministérios dos Negócios Estrangeiros da Alemanha, Itália, Japão e 18 outros países apelava a Israel para que permita a total entrega de ajuda humanitária a Gaza pelas Nações Unidas e outras ONG.

O comissário-geral da Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinianos (UNRWA), Philippe Lazzarini, disse entretanto que Donald Trump tem o poder de mudar a situação dos palestinianos em Gaza se pressionar Israel a levantar totalmente o bloqueio de mais de dois meses à entrada de ajuda humanitária na Faixa. “Acredito que o presidente Donald Trump tem a influência necessária para mudar a situação em Gaza e garantir que o cerco seja levantado e que a população tenha acesso à assistência que merece”, afirmou Lazzarini à agência Euronews. “É um ultraje sermos confrontados com uma situação de fome em Gaza. É uma situação completamente inventada. Estamos numa situação em que a fome e a alimentação estão a ser utilizadas como armas para fins políticos e militares”, acrescentou.

Os ministros dos Negócios Estrangeiros europeus deverão debater a possibilidade de uma resposta mais firme a Israel, nomeadamente uma proposta neerlandesa para rever o acordo UE-Israel que rege o comércio e a cooperação entre ambas as partes. A proposta, apoiada por pelo menos dez Estados-membros, deverá ser “analisada” para monitorizar o cumprimento do direito humanitário internacional por parte de Israel, disse Lazzarini. No entanto, a incapacidade da União Europeia de encontrar uma forma de ter uma palavra consequente na região é amplamente conhecida, e o governo de Netanyahu não tem tido dificuldade em desconsiderar os apelos provenientes do bloco dos 27.

Recorde-se que Israel tem um plano, apoiado pelos Estados Unidos, que prevê a utilização de uma instituição de solidariedade e de empresas privadas para distribuir ajuda em Gaza a partir de novos centros, que deverá estar operacional até ao final da semana. O plano foi firmemente rejeitado pela ONU por violar o princípio da neutralidade da ajuda humanitária. Lazzarini afirmou que o plano iria “cortar a ajuda aos mais vulneráveis” e desencadear a “deslocação forçada da população, numa altura em que também está a decorrer uma operação militar em grande escala”.

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