Desde que entrou em vigor, em 1989, o IRC sofreu várias alterações, destacando-se, entre outras, a sua adaptação à evolução da contabilidade, a redução da taxa nominal (dos iniciais 36% para os atuais 20%), a introdução de regimes simplificados, da tributação autónoma e da Derrama Estadual. A sua última reforma, em 2014, visava alinhar Portugal com as melhores práticas europeias, simplificando e modernizando a tributação direta das empresas e estimulando o investimento privado e a competitividade do sistema fiscal no plano internacional. Contudo, passados onze anos, o sistema dá sinais preocupantes de complexidade excessiva, proliferação de benefícios fiscais de difícil aplicação e de uma grande carga administrativa, sobretudo para as micro, pequenas e médias empresas, que representam mais de 99% do tecido empresarial português.
A atual taxa nominal de 20% (16% para os primeiros 50.000€ de matéria coletável das PME), acrescida das derramas e tributação autónoma, após deduções e benefícios fiscais, não reflete a tributação final das empresas. Segundo o INE, a taxa média efetiva de IRC para a generalidade das empresas situava-se recentemente entre os 18% e os 19%.
Ora, não será o momento de aproveitar a (aparente) convergência política sobre a necessidade de reduzir as taxas nominais para iniciar uma verdadeira reforma? O Governo pretende avançar com a redução gradual da taxa nominal até 17%, eliminar progressivamente as derramas (Estadual e Municipal), racionalizar benefícios fiscais dispersos e eliminar exceções e regimes especiais de verificação complexa. O Chega propunha no seu programa eleitoral a descida (gradual) da taxa para 15%, defendendo a IL igual redução (mas imediata) e a eliminação da tributação autónoma, enquanto o PS prometia uma descida do IRC para empresas que reinvistam lucros e valorizem salários.
Em suma, esta aparente convergência política quanto à redução das taxas de IRC deveria refletir-se já no próximo Orçamento do Estado, dando-se sinais claros da vontade de reformar um imposto compatível com o mundo e com as empresas de hoje.
Esta redução da tributação nominal, aliada à vontade de garantir benefícios fiscais mais seletivos e de proporcionar uma taxa efetiva competitiva e estável, numa economia superavitária e com a entrada em vigor das regras do Pilar 2 da OCDE, adotadas por Portugal (que impõem a tributação mínima efetiva de 15% para grandes grupos multinacionais), são uma excelente ocasião para reavaliar todo o sistema, indo além de meros ajustes. É que para atrair investimento e evitar a deslocalização de receitas, a redução das taxas nominais ajuda, mas não basta.
Naturalmente, importa recordar que o IRC representa mais de 10% da receita fiscal do Estado (cerca de € 7,7 mil milhões), sendo crucial para o financiamento das funções públicas essenciais. Qualquer redução significativa da taxa terá de ser compensada pelo alargamento da base tributável, o que só será possível com mais investimento, eliminação de benefícios ineficazes e reforço do combate à evasão fiscal.
Uma coisa é certa: deverá reconhecer-se a necessidade de aplicar mecanismos de compensação que se centrem fundamentalmente na redução da despesa pública.
O OE para 2026 será, assim, uma oportunidade de ouro para a maioria parlamentar demonstrar que pretende uma estratégia nacional sustentável e de longo prazo para o país. Mas os sinais de convergência entre o Governo e os principais partidos sobre o futuro do IRC devem também proporcionar uma avaliação séria que conduza a uma nova reforma estrutural do imposto que resulte, rapidamente, na sua simplificação, de forma transparente e cirúrgica.
Esta reforma deverá reforçar o papel do IRC como estímulo ao crescimento económico, consolidando a proporcionalidade do imposto, simplificando o apuramento do resultado fiscal e alinhando-o com o resultado contabilístico, reduzindo a complexidade das correções ao lucro tributável, eliminando redundâncias e introduzindo uma tributação nominal que conduza, finalmente, à tributação mínima efetiva alinhada com os 15% do Pilar 2. Será, igualmente, fundamental eliminar instrumentos como a Derrama Estadual e a tributação autónoma, que se tornaram há muito desajustados e contra a lógica do imposto.
Em suma, esta aparente convergência política quanto à redução das taxas de IRC deveria refletir-se já no próximo Orçamento do Estado, dando-se sinais claros da vontade de reformar um imposto compatível com o mundo e com as empresas de hoje. Só assim se promove o crescimento económico, a criação de emprego e a sustentabilidade das finanças públicas, colocando o IRC ao serviço do desenvolvimento do país e da competitividade das empresas portuguesas que são muito diferentes das de há onze anos.
Este artigo é da autoria da VdA.
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