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NATO compromete-se com Donald Trump: gastar mais em armas americanas

Mesmo sabendo que os investimentos serão feitos a várias velocidades e com as reticências de Espanha, que o presidente dos EUA ameaçou, os outros 30 membros da aliança comprometeram-se com tudo o que veio de Washington, aliviando-se do pânico de que a estrutura militar desaparecesse.
epa12190386 US President Donald Trump delivers an address to the nation following US strikes on Iran’s nuclear facilities, at the White House in Washington, DC, USA, 21 June 2025. EPA/Carlos Barria / POOL
26 Junho 2025, 07h00

Os líderes dos países da NATO apoiaram o grande aumento nos gastos com defesa exigido pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e reafirmaram o seu compromisso de se defenderem em caso de ataques, após uma inesperadamente breve cimeira nos Países Baixos. Embora Trump tenha conseguido o que queria na reunião anual, feita sob medida, os seus aliados ficaram aliviados por o presidente dos Estados Unidos ter-se comprometido com o princípio fundamental da defesa coletiva – já depois de, no dia anterior, ter deixado transparecer dúvidas sobre o assunto. Para os analistas, as palavras de Trump na terça-feira serviram para manter viva a ‘chantagem’: ou há unanimidade, ou os Estados Unidos e todo o seu poder militar saem da aliança.

Trump – que não é conhecido por cumprir acordos firmados anteriormente, como pode ver-se pelo estranho caso das tarifas – disse na conferência de imprensa que “tivemos aqui uma grande vitória”, acrescentando que esperava que os fundos adicionais fossem gastos em equipamentos militares feitos nos Estados Unidos. Afigura-se, assim – e tal como o JE tinha antecipado depois de ouvir vários analistas – que o propagandeado investimento da União Europeia numa indústria de armamento e defesa fica claramente posto em causa. A ideia de Trump é vender armas aos europeus – como aliás lhe pediu a poderosa indústria norte-americana do armamento – e não ficar a observar a criação de empresas europeias de armamento.

Chantagem sobre Espanha

Donald Trump não se esqueceu de que, no final da semana passada, o chefe do governo espanhol, o socialista Pedro Sánchez – que lidera uma coligação com vários partidos anti-NATO – disse que Madrid e não Washington decidirá o futuro da sua indústria da defesa. Nesse contexto, o presidente dos Estados Unidos ameaçou punir a Espanha. “Acho isso terrível. Sabe, eles (Espanha) estão muito bem. E essa economia pode ser destruída se algo de mau acontecer”, disse, acrescentando que a Espanha pode contar com um acordo comercial (as tais tarifas) mais penalizador do que os outros países da União Europeia. “A Espanha é o único país que não vai pagar o valor total. Eles querem ficar em 2%, acho terrível”, afirmou, antes de dizer que dobrará as tarifas planeadas para a Espanha se o governo de Pedro Sánchez recusar alocar 5% do PIB aos gastos militares. “Eles querem usar um chapeuzinho, mas vão ter que nos devolver no comércio, porque não vou deixar isso acontecer”, disse o presidente, que especificou que ele próprio será o responsável por essas negociações comerciais.

A recusa da Espanha em comprometer-se com um aumento de gastos que acredita ser desnecessário levou a que a declaração final de Haia aprimorasse a linguagem para evitar termos como “nós” ou “cada aliado” e, assim, ser assinada por todos. A Espanha obteve, ao mesmo tempo, uma flexibilidade que lhe permitirá dedicar um orçamento menor, como afirma ser suficiente, para cumprir os seus objetivos militares, refere a imprensa espanhola. Sánchez insistiu, após a assinatura do acordo, que a despesa que a Espanha calculou e que gerou polémica (2,1% do PIB) é “suficiente, realista e compatível” com o modelo social espanhol.

Segundo as agências internacionais, o presidente francês, Emmanuel Macron, também demonstrou desconforto com tanto alinhamento face a Washington. Macron levantou a questão das altas tarifas às importações colocadas em cima da mesa por Trump e não se furtou a referir os danos que podem causar ao comércio transatlântico. Deixou mesmo a ideia de que as tarifas podem ser uma barreira ao aumento dos gastos com a defesa.

“Não podemos dizer que vamos gastar mais e depois, no coração da NATO, lançar uma guerra comercial”, disse Macron – seria “uma aberração”. Ele disse ter levantado o assunto diversas vezes com Trump.

Na declaração final de cinco pontos, também ela breve e assinada pelos 32 membros, a NATO diz: “reafirmamos o nosso firme compromisso com a defesa coletiva, conforme está consagrado no Artigo 5 do Tratado de Washington — que um ataque a um é um ataque a todos.” Questionado sobre o referido Artigo e os seus comentários ambíguos, Trump disse: “Eu apoio. É por isso que estou aqui. Se eu não o apoiasse, não estaria aqui”.

O secretário-geral da NATO, Mark Rutte – que organizou a cimeira na sua cidade natal, Haia, e não em Bruxelas, como é tradição e onde se encontra a sede da organização desde que De Gaulle a expulsou de Paris – disse que a organização emergirá como uma aliança “mais forte, mais justa e mais letal”. Considerado um ‘homem de mão’ de Trump, o neerlandês disse que o presidente norte-americano merecia “todos os elogios” por conseguir que os Estados-membros concordassem em aumentar os gastos com a defesa.

A acreditar nas agências internacionais, Rutte não terá, em nenhuma circunstância, feito referência ao grande ausente da cimeira, o presidente Volodymyr Zelensky. Em 2023, o presidente da Ucrânia deslocou-se pessoalmente à cimeira da NATO em Vilnius, tal como fez no ano seguinte em Washington. Mas o mal-estar sobre o assunto é uma evidência para todos.

As metas dos gastos

A nova meta de gastos — a ser alcançada nos próximos 10 anos — representa um salto de centenas de milhões de dólares por ano em relação à meta atual dos 2% do PIB, que alguns Estados-membros ainda não cumprem – Portugal, por exemplo, é um dos seis países dos 32 que menos gasta em defesa. Os países comprometeram-se a gastar 3,5% do PIB em defesa básica – como tropas e armamento – e 1,5% em medidas mais amplas relacionadas com a defesa, como segurança cibernética, proteção de oleodutos e adaptação de estradas e pontes para receber veículos militares pesados.

Para atingir o limite de 5%, os países da União Europeia, cuja dívida conjunta está próxima dos 80% do PIB, terão de triplicar os 325 milhões de euros gastos em defesa no ano passado, para mais de 900 mil milhões. É certo que terão dez anos para o fazer, mas também não deixa de ser verdade que é um objetivo para manter ‘ad aeternum’ – ou pelo menos enquanto a NATO existir.

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