Os líderes dos países da NATO apoiaram o grande aumento nos gastos com defesa exigido pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e reafirmaram o seu compromisso de se defenderem em caso de ataques, após uma inesperadamente breve cimeira nos Países Baixos. Embora Trump tenha conseguido o que queria na reunião anual, feita sob medida, os seus aliados ficaram aliviados por o presidente dos Estados Unidos ter-se comprometido com o princípio fundamental da defesa coletiva – já depois de, no dia anterior, ter deixado transparecer dúvidas sobre o assunto. Para os analistas, as palavras de Trump na terça-feira serviram para manter viva a ‘chantagem’: ou há unanimidade, ou os Estados Unidos e todo o seu poder militar saem da aliança.
Trump – que não é conhecido por cumprir acordos firmados anteriormente, como pode ver-se pelo estranho caso das tarifas – disse na conferência de imprensa que “tivemos aqui uma grande vitória”, acrescentando que esperava que os fundos adicionais fossem gastos em equipamentos militares feitos nos Estados Unidos. Afigura-se, assim – e tal como o JE tinha antecipado depois de ouvir vários analistas – que o propagandeado investimento da União Europeia numa indústria de armamento e defesa fica claramente posto em causa. A ideia de Trump é vender armas aos europeus – como aliás lhe pediu a poderosa indústria norte-americana do armamento – e não ficar a observar a criação de empresas europeias de armamento.
Chantagem sobre Espanha
Donald Trump não se esqueceu de que, no final da semana passada, o chefe do governo espanhol, o socialista Pedro Sánchez – que lidera uma coligação com vários partidos anti-NATO – disse que Madrid e não Washington decidirá o futuro da sua indústria da defesa. Nesse contexto, o presidente dos Estados Unidos ameaçou punir a Espanha. “Acho isso terrível. Sabe, eles (Espanha) estão muito bem. E essa economia pode ser destruída se algo de mau acontecer”, disse, acrescentando que a Espanha pode contar com um acordo comercial (as tais tarifas) mais penalizador do que os outros países da União Europeia. “A Espanha é o único país que não vai pagar o valor total. Eles querem ficar em 2%, acho terrível”, afirmou, antes de dizer que dobrará as tarifas planeadas para a Espanha se o governo de Pedro Sánchez recusar alocar 5% do PIB aos gastos militares. “Eles querem usar um chapeuzinho, mas vão ter que nos devolver no comércio, porque não vou deixar isso acontecer”, disse o presidente, que especificou que ele próprio será o responsável por essas negociações comerciais.
A recusa da Espanha em comprometer-se com um aumento de gastos que acredita ser desnecessário levou a que a declaração final de Haia aprimorasse a linguagem para evitar termos como “nós” ou “cada aliado” e, assim, ser assinada por todos. A Espanha obteve, ao mesmo tempo, uma flexibilidade que lhe permitirá dedicar um orçamento menor, como afirma ser suficiente, para cumprir os seus objetivos militares, refere a imprensa espanhola. Sánchez insistiu, após a assinatura do acordo, que a despesa que a Espanha calculou e que gerou polémica (2,1% do PIB) é “suficiente, realista e compatível” com o modelo social espanhol.
Segundo as agências internacionais, o presidente francês, Emmanuel Macron, também demonstrou desconforto com tanto alinhamento face a Washington. Macron levantou a questão das altas tarifas às importações colocadas em cima da mesa por Trump e não se furtou a referir os danos que podem causar ao comércio transatlântico. Deixou mesmo a ideia de que as tarifas podem ser uma barreira ao aumento dos gastos com a defesa.
“Não podemos dizer que vamos gastar mais e depois, no coração da NATO, lançar uma guerra comercial”, disse Macron – seria “uma aberração”. Ele disse ter levantado o assunto diversas vezes com Trump.
Na declaração final de cinco pontos, também ela breve e assinada pelos 32 membros, a NATO diz: “reafirmamos o nosso firme compromisso com a defesa coletiva, conforme está consagrado no Artigo 5 do Tratado de Washington — que um ataque a um é um ataque a todos.” Questionado sobre o referido Artigo e os seus comentários ambíguos, Trump disse: “Eu apoio. É por isso que estou aqui. Se eu não o apoiasse, não estaria aqui”.
O secretário-geral da NATO, Mark Rutte – que organizou a cimeira na sua cidade natal, Haia, e não em Bruxelas, como é tradição e onde se encontra a sede da organização desde que De Gaulle a expulsou de Paris – disse que a organização emergirá como uma aliança “mais forte, mais justa e mais letal”. Considerado um ‘homem de mão’ de Trump, o neerlandês disse que o presidente norte-americano merecia “todos os elogios” por conseguir que os Estados-membros concordassem em aumentar os gastos com a defesa.
A acreditar nas agências internacionais, Rutte não terá, em nenhuma circunstância, feito referência ao grande ausente da cimeira, o presidente Volodymyr Zelensky. Em 2023, o presidente da Ucrânia deslocou-se pessoalmente à cimeira da NATO em Vilnius, tal como fez no ano seguinte em Washington. Mas o mal-estar sobre o assunto é uma evidência para todos.
As metas dos gastos
A nova meta de gastos — a ser alcançada nos próximos 10 anos — representa um salto de centenas de milhões de dólares por ano em relação à meta atual dos 2% do PIB, que alguns Estados-membros ainda não cumprem – Portugal, por exemplo, é um dos seis países dos 32 que menos gasta em defesa. Os países comprometeram-se a gastar 3,5% do PIB em defesa básica – como tropas e armamento – e 1,5% em medidas mais amplas relacionadas com a defesa, como segurança cibernética, proteção de oleodutos e adaptação de estradas e pontes para receber veículos militares pesados.
Para atingir o limite de 5%, os países da União Europeia, cuja dívida conjunta está próxima dos 80% do PIB, terão de triplicar os 325 milhões de euros gastos em defesa no ano passado, para mais de 900 mil milhões. É certo que terão dez anos para o fazer, mas também não deixa de ser verdade que é um objetivo para manter ‘ad aeternum’ – ou pelo menos enquanto a NATO existir.
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