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BRICS: Lula tenta consolidar grupo alternativo ao Ocidente e ao G7

O Presidente brasileiro abriu a 17ª Cimeira dos BRICS criticando o compromisso dos países da NATO em aumentar as despesas com a defesa. E lamentou que o multilateralismo seja uma das vítimas da atual situação internacional.
Brazil’s President Luiz Inacio Lula da Silva gestures to media during the Mercosur summit in Asuncion, Paraguay July 8, 2024. REUTERS/Cesar Olmedo
7 Julho 2025, 07h00

“A recente decisão da NATO alimenta a corrida armamentista”, disse o chefe de Estado brasileiro, Inácio Lula da Silva, na abertura da 17ª Cimeira dos BRICS, o bloco dos países emergentes, a que preside ao longo deste ano. “É mais fácil destinar 5% do PIB para gastos militares do que alocar os 0,7% prometidos para Assistência Oficial ao Desenvolvimento”, criticou Lula da Silva, acrescentando que tal decisão por parte dos membros da NATO demonstra “que os recursos para implementar a Agenda 2030 existem, mas não estão disponíveis por falta de prioridade política”. “É sempre mais fácil investir na guerra do que na paz”, afirmou no início da sessão plenária, cujo lema era ‘Paz e Segurança, Reforma da Governação Global’.

Lula da Silva recebeu este domingo e serve de cicerone até ao final desta segunda-feira os líderes da Etiópia, Abiy Ahmed; da Índia, Narendra Modi, e da Indonésia, Prabowo Subianto, entre outros – os presidentes russo, Vladimir Putin, e chinês, Xi Jinping, não estarão pessoalmente no país da América Latina. Estão também presentes o presidente de Angola e da União Africana, João Lourenço, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres (como tem sucedido nas cimeiras anteriores), e representantes de cerca de 30 países e uma dezena de organizações internacionais.

Uma segunda sessão plenária ocorreu durante o primeiro dia, com foco no ‘Fortalecimento do Multilateralismo, Assuntos Económico-Financeiros e Inteligência Artificial’, onde foram discutidos temas como a revisão das participações no Banco Mundial, o realinhamento de quotas do FMI e o aumento da representação dos países em vias de desenvolvimento em posições de liderança nas instituições financeiras internacionais. E ainda a importância de uma reforma no Conselho de Segurança da ONU. Já esta segunda-feira, a reunião plenária terá por tema ‘Meio Ambiente, COP30 e Saúde Global’.

Na abertura da cimeira Lula da Silva criticou a elevação de gastos militares no planeta, numa menção direta à recente decisão da NATO, a principal aliança militar do Ocidente, de estabelecer um patamar de 5% do PIB para despesas com defesa, e fez um louvor ao multilateralismo no cenário internacional – em relação ao qual os BRICS tentam encontrar uma posição comum. Segundo a imprensa brasileira, no seu discurso no Museu de Arte Moderna, Lula disse que o mundo se depara “com um número inédito de conflitos desde a Segunda Guerra Mundial” e criticou a resposta de boa parte dos países a este cenário.

Lula criticou “as violações à integridade territorial do Irão”, referindo-se aos ataques norte-americanos contra instalações nucleares iranianas, no mês passado, e disse que “a instrumentalização dos trabalhos da Agência Internacional de Energia Atómica coloca em jogo a reputação de um órgão fundamental para a paz”, citado pelo jornal ‘O Globo’.

Ao falar sobre o conflito em Gaza, o presidente reiterou a condenação do governo brasileiro aos ataques do Hamas, em outubro de 2023, contra Israel, mas disse que “não podemos permanecer indiferentes ao genocídio praticado por Israel em Gaza, à matança indiscriminada de civis inocentes e ao uso da fome como arma de guerra”. A solução do conflito só será possível com o fim da ocupação israelita e com o estabelecimento de um Estado palestiniano soberano, dentro das fronteiras de 1967, afirmou.

Segundo a mesma fonte, o presidente ainda fez um apelo ao aprofundamento do diálogo para uma solução pacífica da guerra na Ucrânia, e destacou a participação do Brasil no Grupo de Amigos para a Paz, criado em parceria com a China, mas que não encontra muito apoio entre os países ocidentais e desde logo na própria Ucrânia.

Sobre o bloco a que rotativamente preside, Lula da Silva disse que “representatividade e diversidade o torna uma força capaz de promover a paz e de prevenir e mediar conflitos”. E para aumentar essa capacidade, o presidente afirmou, sobre o Conselho de Segurança da ONU, ser necessário “torná-lo mais legítimo, representativo, eficaz e democrático” com a sua expansão, que o Brasil espera há muito ser uma oportunidade para o seu ingresso. “É mais que uma questão de justiça. É garantir a própria sobrevivência da ONU. Adiar esse processo torna o mundo mais instável e perigoso. Cada dia que passamos com uma estrutura internacional arcaica e excludente é um dia perdido para solucionar as graves crises que assolam a humanidade”, disse. Recorde-se que a Índia, que também faz parte dos BRICS, é outro dos candidatos a entrar no perímetro do Conselho de Segurança – o mesmo valendo para a China (outro BRICS), a segunda maior economia do mundo. A África do Sul, que também faz parte do bloco, não concorda: os sul-africanos citam o chamado Consenso de Ezulwini, de 2005, que estabeleceu que o continente deve ter ao menos dois lugares permanentes e cinco não-permanentes no Conselho, definidos no âmbito da União Africana.

Como se esperava, Vladimir Putin, presidente russo, participa por videoconferência. Na sua intervenção disse que o modelo de globalização liberal “tornou-se obsoleto”. “A mudança na ordem económica mundial continua a ganhar força. Estamos todos a testemunhar que o modelo de globalização liberal tornou-se obsoleto”, afirmou. Os BRICS superam muitas outras associações, incluindo o G7, em termos económicos, disse ainda Putin. “Os países BRICS não apenas representam um terço do território terrestre e quase metade de sua população, como também respondem por 40% da economia global, com o seu PIB agregado em termos de paridade de poder de compra atingindo 77 triliões de dólares, de acordo com dados do FMI para 2025. A propósito, os BRICS superam consideravelmente algumas outras associações, incluindo o G7, com seus 57 triliões de dólares, no que diz respeito a esse índice”. “O principal é que as nações BRICS continuem a desenvolver a cooperação em áreas-chave de política e segurança, economia e finanças, intercâmbios culturais e humanitários”, afirmou o líder russo, acrescentando que, composta por países da Eurásia, África, Médio Oriente e América Latina, tem “um potencial político, económico, científico, técnico e humano realmente enorme”.

O ex-primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, e o ministro russo dos Negócios Estrangeiros, Serguei Lavrov, representam os dois países fundadores do grupo. O grupo BRICS foi inicialmente formado pelo Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul e, desde o ano passado, conta com seis novos membros efetivos: Egipto, Irão, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Arábia Saudita e Indonésia. A estes juntam-se, como membros associados, a Bielorrússia, a Bolívia, o Cazaquistão, Cuba, a Malásia, a Nigéria, a Tailândia, o Uganda, o Uzbequistão e o Vietname. A Argentina, já sob pressão do atual presidente, Javier Milei, desistiu de se aproximas do bloco.

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