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“Instrumentalizar crianças”: Professores condenam discurso racista e xenófobo no Parlamento

Professores receiam que episódios como o que ocorreu na última sexta-feira no Parlamento, com André Ventura a proferir nomes de crianças para concluir que não são portuguesas, “poderão vir a constituir fatores potenciadores de atos de violência ou de bullying de índole racial nas nossas escolas”.
O deputado do Chega, André Ventura, no final da eleição para o presidente da Assembleia da República, que sucederá a Augusto Santos Silva, que falhou a eleição pelo círculo Fora da Europa nas últimas legislativas, na Assembleia da República em Lisboa, 26 de março de 2024. TIAGO PETINGA/LUSA
8 Julho 2025, 10h31

O Sindicato de Professores da Grande Lisboa (SPGL) manifestou a sua “profunda consternação” perante o episódio em que André Ventura, líder do Chega, proferiu nomes de crianças de uma suposta turma de uma escola da capital, com “o claro propósito de alimentar uma retórica populista, demagógica e, sobretudo, o de encorajar sentimentos xenófobos e racistas”. 

Em comunicado enviado às redações, o sindicato sublinha que “instrumentalizar crianças” que frequentam as escolas para “construir uma narrativa que opõe os ‘nossos’ aos ‘outros’ representa não só uma violação ética inaceitável, uma inqualificável irresponsabilidade política, mas sobretudo um inenarrável atentado à dignidade humana”. Com consequências no próprio ambiente escolar, receia o sindicato. Episódios como o que aconteceu no Parlamento na última sexta-feira, assim como outros, “poderão vir a constituir fatores potenciadores de atos de violência ou de bullying de índole racial nas nossas escolas”, alerta o o SPGL.

Este sindicato manifesta preocupação com a “banalização” deste tipo de discurso, “especialmente vindo de representantes eleitos” e avisa que as consequências para a democracia serão “trágicas”. “Se o cenário passar para o ambiente escolar, os efeitos serão devastadores. A escola é, e terá que continuar a ser, um espaço seguro, democrático e plural, onde a liberdade, o respeito pelo outro e a inclusão são prática diária.  Nenhum combate político justifica expor, atacar ou humilhar crianças”, frisa o sindicato que representa milhares de professores e educadores “comprometidos com a justiça social e a solidariedade”.

O SPGL denuncia o episódio que ocorreu no plenário da última sexta-feira, aquando da discussão da Lei da Nacionalidade, mas não deixa de assinalar também  “a forma torpe e degradante como têm decorrido algumas das sessões no Parlamento – onde a violência verbal e a falta de ética parlamentar se banaliza perigosamente”. E mais uma vez avisa: “O que ali se diz e como se diz ecoa na sociedade e desagua, inevitavelmente, nas escolas. O Parlamento deve ser exemplo de todas as virtudes que defendemos e cultivamos nas escolas, não o seu oposto.”

O sindicato termina salientando que “proteger as crianças é proteger a democracia” e que a “proteção de todos, em especial dos mais frágeis, é o que dignifica uma sociedade”. “É esta dignidade que reclamamos. Uma dignidade que não se compadece com o tom da pele, a religião, a forma de vestir, nem tão pouco com a origem etimológica de um nome”, reforça, garantindo estar sempre na linha da frente na “defesa da Escola, tal como consagrada na Constituição da República Portuguesa, dos seus profissionais e de todas as crianças e jovens que nela aprendem e crescem”. “Não há educação sem respeito. Não há democracia sem dignidade”, pode ler-se.

A cena protagonizada por André Ventura no Parlamento levou a que todas as bancadas à esquerda manifestassem indignação. A reação mais enfática foi a da líder parlamentar do Livre, Isabel Mendes Lopes, que acabou por se emocionar.  “Quando são ditos nomes de crianças no Parlamento”, cada uma que ouça tal referência “vai pensar que o Parlamento está a falar dela” e que os colegas que conhecem a criança referida vão identificar o nome. “Este Parlamento tem de ter humanismo, principalmente com as crianças e parece-me obrigação da mesa não deixar que sejam ditos nomes de crianças neste Parlamento”, disse a deputada, num momento de clara tensão.

Pedro Delgado Alves, do PS, pediu ao Parlamento que fizesse uma reflexão sobre o que fez André Ventura e sobre o “monstro que se acorda e a caixa de pandora que abre quando crianças são instrumentalizadas na sala das sessões do Parlamento para um debate que instiga o ódio”.

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