A tarifa social de internet, que será uma realidade só depois de junho, e o novo Código Europeu das Comunicações Eletrónicas (CECE), cuja transposição deveria ter ocorrido no final de 2020 e, agora, Bruxelas quer que ocorra dentro de dois meses para substituir a atual lei nacional para as telecomunicações, são dois dossiês diferentes. Mas o desenho da tarifa que colocará a internet a preços mais baixos para as famílias mais carenciadas, está a ser traçado pelo Governo à medida da diretiva europeia, confirmou o Jornal Económico (JE) junto da tutela.
A tarifa social de internet está a ser preparada pelo Ministério das Infraestruturas e da Habitação, que tutela as comunicações, em colaboração com o Ministério da Economia, que tem a pasta da transição digital. A tarifa social foi prometida para o final de 2020, mas está atrasada porque faltará definir o modelo que vai financiá-la. Ora, segundo a estratégia nacional para o 5G, aprovada pelo Governo em fevereiro de 2020, no âmbito da transição digital, as verbas que o leilão do 5G captar serão canalizadas para um fundo que financiará políticas que promovam, por exemplo, a inclusão e a literacia digital, como a tarifa social de internet. A isto acresce o CECE, que prevê a criação de um serviço universal de banda larga, que também pretende tornar mais acessível o acesso à internet.
O JE enviou um conjunto de questões à tutela das comunicações a fim de perceber que tipo de interdependência há entre o leilão do 5G, o CECE e a tarifa social de internet. A conclusão destes três dossiês está atrasada, e o atraso da tarifa social poderá estar relacionado também com o atraso da transposição do CECE e com o atraso da conclusão do leilão do 5G. Em resposta, fonte oficial do ministério liderado por Pedro Nuno Santos disse que se tratam de “assuntos diferentes”, embora a “tarifa social de internet esteja efetivamente a ser desenhada de forma conforme ao CECE”.
Ou seja, o Governo não diz se a tarifa social de internet poderá ser financiada com verbas do 5G – a estratégia para essa receita ainda não é conhecida -, mas confirma que a aplicação da referida tarifa vai ser enquadrada no Código Europeu das Comunicações Eletrónicas. Isto significa que, embora a tarifa social e o CECE avancem de forma autónoma, o novo código para as telecoms, assim que a transposição para a lei nacional estiver concluída, vai integrar a tarifa social de internet num quadro legislativo para as telecomunicações mais completo.
De que forma a tarifa social vai corresponder aos objetivos do CECE? A diretiva europeia prevê a criação criação de um serviço universal de banda larga que, essencialmente, incumbirá um operador de telecomunicações a satisfazer todos os pedidos razoáveis de acesso à internet em qualquer parte do país, em condições a acordar com o Estado. Ora, é isto que está previsto no anteprojeto da transposição da diretiva entregue pela Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom) ao Governo, no último ano.
A proposta de transposição da Anacom prevê que o serviço universal de banda larga seja prestado por um operador, escolhido por concurso, assegurando o acesso de um “conjunto mínimo de serviços” a um preço mais acessível, como o acesso ao e-mail ou a consulta de sites de noticiosos. Em alternativa, o regulador sugeriu ainda a criação de vales de desconto para a internet.
Desta forma, a tarifa social de internet e o CECE vão atuar como mecanismos de reforço de acessibilidade a infraestruturas e a tarifários mais em conta no sector das telecomunicações.
Contudo, ainda falta para que estas medidas sejam uma realidade. No caso do CECE, a diretiva europeia para as telecomunicações deveria ter sido transposta para a legislação nacional até 21 de dezembro de 2020, mas isso não aconteceu. Agora, a Comissão Europeia instaurou um processo de infração das regras europeias a Portugal, dando dois meses para o Governo fazer a transposição.
O CECE foi criado em 2018 e a sua transposição era um objetivo do Governo, desde o final de 2019, quando decidiu anular a revisão da atual legislação. O Executivo decidiu que a transposição do CECE iria definir a nova lei para as telecomunicações. A tutela criou um grupo de trabalho no início de 2020, que incluía a Anacom, a Apritel, a Deco e a Secretaria de Estado de Comércio e Serviços e Defesa do Consumidor. Mas os trabalhos terminaram no final do verão de 2020. O Governo decidiu transpor a diretiva dispensando contributos fora do previsto no CECE. Mas a proposta da Anacom inclui contributos de uma auscultação pública prévia, realizada entre novembro de 2019 e janeiro de 2020.
A tarifa social de internet, por sua vez, está inscrita no programa de Governo, e no plano de ação para a Transição Digital, aprovado em abril de 2020. A tarifa foi apresentada ao Parlamento no verão passado, com a promessa de entrar em vigor no final de 2020 ou em meados de 2021. Em setembro, os deputados aprovaram mesmo uma recomendação para que o Governo criasse a tarifa – resolução que só saiu em Diário da República a 25 de janeiro 2021. Ou seja, a medida prometida está atrasada.
Agora, numa altura em que as empresas optam pelo teletrabalho e as escolas promovem aulas online, sabe-se que a tarifa social de internet só deverá ser uma realidade em junho, entrando em vigor apenas no segundo semestre deste ano.
Qual será a disponibilidade dos operadores em colaborar com o Governo nos dois dossiês? Tal como o JE noticiou a 5 de fevereiro, os operadores de telecomunicações apoiam medidas que fomentem o acesso às comunicações – como a tarifa social de internet – independentemente da condição económica, desde que sejam financiadas com “fundos públicos”.
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