Havia muito mais do que a distância a separar os desfiles de Tommy Hilfiger, na semana de moda de Nova Iorque, e o da Burberry, em Londres. As duas marcas não tinham a mesma linguagem visual – a Tommy tinha Gigi Hadid ao leme de uma coleção “marinheiro” e a Burberry apostava num look vitoriano, mais ornamentado e ricamente trabalhado – nem competiam sequer na mesma gama de preços. Mas há algo muito mais importante a uni-las do que aquilo que as separa. Um novo paradigma, que pode bem vir a tornar-se na maior revolução que a indústria da moda conheceu em décadas. Deram-lhe o nome de See-Now Buy-Now e, basicamente, significa que as peças apresentadas durante os desfiles estão imediatamente disponíveis para venda, online e nas lojas em todo o mundo. E isso inclui as lojas que ambas as marcas possuem em Lisboa: a da Tommy, no CC Colombo, e da Burberry, na Avenida da Liberdade.
Normalmente, os desfiles de moda revelam as propostas das marcas para a estação seguinte, e chegam às lojas com uma ‘décalage’ de seis meses. Toda a indústria está montada neste pressuposto que a Tommy Hilfiger e a Burberry estão agora a inverter – e não estão sozinhas: Ralph Lauren e Tom Ford fizeram exatamente o mesmo.
Nos últimos anos, os desfiles tornaram-se num ‘show’ mediático, profusamente difundidos nas redes socias e na imprensa, incluindo televisão, só que as peças não estavam no mercado e, por isso, levantava-se a questão: Como converter essa atenção em vendas?
Na manhã do seu desfile (uma festa que converteu um cais em Nova Iorque num parque de diversões), Tommy Hilfiger enviava um e-mail aos jornalistas acreditados na empresa para explicar “pessoalmente” os princípios desta nova filosofia. Lia-se que “esta é a melhor expressão da filosofia da marca. O desfile que sempre quis fazer”. E continuava: “A abordagem norteou-se por três princípios: a democratização da moda, a gratificação instantânea, as experiências divertidas e entusiasmantes. Tanto online como offline”.
Christopher Bailey, o diretor criativo da Burberry (cargo que acumulava até há poucos dias com o de CEO), emitia um comunicado imediatamente após o desfile onde dizia basicamente o mesmo: “O ‘show’ desta noite marcou um momento muito especial para nós. Foi o culminar de uma série de alterações importantes que realizámos, no sentido de estar mais perto dos nossos consumidores”.
Para nós, consumidores, são boas notícias. As marcas apresentam e colocam nas lojas a coleção que estamos a comprar, em lugar de mostrar uma coisa (verão, em setembro) e venderem outra (inverno). Só que essa decisão aparentemente simples não tem nada de simples. Mexe com todos os elos – e são muitos – de uma cadeia global que necessita de estar bem oleada para funcionar.
É certo que marcas como a Zara conseguem ter, nas suas lojas, coleções inspiradas nas principais tendências em tempo recorde, mas estas marcas têm uma dimensão invulgar. Além de que muitas das peças apresentadas durante as semanas de moda têm um custo elevado, em matéria-prima e mão de obra. Nenhuma marca quer correr o risco de colocar uma artesã a bordar uma única peça por dezenas de horas que não se vende.
Esses seis meses também servem para isso, para ouvir compradores internacionais, imprensa especializada e o público em geral. Isso deixa de ser possível. A produção tem de estar pronta no momento em que a coleção é revelada. Como se afinam as quantidades produzidas e para que mercados vender?
As redes sociais permitem hoje um contacto direto com o consumidor final mas será suficiente? E será que não se corre ainda o risco de os ‘designers’ apostarem no seguro, no que é mais facilmente vendável, e a moda perder o ‘glamour’ que lhe deu a atenção mediática?
Alguns críticos dizem que sim, mas, a julgar pelas palavras de Christopher Bailey e Tommy Hilfiger – e ambos devem ser atentamente escutados -, o futuro é radiante.
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