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União Europeia não pode continuar “em velocidade lenta”, frisa José Crespo de Carvalho

Os 27 não podem continuar a reagir aos contextos de crise, mas, quando possível, a antecipá-los, ou ao menos a responder-lhes com eficácia desde a primeira hora. Reindustrialização e pandemia são os dois mais recentes exemplos de falta de velocidades.
25 Fevereiro 2021, 16h06

Os oradores do Observatório ‘A Recuperação Económica depois da Covid-19’, organizado pelo Crédito Agrícola em parceria com o Jornal Económico e realizado nesta quinta-feira, 25 de fevereiro, foram unânimes em considerar – no painel dedicado ao tema ‘O papel da Europa e os desafios para o futuro no contexto global’, que a União Europeia deu, nesta fase de pandemia em curso, mais uma prova da sua endémica lentidão. Tanto em termos de capacidade de decisão, como de transporte para o terreno das decisões tardiamente tomadas – tudo isto envolvido numa dramática insistência na incapacidade de tomar decisões proativas, mas meramente reativas.

É este quadro que leva José Crespo de Carvalho, Presidente da Comissão executiva do ISCTE, a afirmar que “não sei se o plano [europeu de resiliência e recuperação] ié ou não bom, sei que a Europa tem sido muito lenta na tomada de decisões, tem sido pouco proativa”. E teria que ser precisamente o contrário, quando é certo que os 27 “perderam uma série de cadeias de abastecimento por ter hipotecado uma boa parte da sua industria – com a exceção de alguns paíes, nomeadamente a Alemanha e alguns Estados nórdicos” – de onde resulta que “a Europa perdeu força em relação ao mundo e em particular à Ásia”

Para o professor universitário, “esta velocidade lenta que agora se notou de forma muito cáustica na maneira como negociámos a vacinação, como chegámos às farmacêuticas, é pouco perspetivadora em relação àquilo que se avizinhava”. Com a pandemia (e a vacinação) como pano de fundo, Crespo de Carvalho parece estar pouco otimista em relação àquilo que será a saída da crise europeia: “Para sairmos a bom ritmo para a recuperação económica, não sei se em V se em W se em U, não interessa, temos o problema da vacinação”.

“Vemos países que conseguiram fazer um caminho relativamente rápido”, o que faz regressar aos 27 um problema de competitividade que tende a agravar-se face a outros fatores, explicou: “A europa vai a um ritmo lento e isso é muito perigoso, é muito perigoso estarmos permanentemente em reação, é muito perigoso estarmos a ajudar com capitais quase irrisórios, quando comparados com os Estados Unidos” – referindo-se aos 1,9 biliões de dólares qua a administração Bidens se prepara para ‘despejar’ sobre a economia caseira, em comparação com os 750 mil milhões da ‘bazuca’ europeia.

“É muito difícil olhar para a Europa e perspetivas um futuro risonho quando as instituições europeias parecem mais preocupadas em preservar-se que em preservar a Europa”, concluiu.

Para António Saraiva, presidente da CIP, sobrevive, em termos de competitividade da Europa, o sempre presente problema “da excessiva regulamentação. Temos crescido em dimensão, mas temos perdido capacidade política, capacidade de intervenção à mesa da globalização”.

“Os 27 têm processos de decisão lentos e complexos; veja-se o que aconteceu com o Nexrt Generation”, enfatizou – para explicar que “agilizar o processo decisório é fundamental. As empresas não podem deixar de estar inseridas neste processo” perverso europeu e por isso terão de batalhar contra ele.

“Nunca caminhámos no sentido de uma federação. Há necessidade de harmonização do modelo de desenvolvimento”, recordou o líder dos patrões. Nesse papel, António Saraiva não se esqueceu de referir a reindustrialização: “Já passou um ano desde que essa estratégia” foi isolada, e “o que é que de então para cá foi feito?”. Nada: “A União Europeia, ‘ensandwichada’ entre os blocos norte-americano e asiático, ou altera aquilo que é alterável ou perde o jogo da competitividade das nações”.

Licínio Pina, Presidente do Conselho de Administração Executivo do Crédito Agrícola, também referiu a questão do excesso de regulação: “Há um autêntico tsunami regulatório sobre a banca que a obriga a um investimento enorme para cumprir as exigências da autoridade bancária europeia, sem atender ao princípio da proporcionalidade”.

O líder da instituição financeira recordou que “Europa enferma de um problema: não é uma união de países, é um conjunto de países que têm a sua política energética, fiscal, social, que resultam em produtividades muito diferenciadas”.

Os bancos portugueses têm sofrido com isso, apesar de nem todos da mesma forma: “Há na Alemanha bancos regionais muito fortes. O Crédito Agrícola tem contribuído fortemente para a redução das assimetrias das economias locais e regionais. Os bancos com estas caraterísticas têm uma resiliência muito forte porque estão muito perto das pessoas, não são bancos tão expostos a uma economia mais universal”.

Menos cáustica, Francisca Guedes de Oliveira, professora na Faculdade de Economia e Gestão da Universidade Católica Portuguesa, ‘atirou’ alguma esperança sobre observatório, recordando que o novo posicionamento da administração democrata à frente da Casa Branca abre um novo ciclo de oportunidades para a Europa. “Com os Estados Unidos temos agora uma janela aberta, que facilita acordos com a Europa. A estes Estados Unidos interessa uma Europa forte”.

A docente debruçou-se ainda sobre uma matéria do maior interesse: “O Reino Unido tinha uma bengala [na administração Trump] que lhe permitiria ter uma postura mais impositiva e de menos negociação para com a Europa; com a nova administração abre-se a possibilidade de o Reino Unido ser mais aberto para com a Europa”.

Mas Francisca Guedes de Oliveira não deixou de levantar uma ‘linha vermelha’: A relação da Europa com a China não pode ser independente da relação com os Estados Unidos, tem de ser claro na Europa que tem que ter uma relação com a China sempre tendo presente a relação com os Estados Unidos”.

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