No final do ano de 2011 as Autoridades francesas de saúde pedirem às 30 mil portadoras de implantes mamários da marca PIP que os retirassem como medida de precaução. Tinham acontecido ruturas e a 20 das mulheres afetadas em França foi diagnosticado cancro da mama. Em Portugal registam-se 80 casos de ruturas de implantes mamários da PIP, segundo o Infarmed citado pela Lusa e pelo Público.
A nível mundial existe o registo de 300 mil mulheres que usaram aquele tipo de implante feito com um gel de silicone não homologado. O escândalo foi de tal ordem que em 2012 foram propostos dois Regulamentos relativos aos dispositivos médicos (DM) e aos dispositivos médicos para diagnóstico in vitro. A aprovação destas propostas aconteceu recentemente em Abril deste ano e, explica o Infarmed que a apesar destes Regulamentos terem entrado em vigor a 26 de maio último, foram estabelecidos períodos transitórios para a sua aplicação. A saber: três anos para o Regulamento dos DM, ou seja, 26 de maio de 2020, e cinco anos para o Regulamento de DM para diagnósticos in vitro, ou seja, 26 de maio de 2022. Explica ainda o Infarmed que alguns dos Regulamentos que afetam essencialmente os Estados-membros e a Comissão Europeia, são aplicados antecipadamente, sendo que “os requisitos dos Regulamentos são aplicáveis a todos os dispositivos que sejam colocados no mercado, após a data da sua aplicação”. É ainda necessário, segundo a mesma fonte, a publicação de legislação acessória e de outras “orientações metodológicas que ajudem na aplicação harmonizada de certas regras”.
O que está aqui em causa é adaptar os recursos e alinhar os participantes no chamado ecossistema legislativo.
Os novos regulamentos dos DM vieram conferir segurança e eficácia aos produtos, melhorando a fiscalização do mercado e a rastreabilidade, sublinha o portal Tecnohospital. Diz esta fonte que as regras irão permitir “uma maior transparência e segurança jurídica para os produtores, fabricantes e importadores, além de contribuir para reforçar a competitividade internacional e a inovação” no setor.
O Infarmed salienta a este propósito que o sistema é modernizado através da “maior intervenção das autoridades competentes no ciclo de vida do DM e supervisão dos organismos notificados, a garantia de maior transparência, a consistência e harmonização na implementação da lei, controlo mais rigoroso, introdução do cartão de implante, reforço das regras de investigação clínica, e a inclusão de dispositivos com finalidade estética”. É o caso de lentes e contacto coloridas sem função corretiva.
E, não menos relevante será o desenvolvimento da EUDAMED, uma base de dados europeia e que será disponibilizada ao público. Diz a Tecnohospital que os doentes receberão um cartão de implante com todas as informações essenciais e será obrigatório um único identificador de dispositivo para cada produto. E é este produto e esta informação que estarão na referida base de dados.
As novas regras vão permitir o reforço dos controlos sobre os ensaios clínicos e ainda sobre os organismos que irão aprovar a comercialização dos DM. A nível de fiscalização o que se irá notar será um maior volume de dados que serão recolhidos pelos fabricantes para avaliação da performance do DM. Refere o Infarmed que um dos grandes objetivos resulta da “necessidade de melhorar a informação relativa ao desempenho clínico, sobretudo dos dispositivos de maior risco. Os Estados-membros vão poder trocar informação e atuar de forma concertada. Lembra ainda o Infarmed que em 2015 com a criação do SINATS – Sistema Nacional de Avaliação de Tecnologias de Saúde existia o objetivo de melhorar o conhecimento, a eficácia e a efetividade dos referidos DM e “cuja avaliação comporta desafios metodológicos complexos, mas que são atualmente analisados num percurso avaliativo estruturado e adaptado à natureza específica de cada dispositivo”.
A avaliação das tecnologias de saúde procura responder às incertezas geradas pela utilização dos novos DM, nomeadamente em matéria de resultados clínicos expectáveis e valor proposto, em face da tecnologia precedente”. O objetivo final é levar o DM a ser incorporado nas melhores condições no sistema de saúde e, para que tal aconteça é necessário maior “robustez de avaliação técnico-científica prévia à colocação no mercado de DM”.
Relembramos recentes declarações de João Gonçalves, o secretário-geral da APORMED, que num artigo no DN afirmava que a indústria dos DM “é das mais inovadoras do mundo, disponibilizando rapidamente os mais recentes avanços tecnológicos”. Adiantava que esta inovação “associada a uma melhor acessibilidade, serão seguramente os fatores críticos de sucesso do tratamento eficaz da doença crónica e da redução da morbilidade associada ao envelhecimento”. Diz ainda aquele gestor que a nível de longevidade, os DM desempenham um papel fundamental, pois “permitem retardar os aspetos negativos de um processo inevitável, o envelhecimento e, por outro, contribuem para uma melhoria significativa da qualidade vida”. E dá o exemplo da visão e da audição, com possibilidade de recuperação através de DM inovadores, caso das lentes intraoculares e dos implantes cocleares, respetivamente. A nível da mobilidade, os casos mais visíveis são as próteses ortopédicas, os stents coronários, os desfibrilhadores implantáves, as válvulas aórticas percutâneas, entre outros.
Novas regras
Mas, de volta ao tema da aprovação pelo Parlamento Europeu das regras propostas pela Comissão Europeia relativamente ao DM, como os impantes mamários, os pacemakers ou as próteses da anca, é relevante frisar que se está perante uma tentativa de fortalecimento dos supervisores dos organismos de certificação da União Europeia.
Para além das visitas-surpresa às unidades dos produtores, será maior o controlo sobre os organismos notificados, ou seja, sobre os responsáveis pela avaliação da conformidade dos DM. E, no caso de DM de alto risco, em que se incluem todos os dispositivos implantáveis, a avaliação da conformidade deverá ser feita pelos referi- dos organismos notificados e também por juntas de especialistas. Esta regulamentação mais rigorosa visa também encorajar a inovação.
Nesta ótica, é interessante uma abordagem por investigadores da faculdade de Engenharia da Universidade do porto, ainda do Institute for Technology Assessment and Department of Radiology do Massachusetts, nos EUA, e ainda pelo Instituto de Polímeros e Compósitos da Universidade do Minho. O tema era desenvolvimento de produto relacionado com os DM e a chamada “metodologia dedicada”. Referem os autores Isa Santos, Scott Gazelle, Luís Rocha, e João Tavares que em termos de complexidade o setor dos DM “é semelhante ao da indústria aeronáutica ou nuclear”. No seu trabalho, os investigadores sublinham que “a incerteza associada ao desenvolvimento de novos produtos e/ou serviços é elevado, justificando a aplicação de metodologias dedicadas eficientes”. A equipa acrescenta que este tipo de método “é essencial para ultrapassar as dificuldades impostas pela complexidade da indústria e até ganhar competitividade”.
A inovação é relevante assim como o capital intensivo. Para além dos ensaios clínicos e não clínicos para demonstrar qualidade e eficácia, é ainda necessário apresentar “análises de custo-benefício” já que só desta forma é possível criar expetativas em relação à qualidade e eficácia do tratamento”. E é baseados nestas análises que os sistemas nacionais de saúde e as seguradoras decidem sobre quais irão comparticipar. Dentro das regras recentemente aprovadas, a vigilância pós-mercado tornou-se nuclear. Os fabricantes fazem a vigilância pós-mercado e o registo de não conformidades, sendo que a primeira permite revelar efeitos adversos e que não foram detetados previamente nos ensaios clínicos, permitindo, em última análise, medir o risco do DM. Os fabricantes são ainda obrigados a manter um registo dos DM vendidos. O objetivo é poder emitir eventuais alertas por contraindicações ou por dispositivos não seguros.
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