Já se sabe quantas startupsde base tecnológica mostraram interesse ou se instalaram em Portugal desde a primeira edição da Web Summit?
Não temos a contabilidade nem penso que seja possível fazê-la de forma rigorosa, dizendo que foi atribuível apenas ao evento. Mas sabemos que em 2016 foram criadas na rede nacional de incubadoras 584 startups. Nos ultimo 12 meses, desde a primeira Web Summit, houve um acréscimo de 20%. Estamos a falar da criação de mais de sete centenas de startups nos últimos 12 meses. Conheço vários casos – quer de startups quer de empresas de maior dimensão – que estão a instalar-se em Portugal ou já se instalaram desde a Web Summit. Isso é inequívoco.
Qual é o perfil desses investidores?
Há vários tipos. Temos, por exemplo, o Digital Hub da Mercedes. Foi uma decisão tomada depois da web Summit. Aí estamos a falar de um centro de excelência de uma grande empresa a nível internacional. Temos depois uma outra tipologia de investidores, que já são startups ou as chamadas sky labs, já com mais dimensão, que também têm vindo para Portugal, e não apenas para Lisboa. Está a haver várias localizações em que este fenómeno tem ocorrido. Temos também importantes investidores que são líderes de capitais de risco internacionais. Por exemplo, no dia 6 vamos ter o Venture Summit, em que estarão representados naquela sala fundos que representam mais de 100 mil milhões de euros. Esse tipo de investidor, que não sendo uma startup ou grande empresa tecnológica, coloca financiamento nas empresas mais emergentes ou em fase de crescimento, interessam-nos muito, porque reforça o ecossistema. É por isso que temos de apostar na questão da escalabilidade e na internacionalização. Para sermos mais apetecíveis para investimento ou aquisição, precisamos de dimensão. Os fundos internacionais mais qualificados não olham para pequeníssimas operações, olham para operações com alguma dimensão, caso contrário nem sequer estudam. Estamos a tratar da vinda para Portugal de grandes redes internacionais de financiamento. Só esta semana estive a negociar com duas dessas grandes redes, que virão para Portugal. Ainda é prematuro anunciar.
Que iniciativas governamentais estão em curso para dinamizar o ecossistema de startups?
A implementação do programa Semente e do Fundo 200M, que são medidas concretas, de implementação da visão que tínhamos. E também haver o tema da entrada de grandes redes de apoio ao empreendedorismo em fase avançada. E estamos a trabalhar também na criação de novos instrumentos financeiros, que ainda é prematuro anunciar. E mais ainda: eu não acredito que o mundo das startups e das grandes empresas deva estar separado. Estamos a trabalhar em iniciativas para lançar neste campo, de ligação entre as empresas de maior dimensão, quer nacionais quer internacionais, e as startups, para dar robustez ao sistema. A maioria das startups bem sucedidas são business to business, vendem produtos e serviços a outras empresas. São essenciais iniciativas para fomentar a troca de bens e serviços entre as startups, aproveitando o mercado que as grandes empresas constituem, e aproveitando também a importância destes dois tipos de atores na co-criação de tecnologia e na inovação conjunta. Hoje em dia já se tornou um clássico vermos alianças de grandes corporates e startups, que não têm aquela herança administrativa e os fatores de rigidez que têm as grandes empresas. Podem ser mais arrojadas e encetar processos de inovação mais disruptivos.
No capítulo do financiamento, sentem ou não que há falhas do sistema bancário, que não está ainda preparado para analisar estas operações?
O sistema bancário não é o mecanismo de financiamento mais clássico para as startups. Tem um papel muito importante a desempenhar, tem mais tradição na indústria e nas empresas mais estabelecidas. Mas se analisarmos em detalhe, os bancos estão cada vez mais estabelecer equipas orientadas para esta área, também estão a adaptar-se à mudança. No entanto, para a maior parte destas empresas, numa fase mais inicial, há ali de facto uma falha de mercado e o financiamento público é importante. Mas há diferentes segmentos. O mais inicial precisa mais de apoio público e de business angels e de capital de risco – público e privado. Mas as grandes empresas contratam as pequenas e as startups fazem contratos de investigação e para prestações de serviços. As grandes empresas privadas têm de ser cada vez mais parte do ecossistema. Temos de ter uma visão abrangente e holística sobre esta questão.
Neste momento, Portugal compete com que destinos de investimentos tecnológicos?
Depende dos segmentos. Portugal tem condições únicas na Europa Ocidental, é um destino muito apetecível. Estamos naturalmente a desenvolver políticas no âmbito da formação, porque precisamos de desenvolver mais quadros ligados às áreas tecnológicas. Mas felizmente o público e os jovens já estão a perceber o mercado relevante que têm à sua disposição. Nas entradas nas universidades deste ano, as engenharias suplantaram pela primeira vez a medicina, e isso é um sinal muito importante de que o mercado, em todas as suas componentes, está a ajustar-se.
Mas em termos de localizações, quais são os nossos concorrentes neste momento?
Há várias situações, dependendo se são grandes empresas ou startups. Hoje em dia, Portugal é um destino importante. Temos tido investidores que consideram outros países europeus, nomeadamente Norte da Europa, cidades como Barcelona, Londres ou Paris. Estamos a receber muito investimento francês, no âmbito tecnológico. Também inglês, americano, alemão. Se as empresas saem de Londres ou de Munique, é porque temos algo a oferecer. A Vestas, líder mundial de energia eólicas, escolheu o Porto para instalar um centro de design com 400 engenheiros. A empresa estudou 99 cidades e houve uma short list de 10, em que estavam Porto, Lisboa e oito cidades do Leste Europeu. Mas o leste europeu, por várias razões, está a perder terreno. Não quer dizer que não tenha capacidade para atrair investimentos, mas nota-se agora muita orientação para a Europa Ocidental.
Não há o risco de eventos como a Web Summit favorecer demasiado o centralismo de Lisboa?
Eu não diria que favorece, há spill overs em todo o país. Cidades como Braga têm aproveitado imenso, tem uma dinâmica incrível em termos de startups e de atração de investimentos de grandes corporates. É impressionante. O que acho é que no próximo ano talvez possamos fazer um conjunto de eventos mais expressivos para aproveitar esta dinâmica. A Web Summit ocorre em Lisboa, mas beneficia o pais como um todo.
Há quem tema que esta moda de interesse externo, quer no investimento quer no turismo, seja um fenómeno temporário. Teme que isso possa acontecer?
Não, porque se o investimento é baseado na qualidade do talento, não é um investimento só com base em baixos custos e de recursos humanos não qualificados, que entra e sai. Este tipo de investimento, que aposta na qualidade intrínseca dos nossos recursos humanos, em factores mais sustentados de qualidade, não vai sair facilmente. Continuaremos a ser competitivos face às grandes capitais europeias. De facto tem havido uma onda incrível, mas temos de proporcionar espaços de localização – há empresas que pedem 40 mil metros quadrados de escritórios para se instalarem, outras 20 mil. Estamos com uma escala considerável. Os factores de competitividade em que assentam estes investimentos são sólidos. Não estou a ver uma empresa uma empresa líder mundial do seu setor criar um centro tecnológico com 400 engenheiros a ir embora amanhã. Não faz nenhum sentido.
Em termos de infraestruturas, ainda existem falhas onde considere que o país ainda tem de atuar?
Do ponto de vista digital, somos um país muito avançado, essa área está muito bem acautelada. Temos é de trabalhar na formação de recursos humanos em quantidade. E o setor imobiliário – que está já a adaptar-se–- tem de se adaptar no curtíssimo prazo e oferecer escritórios preparados para a receção imediata, porque eles querem investir ontem. Alguns investimentos estão à espera que o escritório fique pronto, mas não vão embora. O setor imobiliário tem de dar aqui um passo muito importante. Não lhe chamaria falhas, mas uma adequação a uma procura que veio de repente. Quanto a transportes, sustenta muito bem o crescimento deste tipo de investimentos.
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