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Justiça portuguesa congela contas de Isabel dos Santos. Só no EuroBic foram bloqueadas mais de 10 contas

A justiça portuguesa mandou congelar dezenas de contas bancárias de Isabel dos Santos e das suas empresas, bem como do seu marido Sindika Dokolo, que estão domiciliadas em bancos portugueses, apurou o Jornal Económico. Congelamento surge depois de comunicação de operações suspeitas ao DCIAP e UIF da PJ e a pedido de cooperação judiciária de Angola.
DR AFP/Getty Images
11 Fevereiro 2020, 16h28

A justiça portuguesa mandou congelar dezenas de contas bancárias de Isabel dos Santos e das suas empresas, bem como do seu marido Sindika Dokolo, que estão domiciliadas em bancos portugueses, revelou ao Jornal Económico fonte próxima ao processo.

O bloqueio judicial foi aplicado a contas que detém no Eurobic, onde a empresária angolana colocou a sua participação à venda na sequência do caso Luanda Leaks e cuja aquisição de 95% do capital pelo Abanca foi confirmada esta semana. Só neste banco foram bloqueadas mais de 10 contas bancárias relacionadas com a empresária angolana, num congelamento que se estende a outros bancos como, por exemplo, o Millennium BCP e o BPI.

Segundo fonte próxima ao processo, os empréstimos de Isabel dos Santos junto destas instituições arriscam-se agora a não ser pagos por não poder movimentar os fundos devido a congelamento de contas. Em causa poderá assim estar o pagamento de créditos ao banco público que emprestou, em 2009, à filha do ex-presidente de Angola José Eduardo dos Santos, através da Kento Holding Limited, 125 milhões de euros para a aquisição de ações da Zon (atual NOS) e que até aqui tem vindo a ser pago sem quaisquer incumprimentos. Recorde-se que a Caixa é também credora da Efacec, onde Isabel dos Santos é a maior acionista, cuja participação de 67,2% do capital foi financiada em grande parte por bancos portugueses: BPI, Caixa, BCP, Novo Banco e Montepio. A empresária anunciou, a 24 de janeiro, que vai vender esta posição após o escândalo do Luanda Leaks.

O bloqueio de contas bancárias abrange a execução de ordens de pagamento de salários, rendas, impostos, fornecedores e honorários de advogados. Ou seja, a operação regular de entidades comerciais ligadas a Isabel dos Santos com contas nos bancos portugueses.

A decisão judicial de congelamento de contas surge após a comunicação do EuroBic de operações suspeitas ao Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) e a Unidade de Informação Financeira (UIF) da PJ. E também na sequência dos “pedidos” de cooperação de Angola relacionados com o Luanda Leaks, cuja investigação internacional revelou mais de 715 mil ficheiros que detalham esquemas financeiros de Isabel dos Santos e do marido, Sindika Dokolo, que estarão na origem da fortuna da família, calculada em mais de dois mil milhões de euros.

O Luanda Leaks deu conta de que Isabel dos Santos terá montado um esquema de ocultação que lhe permitiu desviar mais de 100 milhões de dólares (90 milhões de euros) para uma empresa sediada no Dubai e que tinha como única acionista declarada a portuguesa Paula Oliveira, amiga de Isabel dos Santos e ex-administradora da operadora NOS.

Bens podem ficar 10 anos congelados em Angola

A atuação da justiça portuguesa surge depois de no início deste ano o Tribunal Provincial de Luanda ter decretado o arresto preventivo de contas bancárias pessoais da empresária angolana Isabel dos Santos, do marido, Sindika Dokolo, e do gestor português Mário da Silva, além de nove empresas nas quais detêm participações sociais como a Unitel, Zap, BFA, Contidis.

Este arresto preventivo de contas está relacionado com um processo de condenação para pagamento de mais de 1,1 milhões dólares (mil milhões de euros) ao Estado, por prejuízos provocados nas empresas públicas de petróleo (Sonangol) e de diamantes (Sodiam). Segundo a PGR de Angola , Isabel dos Santos, Sindika Dokolo e Mário Silva celebraram negócios com o Estado angolano através da Sodiam e com a petrolífera estatal.

A imprensa angolana noticiou recentemente que Isabel dos Santos pode ficar com os bens congelados em Angola durante 10 anos, caso a empresária não consiga qualquer acordo nos tribunais de primeira instância e vier a interpor recurso, o que  “pode levar mais cinco ou dez anos” a ser apreciado.

Isabel dos Santos arrisca também a não poder movimentar os fundos resultantes do encaixe da sua participação de 42,5% no EuroBic, após os espanhóis do Abanca ter chegado no início desta semana a acordo para adquirir 95% do EuroBic. Em causa poderão estar cerca de 100 milhões de euros, referentes à venda da sua posição accionista, desencadeada depois das notícias conhecidas como Luanda Leaks e da investigação judicial aberta em Angola à sua gestão na Sonangol. Fontes próximas à empresária alertam, porém, que aquele encaixe poderá vir a ser depositado numa conta bancária nos Estados Unidos ou noutro país onde a empresária não tem contas congeladas. Mas resta saber se não haverá uma intervenção da PGR até à concretização da venda de 95% do EuroBic à Abanca.

O JE questionou a PGR sobre o congelamento das contas de Isabel dos Santos em Portugal, mas não obteve resposta até ao momento.

EuroBic comunicou à PJ operações suspeitas

Tal como o JE avançou em primeira mão, o EuroBic alertou a 20 de janeiro o DCIAP e a UIF da PJ para operações suspeitas referentes a transferências da Sonangol de 57,4 milhões de dólares (52 milhões de euros), realizadas há mais de três anos, para uma conta bancária no Emirates NBD, no Dubai, titulada pela Matter Business Solutions DMCC. Uma consultora que o banco português suspeita agora pertencer a Isabel dos Santos, após as revelações do ‘Luanda Leaks’.

Em causa estão operações, em nome da petrolífera angolana, realizadas, através do banco português, um dia após a empresária angola ter sido exonerada da Sonangol que são agora detalhadas na investigação do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ). O JE sabe que as revelações do ‘Luanda Leaks’ acabaram por ditar a comunicação ao Ministério Público (MP) e à PJ de operações suspeitas.

O alerta foi feito no âmbito da lei 83/2017 que fixa medidas de combate ao branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo e que prevê que estes alertas devem ser realizados sempre que “as entidades obrigadas saibam, suspeitam ou tenha razões para suspeitar que certos fundos provêm de actividades criminosas”. Segundo esta lei, devem ser comunicadas às autoridades operações  suspeitas tentadas, que estejam em curso ou que tenham sido executadas, o que foi o caso das três transferências de 57,4 milhões de dólares, realizadas a 16 de novembro de 2017, um dia após a saída de Isabel dos Santos da Sonangol.  A investigação do ICIJ revela mesmo que, em menos de 24 horas, a conta da empresa angolana no EuroBic Lisboa, banco de que Isabel dos Santos é a principal acionista, foi esvaziada e ficou com saldo negativo no dia seguinte à demissão da empresária da petrolífera.

A comunicação do EuroBic às autoridades é sustentada com o facto de o ‘Luanda Leaks’ só agora levantar suspeitas quanto ao beneficiário efectivo da Matter Business Solutions. Segundo os novos dados, a accionista desta offshore declarada às autoridades do Dubai é Paula Oliveira, próxima e sócia de Isabel dos Santos que deverá, na realidade, ser a dona desta consultora do Dubai – e que tem associados outros nomes portugueses como o de Jorge Brito Pereira, advogado da empresária angolana e do seu principal gestor de negócios, Mário Leite da Silva, como diretor desta empresa offshore. O JE confrontou o EuroBic e a PGR com o envio da comunicação, mas até ao fecho desta edição não obteve resposta.

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