A obrigatoriedade de o presidente dos Estados Unidos da América apresentar, anualmente, um relatório sobre a Estratégia de Segurança Nacional (NSS, na sigla em inglês) é uma consequência da lei de 1986, que reorganizou as forças armadas norte-americanas e que teve como primeiro objetivo garantir a existência de uma operação militar conjunta, ultrapassando deficiências de comunicação, mas, principalmente, limitando os problemas criados pela rivalidade entre os diferentes ramos. Permitiu também ao Congresso ter mecanismos de acompanhamento e mitigar a perceção de falibilidade do poder militar norte-americano, depois da guerra do Vietname, da intervenção fracassada no Irão e dos problemas sentidos no Líbano na invasão de Granada.
Depois de quatro anos e meio de debate, o Goldwater-Nichols Act foi finalmente assinado pelo então presidente Ronald Reagan a 1 de outubro de 1986. Reagan foi o primeiro a apresentar uma NSS, neste novo quadro, no início de 1987. Um documento muito marcado pela Guerra Fria, mas que, já ultrapassado o tempo da “paz através da força”, alterava o foco estratégico para a cooperação e a redução de armamento.
A legislação leva o nome do senador Barry Goldwater, um republicano do Arizona, antigo general da Força Aérea, que tinha sido candidato a presidente nas eleições de 1964, derrotado por Lyndon B. Johnson; e de Bill Nichols, um democrata do Alabama, que esteve por 21 anos como membro da Câmara dos Representantes, que com o Senado foram o Congresso norte-americano.
É assim iniciada a maior reorganização das forças militares norte-americanas desde o National Security Act de 1947, promovido na ressaca da II Guerra Mundial e que tornou a Força Aérea numa entidade autónoma e criou, por exemplo, o Conselho de Segurança Nacional e e o serviço de informações que é a CIA.
O foco da Goldwater-Nichols era a cadeia de comando das forças armadas, tanto civil como militar. Assim, os três ramos das forças armadas – exército, marinha e força aérea – deixam de ser linhas de comando completamente independentes e a autoridade operacional é centralizada no presidente do Estado-Maior Conjunto – o equivalente, em Portugal, ao chefe do Estado Maior General das Forças Armadas. O CJCS (na sigla em inglês) é designado como principal assessor militar do Presidente, do Conselho de Segurança Nacional (NSC, na sigla em inglês) e do secretário da Defesa.
A nova lei também reorganiza a estrutura de comandos militares em diversos “comandos”, por região geográfica, dividindo o poder por mais chefias do que as dos tradicionais dos três ramos. Estabelecem-se os comandos Central (CENTCOM), Europeu (EUCOM), do Pacífico (PACOM) e do Sul (SOUTHCOM). A que depois são acrescentados os comandos do Norte (NORTHCOM) e de África (USAFRICOM), completando os seis atualmente existentes. Além disso, são criados também comandos por função: de Operações Especiais (SOCOM), Estratégico (STRATCOM) e de Transporte (TRANSCOM).
Neste novo quadro, os papéis e as responsabilidades do secretário da Defesa – a parte civil da estrutura de comando das Forças Armadas – e do presidente do Estado-Maior Conjunto saíram reforçados. Mas, mais do que isso, dizem os analistas o Departamento de Defesa conseguiu, a partir daqui, transformar com sucesso as forças armadas numa organização capaz de planear e realizar de operações militares conjuntas complexas.
O que prevê a NSS
O Congresso passou, também, a ter um papel mais activo na relação com o poder militar, porque, desde logo, aprova os orçamentos, mas também porque, juntamente com a perspectiva financeira, a Casa Branca é obrigada a apresentar uma Estratégia de Segurança Nacional e as perspectivas de desenvolvimento em cada ano. A existência de uma NSS não é novidade – a primeira foi apresentada em 1950, pelo Presidente Harry Truman e criou a época que ficou conhecida como “Guerra Fria”. Mas, agora, pela primeira vez na história dos Estados Unidos da América, o Congresso obrigava o Presidente a delinear uma Estratégia de Segurança Nacional.
Por via das dúvidas, a secção 603 da Goldwater-Nichols estabelece exactamente, em cinco pontos, o que deve ser incluído na Estratégia de Segurança Nacional. Em primeiro lugar, deve identificar “os interesses globais, metas e objetivos dos Estados Unidos considerados vitais para a segurança nacional”. Depois, deve elencar as “capacidades de política externa, de compromissos globais e de defesa nacional necessárias para enfrentar agressões e para concretizar a NSS”. Tem de apontar a forma como vai utilizar, “a curto e a médio prazo, o poder político, económico e militar” norte-americano, “para proteger ou promover os interesses e atingir os objetivos e metas” estabelecidos. Em quarto lugar, é avaliada a “adequação das capacidades dos Estados Unidos para concretizar a NSS, incluindo uma avaliação do equilíbrio entre as capacidades de todos os elementos de poder nacional para apoiarem a concretização da NSS”. Por último, uma regra abrangente para definir que devem ser incluídas todas as “informações necessárias para ajudar a informar o Congresso”.
O primeiro teste do conceito foi a Guerra do Golfo de 1991 – “Operação Tempestade no Deserto” –, onde o novo quadro permitiu ao comandante da operação, o general Norman Schwarzkopf, exercendo um controlo total sobre os recursos do Exército, da Força Aérea e da Marinha.
No entanto, na prática, a Estratégia de Segurança Nacional é mais do que um quadro de organização e relações relativo às Forças Armadas, porque, depois de conhecida, é um guia com orientações estratégicas e com prioridades, nomeadamente no que respeita à política externa, onde as diversas agências de segurança nacional vão beber para fazer os seus próprios documentos de orientação e orçamentos.
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