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“30 dólares por barril, aí vamos nós”. Fracasso da OPEP+ põe preço do crude a olhar para o abismo

A Rússia na sexta-feira vetou aprofundar ou até prolongar os cortes na produção, levando a tombos de perto de 9% nos preços. No fim de semana, os sauditas retaliaram com um corte nos preços oficiais e ameaça de aumento na produção, o que levou a quedas de mais de 20%. Com o Covid-19 a pressionar a procura e o excesso de oferta a criar uma guerra de preços, os analistas não afastam a possibilidade de as cotações caírem para mínimos de 2016, abaixo até dos 30 dólares por barril.
9 Março 2020, 07h45

“Ao final do dia, houve uma decisão geral, dolorosa, de terminar a reunião”, admitiu Mohammed Barkindo, secretário geral da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), na sexta-feira. As palavras do nigeriano confirmaram que o cartel de 14 membros mais os 10 produtores aliados liderados pela Rússia que perfazem a OPEP+ não tinham conseguido chegar a acordo sobre novos cortes na produção para combater o dano causado à procura, e aos preços, pela propogação do coronavírus.

Na véspera, os chefes das delegações haviam proposto a discussão de um corte de 1,5 milhões de barris por dia, com duração até ao final do ano.

“Era uma jogada arriscada da OPEP, e acabou por ser uma aposta que não foi ganha”, referiu Warren Patterson, head of commodities strategy do ING. A Rússia não se mostrou disposta a cortar mais, e nem o nível de cortes em vigor, de 1,7 milhões de barris por dia, foi estendido para além de prazo do final deste mês.

Alexander Novak, ministro da Energia da Rússia disse após a reunião em Viena que após 1 de abril “vamos começar a trabalhar sem ter de respeitar as quotas ou reduções que estavam em vigor”. Adiantou, no entanto, “que isto não quer dizer que cada país não irá monitorizar ou analisar os desenvolvimentos do mercado.

Warren Patterson, do ING, explicou numa nota de research que para os russos a questão de ceder quota de mercado ao petróleo de xisto dos EUA foi chave em não apoiar mais cortes. “Os russos conseguem tolerar um ambiente de preços baixos mais do que alguns dos membros da OPEP”, referiu, salientando que o breakeven point da produção russa está abaixo dos 50 dólares por barril, enquanto o dos sauditas está em cerca de 80 dólares.

A ausência de acordo provocou tombos nos preços na sexta-feira. A cotação do barril de Brent desceu 8,90% para 45,54 dólares e o de Crude WTI perdeu 9,35% para 41,68 dólares. As quedas acumuladas este ano são de 31% e 31,85%, respetivamente.

No domingo à noite, momentos após a abertura dos mercados na Ásia, os futuros do Brent caíram 31% para 31 dólares antes de atenuar as quedas para descer ‘apenas’ 19% para 36,70 dólares o barril. Durante o fim de semana, a Arábia Saudita cortou os preços oficiais (OSP, official selling prices) em todos os tipos de crude entre 6 e 8 dólares por barril e que planeia aumentar a produção em 10 milhões de barris por dia em abril.

Esta segunda-feira pelas 07h43, o barril de Brent, a referência para Portugal, afundava 25,58% para 33,69 dólares, e o de Crude WTI desce 27,83% para 29,79 dólares.

Guerra de preços

Após os tombos de sexta, devido ao excesso de oferta que irá inundar o mercado, os analista já viam mais espaço significativo para quedas nos preços, diz o ING: “30 dólares por barril, aí vamos nós”. O banco holandês reviu em baixa as projeções para os preços do Brent e vê para o segundo trimestre de 2020 um preço médio de 33 dólares por barril, face à anterior projeção de 56 dólares.

Numa nota de research com o título “Perspetivas de uma guerra de preços”, Jens Nærvig Pedersen. senior analyst do Danske Bank referiu que o impacto negativo da queda da procura devido ao Covid-19 e um choque de subida na oferta poderia pressionar o Brent para até abaixo dos 30 dólares por barril e em direção aos mínimos de 2016, de 27,67 dólares em janeiro desse ano.

Pederson salientou que a Arábia Saudita e a Rússia têm neste momento um excesso de capacidade de cerca de 2 a 2,5 milhões de barris por dia e que numa guerra de preços os Emirados Árabes Unidos e o Koweit também utilizariam a capacidade extra, que é de cerca de meio milhão de barris por dia. Adiantou, no entanto, que uma guerra de preços não seria isenta de danos, com a Rússia a ver o rublo a depreciar para encaixar o impacto e a Arábia Saudita a ter de ir às reservas nos cofres para cobrir despesa pública.

Incógnita da Líbia

Hans van Cleef, economista sénior para a energia no banco holandês ABN-Amro, recordou que além da queda na procura devido ao coronavírus e do excesso de oferta, há outro fator que poderá afetar os preços.

“É incerto como é que as exportações da Líbia vão se desenvolver nos próximos meses”, disse, salientando que quando a queda de um milhão de barris por dia devido a conflitos internos no país for revertida isso irá limitar ainda mais o upside nos preços.

Por outro lado, van Cleef explicou que um fator de equilibrio poderá surgir dos EUA, onde a produção de petróleo de xisto ao atual preço do WTI não é economicamente viável para muitas empresas. “Isto poderia levar à estabilização, ou mesmo a uma pequena descida na produção nos EUA nos próximos meses”.

No cômputo geral, o ABN-Amro cortou a projeção do preço do barril de Brent no final deste trimestre para 40 dólares de 60 dólares. “Num selloff violento, os preços do petróleo poderão mesmo descer mais e tocar nos mínimos de 2016″, afirmou van Cleef, adiantando que esse não o cenário base que prevê e mesmo se se concretizar seria temporário pois seria corrigido por cortes na produção especialmente nos Estados Unidos.

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