Em outubro de 2012, um mês depois da tomada de posse de José Eduardo dos Santos para o que acabaria por ser o último mandato na presidência angolana, o Governo anunciou o lançamento de um projeto há muito desejado – um fundo soberano, um instrumento must para qualquer petro-economia que se preze.

Convidados os grandes órgãos de media mundiais, Armando Manuel, secretário do presidente para os assuntos económicos e o escolhido para liderar o fundo, anunciou o plano: transformar um fundo existente num fundo soberano, dotado de 5 mil milhões de dólares para investir em ativos financeiros com grau de investimento em mercados desenvolvidos, em ativos de mercados emergentes com elevado retorno, em projetos de infraestrutura em África e o resto (7,5%) em projetos sociais.

O foco em projetos hoteleiros levantou algumas dúvidas aos analistas, mas as principais críticas centravam-se na inclusão de José Filomeno dos Santos (conhecido como Zenú), no board do fundo.

Passados oito meses, essas críticas viriam a acentuar-se, após Armando Manuel ter sido promovido a ministro das Finanças, dando o lugar na liderança do fundo soberano a Zenu.

Nepotismo? Um degrau para o filho suceder ao pai na presidência? José Filomeno dos Santos desdobrava-se, em entrevistas, a rejeitar as críticas, argumentando que a nomeação refletia apenas a experiência que tinha acumulado como gestor financeiro.

Antes disso o fundo já ultrapassara o prazo por si próprio imposto para divulgar uma política de investimento, escudando-se atrás do atraso causado por um (rejeitado) pedido feito pelo partido da oposição, a CASA-CE, ao Tribunal Constitucional, para anular a criação do fundo.

Além dos atrasos nos investimento (que só iniciaram em 2014), o fundo foi criticado por ter escolhido a Quantum Global, empresa de Jean-Claude Bastos de Morais, amigo e antigo sócio de Zenú no Banco Kwanza Invest, para gerir os ativos, sem concurso público.

A relação viria ser posta em causa de novo em novembro de 2017, quando documentos divulgados pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação – os chamados Paradise Papers – denunciaram que cerca de 3.000 milhões de dólares do fundo foram investidos em fundos de investimento nas Maurícias, através da Quantum, com a empresa de Bastos de Morais a receber até 2,5% do capital por ano.

Numa inédita ‘entrevista coletiva’ esta segunda-feira, João Lourenço deixou em aberto a possibilidade de exonerações no fundo soberano, mas esperou menos de dois dias para as fazer.

O presidente afirmou que ainda que contratou uma entidade externa para verificar as contas do fundo e que o Governo vai passar a ter um controlo mais efetivo da instituição.

O vendaval de exonerações, nomeações e auditorias encetado por João Lourenço constitui uma surpresa, mas também traz alguma ansiedade. Estamos todos à espera de ver se a dança de cadeiras vai passar apenas disso mesmo, ou se vai ser seguida de alterações mais profundas na governação das instituições e dos ativos angolanos.
No caso do fundo soberano, a pressa seria boa conselheira, pois é uma questão de recuperar o tempo desperdiçado.
Como se vê na grave crise que Angola atravessa, o país precisa de usar a riqueza que produz para se proteger de choques externos (o preço do petróleo) e investir em projetos sociais a que o capital privado não chega.

Todas as análises indicam que a ‘fase 1’ do fundo soberano não fez isto. Esperemos que a nova fase, após o reset, faça melhor.