De vez em quando, nos fins de semana de visita à família e de almoço prolongado, temos estas discussões mais acaloradas sobre questões da atualidade económica, que hoje em dia quer dizer, a maioria das vezes, atualidade política, ou vice-versa. O que se passa é que, para muitas pessoas, a economia é uma completa abstração, sem qualquer reflexo prático na vida do dia a dia; é como se não nos dissesse respeito, como se fosse de outro país ou de outro planeta.

A última conversa foi sobre o ministro, as Finanças, o défice público e isto tudo junto no que é a esquerda ou a direita. O pai mais velho estava carrancudo, como se o Benfica tivesse perdido (mas tinha ganho, com sofrimento, é certo). Não era futebol, era o défice. “Aquele Centeno parece que esteve na escola do Passos Coelho, com esta paranóia de reduzir o défice”, disse-nos, abanando a cabeça, que o assunto não era para menos.

Explicou-nos, então, que não havia problema nenhum com o défice, desde que o mantivéssemos controlado, ali, de trela curta, não vá ele fugir. “Temos défice desde sempre e as coisas vão melhorando, sem ser preciso este fundamentalismo”. Por vezes, distraidamente, caio na esparrela de argumentar que não, que não é nada disso, que o défice que criamos agora vai direitinho parar à dívida e isso quer dizer que alguém vai ter de pagar mais tarde aquilo que estamos a gastar. Não adianta.

“Até o Rui Rio diz que devíamos ter mais calma na redução do défice”, garante, porque parece que as posições se inverteram e agora é o PS que quer tino na despesa pública e o PSD que clama pela abertura dos cordões à bolsa. E não adianta tentar dizer que o alguém pagar depois quer dizer que vão ser os netos a ter de trabalhar muito para pagar o que os avós e os pais andaram a gastar. “Nada disso! Basta gerir, como sempre foi feito”, diz-me.

Quando temos filhos, encanita-nos pensar que a vida deles será pior porque decidimos investir o dinheiro que não tínhamos para salvar bancos que foram ao charco porque andaram a gastar dinheiro que também não tinham. A mim encanita-me e deixa-me preocupada. “Para isto, podiam lá ter ficado os outros”, atira-me o pai mais velho. Se calhar podiam, mas desde que apertassem os gastos, para termos um vislumbre de futuro. “Temos de pensar a mais longo prazo”, digo, conciliadora. “A longo prazo estamos todos mortos”, responde-me. Ou a curto prazo, se tivermos em conta o estado em que vai estando o Serviço Nacional de Saúde.