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A Tecnologia, o Fluxo e o Futuro do Ensino

No contexto atual, a digitalização e a inteligência artificial (AI) são o “novo fluxo” da revolução (2005) – a partir de sistemas interconectados no processo produtivo (CPS, cyber Physical system).
8 Junho 2021, 07h15

O conceito de “fluxo” foi mobilizado por Heráclito (Éfeso, 535-475 a.C.) para chamar a atenção para a mudança como um traço característico do mundo. Volvidos muitos séculos, desde Éfaso, o termo volta a ser muito apropriado para falarmos acerca da inteligência artificial e digitalização, elementos nucleares da 4º revolução industrial, num quadro político e social de incerteza intra-estados e desordenado extra e inter-estados, reportando-nos apenas ao nível macro.

Destarte, se há algo que a humanidade aprendeu com pandemia (Covid-19) é que não controla o futuro. De facto, ainda não temos os poderes plenipotenciários que erradamente supúnhamos dominar. Todavia, podemos aprender, e muito, com o passado, de forma a fazer com que o “rio” das “grandes transformações”[1] chegue ao “mar” do bem-estar público geral.

É sobre esta temática que versaremos nos próximos parágrafos. A economia desde o primeiro choque tecnológico (1776-1869[2]) – a mecanização dos teares industriais -, está em permanente transformação voltada para o crescimento, a partir da inovação, “de braço dado” com a tecnologia. Quase sem retrocessos e conflitos, quando o “salto económico e de rutura social deixam de controlar, instalam-se o tumulto e o caos”[3]. Relembre-se, naquele longínquo período, a intervenção dos “Luddites” (1811) e as variadas ações para destruir os primeiros teares, de forma a pararem “a revolução não pela tecnologia em si, mas porque, alegadamente, destruía o desenvolvimento da matriz social”.

Já na segunda revolução industrial (1870-1960[4]) – as linhas de produção em massa com recurso à energia eléctrica e divisão de trabalho -, desencadeou movimentos revolucionários de contestação social e estiveram na base de duas guerras mundiais, bem como do aparecimento da economia social de mercado, através do “New Deal”.

Excecionalmente a terceira revolução (1960-2005[5]) – utilização da electrónica e a informática (tecnologias de informação) para a produção automatizada – evoluiu num clima generalizado de paz e prosperidade sem paralelo. Entre 1990-2005, 600 milhões de pessoas (60 vezes a população de Portugal) ultrapassaram o limiar de pobreza de $ 1,90 / dia (a PPP de 2011) e a esperança de vida aumentou de uma forma generalizada no mundo, mas de uma forma mais relevante nos Países de Baixo Rendimento de 51,7 para 58,3 anos[6].

No contexto atual, a digitalização e a inteligência artificial (AI) são o “novo fluxo” da revolução (2005) – a partir de sistemas interconectados no processo produtivo (CPS, cyber Physical system). Uma análise da capacidade das AI em relação às competências do pensamento, demonstram que na criatividade, identificação de novos padrões, e no pensamento lógico ligado à resolução de problemas a AI é inferior à mente humana (capacidade média), enquanto na optimização e anterior, na pesquisa e conservação (recuperar) da informação e no reconhecimento de padrões conhecidos, é superior (McKinsey Global Institute. “Um Futuro que Funciona: Automação e Emprego e Produtividade”, Janeiro de 2017, Anexo 16).

Para concluir, Alexander Bogdanov (Rússia, 1873-1928), num longo tratado filosófico de ideias originais, “Tectology: Universal Organization Science” (1913-22), propôs unificar “as ciências sociais, biológicas e físicas”, considerando-as como sistemas de relações, procurou nos seus princípios organizacionais, dados que fundamentam todos os sistemas. Este, talvez, devesse ser o nosso “mar” atual, sobre o qual os rios e outros afluentes deveriam desaguar. Na verdade, precisamos ter um olhar holístico destes tempos de mudança. Na prática, os desafios são diversos: na economia (novos modelos de negócio e de concorrência), política, sociedade, ordem jurídica e cultura, mas sobretudo na educação. Há muitas questões por responder: Por exemplo, temos máquinas que aprendem, mas e os jovens que as operarão, estão a aprender como manuseá-las? Num período de acelerada mutação digital exige-se velocidade e não lentidão, mesmo com contornos ainda pouco definidos, temos que fornecer aos jovens um contexto adequado, transmitindo-lhes confiança no futuro digital e não a dúvida de perpetuar o analógico. Como reforçar as suas capacidades tecnológicas, curiosidade, criatividade e capacidade de colaboração, em simultâneo? Sintetizando, num “jogo” de onde sairemos derrotados se formarmos robôs de 2º grau, em vez de seres humanos de 1ª classe; não deveremos perder de vista que mais e melhor tecnologia é o caminho, dado que, como se procurou ilustrar acima, foi no passado, é presente e será certamente no futuro. Resistir, não só não é a melhor opção, como nos atrasa no processo de entrada no futuro. Como sabemos dos descobrimentos do século XVI, o ideal é chegar primeiro.

[1] Termo lançado por Karl Polanyi (Austro-Húngaro, 1886-1964).
[2] Máquina a vapor Boulton e Watt (1774), tear mecanizado (1784) e locomotiva a vapor (1829).
[3] “The Globotics Upheavel. Globalization, Robotics and the Future of Work ”, Baldwin, R., 2019, Oxford University Press.
[4] Linha de montagem (1870), central elétrica comercial (1871), lâmpada elétrica (1880) e carro de combustão interna (1886).
[5] Computadores pessoais (1962), controlador lógico programável (PLC, 1969) e rede mundial de computadores (1990).
[6] fonte. Banco Mundial, https://data.worldbank.org/indicator/SP.DYN.LE00.IN

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