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Advogado-geral do TJUE dá razão ao Novobanco, BdP e FdR contra os clientes do ex-BES Espanha

O advogado-geral do TJUE veio dar razão ao Novobanco, que foi aqui apoiado pelo Banco de Portugal e pelo Fundo de Resolução, contra os lesados do ex-BES Espanha.
22 Março 2024, 00h33

O advogado-geral do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), Jean Richard de la Tour, num relatório publicado esta quinta-feira dá o seu parecer aos “pedidos de decisão prejudicial apresentados pelo Tribunal Supremo (Espanha)” apresentados no âmbito de litígios que opõem o Novobanco — Sucursal em España (Novobanco Espanha), apoiado pelo Banco de Portugal e pelo Fundo de Resolução, a vários clientes do Novobanco Espanha, que sucedeu ao Banco Espírito Santo — Sucursal en España (BES Espanha), sucursal da instituição de crédito portuguesa Banco Espírito Santo, à qual o Novobanco sucedeu na sequência da medida de resolução adotada pelo Banco de Portugal enquanto Autoridade de Resolução.

Os referidos pedidos respeitam ao impacto, em diferentes contratos de produtos e serviços financeiros, da medida de resolução aplicada ao BES.

Num dos casos, um dos clientes do BES Espanha tinha, em janeiro de 2017, reclamado ao Novo Banco Espanha o reembolso dos montantes cobrados pelo BES Espanha devido à aplicação da “cláusula de taxa mínima” do seu mútuo hipotecário de 2%, que foi considerada abusiva por Acórdão de 9 de maio de 2013, pelo Tribunal Supremo de Espanha, que invocou falta de transparência dessas “cláusulas de taxa mínima”. O crédito remontava a 2006 e em 2013 o cliente pediu ao BES Espanha que deixasse de aplicar a “cláusula de taxa mínima” constante do seu crédito, o que o BES Espanha fez a partir do mês de junho de 2013.

As “cláusulas de taxa mínima” eram cláusulas previstas em contratos de mútuo hipotecário com taxa variável celebrados com consumidores por um número significativo de instituições financeiras em Espanha. Estas cláusulas fixavam um limiar (ou chão) abaixo do qual a taxa de juro variável não podia descer, ainda que a taxa de referência (geralmente a Euribor) fosse inferior. Quando as taxas de referência desceram significativamente abaixo deste limiar, os consumidores aperceberam-se de que não poderiam beneficiar dessa descida e que teriam de
continuar a pagar a taxa de juro mínima (fixada geralmente entre dois e cinco pontos percentuais), não obstante terem celebrado mútuos hipotecários com taxa variável. O que levou os clientes a intentarem m Espanha milhares de ações judiciais nas quais pediram que fosse declarada a ilicitude das “cláusulas de taxa mínima” e a restituição dos juros pagos em excesso.

Foi o que aconteceu com um cliente do BES Espanha, o problema é que o BES foi alvo de resolução e foi criado o Novobanco, passando a sucursal a Novo Banco Espanha.

O que se discutiu aqui e que agora o advogado-geral do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) Jean Richard de la Tour defende num relatório de conclusões publicado esta quinta-feira, é que é válida a justificação do Novo Banco Espanha que se opôs à ação “invocando uma exceção relativa à ilegitimidade passiva”, já que o crédito que poderia ter surgido a favor desse cliente e que consistia na restituição dos montantes recebidos pelo BES Espanha a título da aplicação da “cláusula de taxa mínima”, não tinha sido transferido para o Novobanco no âmbito da aplicação da medida de resolução ao BES pelo Banco de Portugal que ocorreu em 3 de agosto de 2014.

O documento revela ainda que no dia 29 de dezembro de 2015, “o Banco de Portugal adotou duas decisões para alterar e clarificar o anexo 2 da decisão de agosto de 2014, que esclareciam nomeadamente que, a partir desse dia, ‘os créditos e as indemnizações relacionados com a alegada anulação de determinadas cláusulas de contratos de mútuo em que o BES era o mutuante’ não eram transmitidos ao Novobanco”.

Depois há outro caso em que dois clientes, em 17 de abril de 2017, intentaram uma ação contra o Novobanco, pedindo, a título principal, a anulação dos dois produtos financeiros que o BES Espanha adquiriu para esses clientes que tinham aberto uma conta de valores mobiliários e celebrado um contrato de gestão de carteira de investimentos com o BES em Espanha. Os clientes invocaram a subscrição “por erro no consentimento, devido à insuficiência das informações que o BES lhes forneceu”. Na ação os clientes pediam “a restituição recíproca dos montantes recebidos por cada uma das partes, acrescidos dos juros a contar da data de cada pagamento e, a título subsidiário, a indemnização dos prejuízos sofridos ao adquirirem os dois produtos financeiros, acrescida dos juros calculados à taxa de juro legal a contar da notificação da ação”.

Na altura o Novo Banco Espanha opôs‑se à ação “invocando uma exceção de ilegitimidade passiva já que o crédito que poderia ter surgido a favor desses clientes, e que consistia na restituição dos montantes pagos por estes últimos a título dos produtos financeiros devido à possível nulidade dos contratos ou na indemnização das perdas sofridas pelo facto de esses clientes não terem sido informados dos riscos dos instrumentos financeiros em causa, não tinha sido transferido para o Novobanco pelas medidas de saneamento adotadas pelo Banco de Portugal em relação ao BES”.

O terceiro caso tem a ver com a célebre retransmissão das obrigações seniores do Novobanco para o BES em 2015, uma decisão tomada pelo Banco de Portugal, para recapitalizar o banco de transição e que foi tomada ao abrigo da medida de resolução de 2014.

Neste caso, em 17 de novembro de 2014, a sociedade Proyectos, Obras y Servicios de Badajoz, (POSB), adquiriu, no mercado secundário, uma obrigação do tipo “Senior Bond NB 6,875 % maturity July 2016”, com termo em 15 de julho de 2016, que tinha sido emitida pelo BES, mas, no momento da sua aquisição pela POSB, através de uma empresa de investimento, este instrumento de dívida não subordinada fazia parte do património do Novobanco, para o qual tinha sido transferido por força da decisão de agosto de 2014. Em julho de 2015, o Novobanco ainda pagou à POSB um rendimento correspondente à anuidade 2014‑2015. Quando a obrigação chegou ao seu termo em 15 de julho de 2016, o Novobanco nem pagou o rendimento obrigatório a título de 2015‑2016 nem restituiu o valor nominal dessa obrigação à POSB.

Em resposta à queixa, o Novobanco indicou que a recusa de pagamento se baseava nas decisões de 29 de dezembro de 2015, que tinham “retransmitido” o passivo associado a esta obrigação do Novobanco para BES (banco mau).  Em 25 de junho de 2017, a POSB intentou uma ação contra o Novobanco, pedindo o pagamento do rendimento correspondente à anuidade 2016‑2016 da obrigação e a restituição do montante correspondente ao seu valor nominal. O banco opôs‑se ao recurso invocando mais uma vez “uma exceção de ilegitimidade passiva” já que o passivo associado à obrigação tinha sido retransmitido para o BES.

Os três casos têm em comum o facto de se terem passado numa subsidiária num país diferente do da casa-mãe que foi alvo de uma Medida de Resolução. O que implica o reconhecimento, num Estado‑Membro de acolhimento, dos efeitos de uma decisão da autoridade administrativa competente do Estado‑Membro de origem que não foi publicada lá (em Espanha).

Aqui o advogado propõe ao Tribunal de Justiça, primeiro, que “considere que a falta de publicação (…), que tem por finalidade permitir que os terceiros recorram da medida de Resolução no Estado‑Membro de origem, não tem impacto nos efeitos do reconhecimento mútuo dessa medida nos Estados‑Membros de acolhimento”.

Em segundo lugar propõe ao Tribunal de Justiça que considere que os particulares não podem invocar a confiança legítima relativamente a um banco de transição criado no quadro de uma medida de resolução.

Em terceiro lugar propõe ao Tribunal de Justiça que considere que os créditos indemnizatórios associados a um contrato podem ser deixados no passivo de um banco objeto de uma medida de Resolução com a criação de um banco de transição para o qual são transferidos apenas certos ativos e certos passivos.

O advogado-geral do TJUE veio assim dar razão ao Novobanco, que foi aqui apoiado pelo Banco de Portugal e pelo Fundo de Resolução.

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