Se a decisão em torno da localização do novo aeroporto de Lisboa já leva 50 anos, a unanimidade como fator de escolha é uma utopia. Consensual só mesmo a necessidade da capital ter uma infraestrutura aeroportuária que consiga responder à enorme procura turística que o país tem e ao facto do Aeroporto da Portela ter, há muito, esgotado a sua capacidade.
A Comissão Técnica Independente deu por concluído o seu trabalho de análise às várias soluções propostas e deu o seu aval à solução Alcochete, através de uma combinação Aeroporto da Portela + Campo de Tiro de Alcochete.
Como recordou o JE a 26 de abril, o Campo de Tiro de Alcochete foi a localização escolhida pelo Governo de José Sócrates em 2009. No entanto, este projeto nunca saiu do papel, tendo sido interrompido na altura devido à crise económica.
Note-se que esta opção prevê duas pistas, com a capacidade para 80 movimentos por hora e possibilidade de expansão até quatro pistas. 5.550 pessoas expostas ao ruído. Fica a 40 quilómetros de Lisboa, cerca de 40 minutos. Sem ferrovia. Inicialmente, previa a construção da terceira travessia sobre o Tejo para a ligação ferroviária. Uma das vantagens é que os terrenos pertencem ao Estado.
Costa: do “bom ovo da Páscoa” à “relativa inveja”
O primeiro-ministro demissionário António Costa mostrou alguma cautela face à adoção de uma decisão baseada na proposta da CTI. Apesar de respeitar a decisão técnica, o chefe de Governo salientou que o decisor político tem a liberdade para alterar aqueles que são os fatores críticos que vão suportar aquela que será a decisão sobre o novo aeroporto. “A decisão final pode ser alterada”, referiu o governante relativamente à possibilidade da escolha política ser diferente do que foi proposto. “Não será propriamente um presente de Natal, mas será seguramente um bom ovo da Páscoa para o Governo que, em março, vier a governar o país”, referiu o primeiro-ministro que manifestou “relativa inveja” por “não ser o decisor político”.
Os grupos de trabalho para o estudo de uma nova localização do novo aeroporto de Lisboa podem não ficar por aqui. O presidente do PSD, Luís Montenegro, destacou que a localização será “uma das primeiras decisões” se os social-democratas constituírem Governo e para já, o líder da oposição anunciou a criação de um “grupo de trabalho” interno para analisar o tema. Certo é que Luís Montenegro considera que o mais apropriado que a decisão sobre a localização seja tomada pelo próximo Governo.
Mais assertiva parece ser a posição de Pedro Nuno Santos, candidato à liderança do PS e ex-ministro das Infraestruturas cuja posição no Governo ficou fragilizada após avançar com uma decisão sobre a localização do novo aeroporto. “O país tem de tomar decisões. É olhar para relatório e tomar uma decisão e não continuar a marcar passo. Já marcamos demasiado o passo. Já se estudou muito sobre o novo aeroporto e agora é preciso decidir”, sublinhou o quadro socialista.
Quanto a José Luís Carneiro, o candidato à liderança dos socialistas defendeu em declarações à TSF e DN que é preciso “promover o diálogo com o líder da oposição” e manter assim um acordo com o PSD para que chegar a um consenso “tão alargado quanto possível”. No entanto, o ministro da Administração Interna salientou que se não houver consenso, prevalece a decisão “em função do interesse nacional”.
André Ventura, líder do Chega, defendeu esta terça que tanto o PS como o atual primeiro-ministro se devem abster de tomar decisões sobre a localização do novo aeroporto de Lisboa. No entender deste líder partidário, a decisão sobre a localização da nova infraestrutura aeroportuária, em Lisboa, deve ser tomada no quadro parlamentar que sair das eleições legislativas marcadas para 10 de março: “Não faz sentido que os próximo governo esteja a governar o país com base nas decisões tomadas pelo PS”, sublinhou.
Para o Bloco de Esquerda, Alcochete era a decisão “óbvia” sendo que o líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, criticou PS e o PSD de fazerem “parte do problema e não da solução”. Paula Santos, líder parlamentar do PCP, considera que é tempo de avançar para a solução “Alcochete” e do lado do Livre, Rui Tavares, congratulou-se sobretudo pelo facto de se ter demonstrado que a opção “Montijo” era inviável. Do lado do PAN, Inês Sousa Real demonstrou grandes reservas quanto a Alcochete, alertando que a construção do novo aeroporto nessa localização “compromete um dos maiores aquíferos de água doce do país”.
Alcochete e “um longo caminho a percorrer”
Apesar de reunir a preferência da CTI, a solução Alcochete como localização de destino do novo aeroporto de Lisboa ainda tem “um longo caminho a percorrer”. Essa foi a ideia transmitida por Fernando Pinto, presidente da Câmara de Alcochete, em declarações à imprensa após ser conhecida a decisão técnica. “Há pressupostos que para mim são básicos, nomeadamente as questões ambientais e as questões de segurança e o campo de tiro representa aquilo que tiveram oportunidade de ver…uma boa classificação nessa matéria”, mas com um longo caminho pela frente, destacou o autarca.
Vendas Novas foi talvez uma das maiores surpresas desta terça-feira no que diz respeito à apresentação do relatório final da CTI. Ficou em segundo lugar na apreciação da comissão, algo que mereceu o entusiasmo de Luís Dias, presidente da Câmara de Vendas Novas. “Está agora nas mãos do Governo tomar as decisões que competem ao poder político; havendo um acordo, pelo menos no passado havia esse acordo na esfera da governação entre o PS e o PSD”, sublinhou Luís Dias. Sobre o trabalho dos técnicos, o autarca deixou muitos elogios: “Foi de facto exemplar, transparente e isento, que era o que precisávamos há muitos anos”, destacou Luís Dias.
Do lado dos perdedores da tarde, destaque para a reação de Ricardo Gonçalves, presidente da Câmara de Santarém, que prometeu que irá analisar o relatório ao pormenor mas estranhou, aos microfones da TSF, que só agora sejam apontadas razões aeronáuticas para a tomada de decisão.
O presidente da Confederação do Turismo de Portugal, uma das principais vozes de defesa de uma solução que possa expandir a capacidade do novo aeroporto de Lisboa, considerou que a previsão de sete anos para construir a infraestrutura em Alcochete não é real e que se calhar é mais apropriado falar de uma solução daqui a mais de dez anos. Estando a Portela esgotada como é consensual e existindo a percepção de que será difícil construir Alcochete em sete anos, qual é a solução de médio prazo que pode atenuar a capacidade atual em Lisboa. A questão foi deixada por Francisco Calheiros e deverá merecer discussão nos próximos tempos.
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