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Alemanha: novos níveis de despesa com impacto na Europa

A Alemanha prometeu investir na defesa e nas infraestruturas, o que deverá ter um impacto significativo na União Europeia. Mas o tempo necessário para implementar os planos não é favorável.
Wolfgang Ratay/reuters
24 Março 2025, 14h03

Alex Everett, gestor de Investimentos da Aberdeen, e Matthew Amis, diretor de Investimentos, analisam o anúncio do próximo chanceler, Friedrich Merz, de que fará alterações significativas nos planos de despesa e investimento do país. Se forem aprovados, os gastos com a defesa, que totalizam 1% do PIB (aproximadamente 80 mil milhões de euros), ficarão isentos do ‘travão da dívida’ autoimposto pela Alemanha. “Esta mudança estratégica visa melhorar as capacidades de gestão de conflitos e, ao mesmo tempo, libertar espaço fiscal para outros investimentos essenciais”, referem os analistas.

Além disso, Merz anunciou um pacote substancial de despesas em infraestruturas, comprometendo 500 mil milhões de euros nos próximos dez anos. A Alemanha pretende reparar as suas infraestruturas, “incluindo o seu outrora invejado sistema ferroviário e as suas pontes deterioradas”. Além disso, o governo vai flexibilizar as restrições de empréstimos às regiões alemãs (länders), permitindo empréstimos até 0,35% do PIB por ano. “Isto marca uma mudança de paradigma para a Alemanha, que tem vindo a sofrer com um crescimento fraco há anos”.

Parece haver um amplo apoio europeu a estas medidas. “A União Europeia (UE), sob a liderança de Ursula von der Leyen, flexibilizou as regras de despesa para acomodar o aumento dos orçamentos de defesa. Para um organismo normalmente travado pela burocracia, a velocidade da mudança tem sido surpreendente – mesmo que ainda estejamos longe da sua implementação”.

Os decisores políticos também estão a implementar financiamento central. A reorientação dos fundos do Next Generation EU para a defesa e o potencial para empréstimos adicionais em toda a Europa indicam um forte empenho em enfrentar os desafios geopolíticos. “Portanto, a Alemanha não está sozinha, mas é o primeiro país a mover-se. Haverá uma pressão significativa para que outros países sigam o exemplo, especialmente a Itália e a Espanha, que estão muito atrás em termos de gastos com a defesa. O relaxamento das regras fiscais deverá tornar o aumento das despesas mais politicamente aceitável”.

Os gastos significativos também podem ajudar a diminuir a ira do presidente Trump, referem os analistas. Grande parte do pessimismo em torno das perspectivas económicas da Europa baseou-se numa previsão de crescimento já baixa, ainda mais prejudicada pelos efeitos esperados pelas tarifas dos EUA. No entanto, Trump está claramente disposto a fechar acordos. Atender a algumas das suas exigências por mais gastos pode reduzir o impacto das tarifas. Um acordo para excluir automóveis já está em curso.

“Uma palavra de aviso – os planos ambiciosos da Alemanha dependem da boa vontade política contínua do eleitorado e dos partidos rivais. Merz está a pisar terreno incerto ao tentar aprovar estas medidas no atual parlamento. Gastar milhares de milhões de forma eficaz em tão pouco tempo não será tarefa fácil. O mercado está a dar pouca atenção aos prazos.

“Tudo isto pode parecer positivo, mas não se debe esquecer que, enquanto investidores em obrigações, somos naturalmente pessimistas. A Europa financiará a maior parte das despesas adicionais previstas através da emissão de obrigações. O presidente francês Macron manifestou recentemente o seu desejo de mais gastos com a defesa, mas sem se comprometer com mais impostos. Isto requer mais empréstimos”.

O grande volume de emissão adicional esperada elevou consideravelmente os rendimentos dos títulos alemães. “Como resultado, acabámos de ver o maior movimento diário desde a reunificação alemã em 1990. Isto é mais impressionante do que preocupante – estamos simplesmente a ver o nível de compensação dos títulos subir para um novo máximo”.

As curvas de rendimento deverão tornar-se mais íngremes, pelo menos a partir de prazos de 10 anos, que são menos afectados pela política monetária. Um maior crescimento e potencial de inflação, combinados com uma maior emissão, levarão os investidores a exigir prémios de prazo mais elevados. Estamos entre aqueles que privilegiam os acentuadores de curvas europeus.

Os rendimentos iniciais parecem estar em risco. À medida que a perspetiva de crescimento se torna menos negativa, o Banco Central Europeu (BCE) poderá ver menos necessidade de reduzir as taxas. Mesmo que a implementação dos planos de despesas esteja longe, a perspectiva irá provavelmente pesar nas perspectivas da política monetária. A última reunião do BCE confirmou uma profunda incerteza para os decisores políticos.

“E há outro elefante na sala: os horários. A Europa pode ter surpreendido pela positiva com a rapidez da sua resposta, mas gastar os milhares de milhões prometidos levará tempo. Esperamos que os mercados deliberem longamente sobre se a promessa de “compota amanhã” é suficiente para gerar repercussões positivas para as poupanças reais e se os multiplicadores das despesas são significativos”, conclui o comunicado.

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