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António Ramalho admite reduzir 1,7 mil milhões de NPL para atingir rácio de 5%

Prioridade da administração do banco é limpar o balanço em 2020. Ramalho disse que o banco está “a dar a volta ao Cabo da Boa Esperança em 2020”, e já não está “no Cabo das Tormentas”. O CEO quer o turnaround do banco em 2020.
  • Cristina Bernardo
28 Fevereiro 2020, 20h59

O presidente executivo do Novo Banco, António Ramalho, admitiu recorrer a vendas de carteiras para reduzir em 1,7 mil milhões de euros o crédito malparado (NPL), para atingir um rácio de NPL de 5% em termos consolidados. Este é o guidance do BCE para os bancos da zona euro.

“Estamos a estudar a possibilidade de concretizar mais uma operação de venda de créditos para acelerar o processo de aproximação ao rácio de 5% de NPL”, revelou Ramalho. O objetivo de 5% é no consolidado, porque o Novo Banco na atividade recorrente tem um rácio de 3,6%, segundo o CEO do banco.

O CEO falava durante a conferência de imprensa dos resultados anuais relativos ao exercício de 2019. No consolidado, o Novo Banco registou prejuízos de 1.059 milhões de euros. No entanto, a atividade ‘recorrente’ que corresponde ao banco “bom” apresentou um resultado líquido positivo de 177,6 milhões.

Prioridade da administração do banco é limpar o balanço em 2020: o desaparecimento do Legacy e a resolução de todos os outros problemas, garantiu Ramalho.

“Toda esta reestruturação custa tempo e dinheiro”, repetiu o CEO do banco.

Ramalho disse que o banco está “a dar a volta ao Cabo da Boa Esperança em 2020”, e já não está “no Cabo das Tormentas”. Pela primeira vez disse que já não falta saber ‘o que temos de fazer?’, a pergunta é ‘quando terminamos o que estamos a fazer?’.

“O turnaround está perto, pretendemos realizá-lo no ano de 2020″, afirmou. O turnaround é precisamente a absorção total do Legacy, disse.

“Quando se tem 11,8% de rácio de NPL, depois de um enorme trabalho que não tem paralelo na Europa, de redução desse rácio que começou por ser de 36,6%, ainda não estamos lá. Só estaremos lá quando esse rácio for inferior a 5%, esse é o guidance do BCE para os bancos de alta qualidade. Isto significa que ainda temos de fazer um esforço adicional, que vai afectar a conta de exploração do próximo ano e que nós manteremos como prioridade absoluta, para que em 2021 não haja Legacy”, disse António Ramalho.

“Se isso representa uma nova venda de carteira, eu diria que do ponto de vista dos imóveis já fizemos as vendas mais significativas, vendemos os granulares e os difíceis – custou 5 milhões as limpezas para manter esses imóveis dentro das exigências legais – já feitas essas vendas, sentimos que com as vendas granulares e com a máquina que está montada, é provavelmente suficiente para realização dos objetivos pretendidos. Até porque o montante de 1,1 mil milhões de euros de imóveis que temos em carteira é já aceitável porque representa menos de 3% do nosso ativo. Recordo que chegámos a ter 3,5 mil milhões de imóveis em balanço, que representava quase 10% do ativo”, detalhou o CEO. Nessa altura o banco tinha 35% de ativos não performantes, lembrou.

“Hoje o banco é viável”, disse António Ramalho.

A evolução da carteira de imóveis passou de 3,5 mil milhões em 2017 (2,5 mil milhões de valor líquido) para 2,2 mil milhões (1,1 mil milhões de valor líquido), ou seja caiu 37%.

O banco anunciou  a redução dos créditos não produtivos de 6.739 milhões para 3.308 milhões de euros, isto é reduz para metade o rácio de NPL de 22,4% em dezembro de 2018 para 11,8% para dezembro de 2019. No recorrente situou-se em 3,6% quando em dezembro de 2018 foi 5,4%.

O Novo Banco anunciou em 2019 a redução do Legacy em 57,9% (-6.176 milhões) com reflexo em todas as categorias de ativos. A venda da GNB Vida contribuiu com -4.076 milhões para este decréscimo.

Desde 2017 até 2019 o banco reduziu o Legacy de acordo com os objetivos acordados entre Portugal e a União Europeia. Essa redução foi de 10,2 mil milhões de euros. Através da venda, ou fecho, de 10 operações no estrangeiro; através da redução nesse período de 6.684 milhões de crédito não produtivo (Nata I; Nata II; Albatros e vendas e reestruturações individuais); e através da redução de 1.277 milhões de ativos imobiliários não produtivos vendidos (Sertorius; Viriato; Albatros e vendas individuais regulares).

O valor dos ativos incluídos no CCA era em 2016 (data de referência do mecanismo) de 7,9 mil milhões e caiu 62% para 3 mil milhões em 2019.

O último ano de recurso ao CCA pode bem ser 2021, por conta das perdas do exercício de 2020. Mas o seguro de capital tem a duração até 2026, lembrou o CEO.

O presidente da instituição lembrou que a recapitalização do banco  já custou 4,5 mil milhões de euros, e confirmou o pedido de 1.037 milhões de euros ao Fundo de Resolução, que tinha sido avançado por Luís Máximo dos Santos.

António Ramalho disse que os 2,98 mil milhões de euros já pedidos, inclui “o capital necessário para o cumprimento dos rácios exigíveis”. Os 2,98 mil milhões de euros, adicionados aos 1.000 milhões obtidos no processo de venda e aos 500 milhões de euros no âmbito do processo de trocas de obrigações LME [‘Liability Management Excercise’], consistem em cerca de 4,5 mil milhões de euros, lembrou António Ramalho.

António Ramalho disse que os 2,98 mil milhões de euros até agora pedidos são “o valor mais baixo dos três agregados solicitáveis para efeitos de capitalização. Ficam aquém do valor que estava previsto nos acordos públicos realizados ente o Estado português, o Banco Central Europeu e a União Europeia, em todos os cenários aí previstos”.

Os três agregados solicitáveis são “ou o limite contratual do mecanismo, que é de 3,89 mil milhões; ou o limite das perdas que está acima dos 3,5 mil milhões de euros ou o necessário para os rácios regulamentares e regulatórios que mudam todos os anos”, adiantou. O menor destes três para efeito de capitalização “nunca é determinável” antes do fecho das contas, explicou.

As injeções do mecanismo por conta das perdas registadas nos exercícios de 2017 e 2018 somam 1.941 milhões de euros.

O  banqueiro detalhou que o Mecanismo de Capital Contingente [CCA] ao dispor do banco até 2026,  tem um teto máximo de recurso ao Fundo de Resolução bancário de 3,89 mil milhões de euros, e que cada injeção depende das circunstâncias das contas anuais do banco. “O modelo é de contingência, não é um modelo de prestações fixas. Desde a primeira hora, o nível de capitalização era inevitável”, reconheceu o CEO que não vê “nenhuma surpresa nas necessidades de capital do banco”. “Qual seria o nível de capitalização, seria um de três, ou o fixado contratualmente, ou o valor das perdas (dos 8 mil milhões de portfólio identificável à data) o que não era identificável na altura, e o valor das exigências regulatórias que ninguém consegue antecipar, senão ano a ano, é por isso que é contingente e funcionará assim até 2026”, reforçou.

António Ramalho disse que a maior preocupação da sua equipa “é a valorização dos 25% [do Fundo de Resolução] e dos 75% [da Lone Star] que fazem parte da composição acionista do banco”. Não houve surpresas na necessidade de capital, referiu. Só depois da venda (e do encaixe com essa venda) se pode tirar conclusões sobre o investimento realizado quer pelo Fundo quer pela Lone Star. “Só nessa altura se pode avaliar se o capital foi bem aplicado”, explicou.

Em 2017, no âmbito da venda de 75% do Novo Banco ao fundo norte-americano Lone Star (o Fundo de Resolução tem os restantes 25%), o Estado fez um acordo de capital contingente que prevê a recapitalização do banco pelo Fundo de Resolução (entidade da esfera do Estado gerido pelo Banco de Portugal) para cobrir falhas no capital geradas pelos ativos tóxicos com que o Novo Banco ficou do BES (crédito malparado ou imóveis).

No Orçamento do Estado para 2020, está prevista a recapitalização do Novo Banco em 600 milhões de euros este ano, mas o montante autorizado de empréstimos do Tesouro ao Fundo de Resolução ascende aos 850 milhões de euros.

O Novo Banco pagou 35 milhões de euros em 2019 para o Fundo de Resolução enquanto banco do sistema, explicou o CEO do banco.

António Ramalho disse ainda na conferência que o banco não recebeu este ano qualquer pagamento específico dos DTA (Ativos por Impostos Diferidos), mas um banco em processo de limpeza do balanço não seria capaz de absorver os créditos fiscais na sua conta de exploração futura, disse António Ramalho. “A situação fiscal este ano é uma situação positiva, por causa dos DTA passados (prejuízos fiscais anteriores). Isto explica que o resultado antes de impostos  que evoluiu de +2,2 milhões em 2018 para +175,3 milhões em 2019, se traduza numa evolução do resultado líquido recorrente de -70 milhões para 177 milhões de euros positivos em 2019”, explicou. Estes DTA não são os protegidos pelo Estado, pelo que não têm efeito em capital.

Diferendo com Fundo de Resolução vai para Tribunal Arbitral

Sobre o facto de o Novo Banco ter pedido, em 2019, para deixar o regime transitório da IFRS 9 a que aderiu em 2018 e que serviu para mitigar o impacto das imparidades no rácio de capital, Ramalho disse que “o que há é uma possibilidade de reporte regulatório, em que está em causa efeitos do IFRS 9 em termos transitórios ou não. Não tem efeito nas contas”. Os outros bancos não estão no regime transitório, mas sim no “fully loaded”, e o Novo Banco quer deixar de estar no regime transitório.

Se sair do regime transitório, isso significa a aplicação integral da IFRS 9, o que pode conduzir a um súbito aumento significativo das provisões para perdas de crédito esperadas e, por conseguinte, a uma súbita diminuição dos fundos próprios principais de nível 1 das instituições. Pelo que a saída do regime transitório pode acelerar as chamadas de capital ao mecanismo de capital contingente do Fundo de Resolução, tal como avançou o Jornal Económico.

O Expresso noticiou que havia um diferendo entre o banco e o Fundo de Resolução, que tem um valor de 200 milhões, e que acabará por ser decidido em Tribunal Arbitral. Depois de o Novo Banco ter pedido para sair do regime transitório, o Banco Central Europeu deu luz verde a essa mudança (saída do regime contabilístico transitório, que limitava o impacto do regime nos rácios de capital até 2023, para a total implementação, em que esse faseamento já não existe e o impacto é imediato). Mas o Fundo de Resolução, com 25% do banco e responsabilidade de injectar eventuais necessidades de capital, não está de acordo. Precisamente porque poderá ter custos com esta decisão.

António Ramalho confirmou a divergência com o Fundo de Resolução, e disse que “essa divergência será resolvida de acordo com o mecanismo contratual, que é o mecanismo de Tribunal Arbitral organizado, assim acontecerá”.

Os bancos da União Europeia sujeitos ao International Financial Reporting Standards (IFRS) tiveram de implementar o IFRS 9 a partir de 1 de janeiro de 2018. Uma das principais preocupações com a implementação do IFRS 9 é que este viesse a causar um aumento súbito das estimativas de perdas esperadas (Expected Credit Loss – ECL), o que provocaria uma descida abrupta e significativa dos rácios de capital regulamentares Common Equity Tier 1 (CET1) para muitos bancos da União Europeia. Em maio de 2017, a UE adotou um período de transição de cinco anos para mitigar o impacto sobre os níveis de capital regulamentar da implementação do IFRS 9.

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