O projeto “Sinais Vitais” da CIP – Confederação Empresarial de Portugal, desenvolvido em parceria com o Marketing FutureCastLab do ISCTE, sobre a situação do investimento e capitalização das empresas portuguesas – que é o quarto inquérito feito com base nas perguntas de um barómetro semanal –, foi apresentado esta segunda-feira, 25 de maio, e revela que 82,2% das empresas pretendem recorrer a instrumentos de capitalização, em vez de aumentarem o seu endividamento. “As empresas precisam de apoios a fundo perdido”, referiu ao Jornal Económico o presidente da CIP, António Saraiva, explicando, no entanto, que “as verbas a fundo perdido destinadas a recapitalizar as empresas foram da ordem dos 60 milhões de euros”, um valor que esgotou as verbas para capitalização de empresas – injetadas sem agravar dívida – sendo certo que as necessidades de capitalização das empresas são muito superiores a esse montante”.
Uma das consequências desta situação pode estar relacionada com as intenções de suspender ou cancelar totalmente todos os investimentos, que é a intenção admitida por 41,7% dos inquiridos – sobretudo nos sectores do alojamento e restauração e no comércio –, enquanto 40,3% tencionam manter parcialmente o investimento em 2020. Apenas 18% dizem que vão manter a totalidade do investimento este ano. As grandes empresas dizem que vão manter parcialmente o investimento previsto (71,7%), tal como as médias empresas (50%), enquanto as micro empresas tencionam suspender ou cancelar o investimento (51,9%) e as pequenas empresas também suspendem ou cancelam (42,4%).
Entre as 40% que vão manter parcialmente o investimento em 2020, 84% das empresas procurará garantir até 60% dos investimentos previstos antes da crise da Covid-19. Só 1,8% das empresas pretendem manter entre 81% e 99% do investimento previsto, adianta o barómetros CIP/ISCTE. Na avaliação dos fatores dominantes para a decisão de adiar ou cancelar o investimento em 2020, 55% devem-se à redução de encomendas, 52% devem-se às perspetivas económicas negativas, 27% às escassez de capitais próprios e 25% à impossibilidade de financiamento, revela o barómetro.
Necessidades aumentam para 10,5 mil milhões de euros
Neste contexto, o presidente da CIP adiantou que o valor necessário às empresas, relativo às propostas apresentadas para se candidatarem às linhas de apoio governamentais dotadas com 6,2 mil milhões de euros, já ultrapassa os 10,5 mil milhões de euros, quando neste momento já foram praticamente aprovadas candidaturas no valor de 6,1 mil milhões de euros, que praticamente esgotam a dotação total, sabendo-se que apenas estão contratualizados pedidos no montante de 3,1 mil milhões de euros.
Entre os instrumentos de apoio pretendidos pelas empresas – podiam escolher até três instrumentos de apoio, designadamente, a fundo perdido, de capital de risco e instrumentos de quase-capital –, 82,2% são instrumentos de capitalização, seguindo-se os benefícios fiscais ao investimento pretendidos por 62% das empresas, o reforço de linhas de crédito para 35,3% das empresas, o aumento da procura para 25,9% e o relançamento do investimento público, pretendido por 23,1% das empresas inquiridas pela CIP.
“Governo avaliou mal todo este processo”
“Todo este processo foi mal avaliado pelo Governo; as necessidades de verbas foram insuficientemente calculadas, começando nos 100 milhões de euros para aumentarem, em fatias sucessivas, até aos 6,2 mil milhões de euros revelando uma completa falta de perceção da dimensão dos apoios a conceder; foi bloqueado pela burocracia excessiva, atendendo a que cada processo tem cerca de 100 páginas; as necessidades de cada um das empresas não tinham sido identificadas e calculadas com rigor, pois envolvem apoios entre 20 e 30 milhões de euros por empresa; e as garantias não foram agilizadas para poderem salvaguardar os postos de trabalho, que era a sua função principal”, acusa o presidente da CIP.
O problema do acesso aos apoios organizados pelo Governo é que, desde logo, limitaram muitas empresas de recorrerem a estes mecanismos, porque todas as que tinham algumas dívidas ao fisco ou à segurança social ficaram à margem de acederem a estas verbas, refere António Saraiva.
Além disso, como as candidaturas exigem processos com alguma complexidade, foram entregues a gabinetes de contabilidade que não têm capacidade de resposta imediata para tratarem destes formulários, sabendo-se que a maior parte dos gabinetes de contabilidade têm muito trabalho recorrente, o que levaria a atrasos na entrega de candidaturas.
Além disso, “os empresários sabem que precisam de recorrer às ajudas financeiras, mas quando começam a ter uma perceção nítida de que vão contrair dívidas que serão somadas às suas atuais dívidas, aí retraem-se e muitas vezes desistem”, comentou António Saraiva, esclarecendo que o que as empresas portuguesas precisam nesta conjuntura de mercado “são os apoios a fundo perdido”.
“Subsídios de desemprego também, vão a impostos”
De resto, “os pagamentos dos subsídios de desemprego também vão a impostos, tal como a quebra de receitas fiscais decorrente das empresas que vão à falência também reduz a fonte de receitas do Estado, agravando ainda a confiança dos consumidores, sem eliminar o medo que se instala entre os trabalhadores desempregados”, considera António Saraiva.
Por isso, o presidente da CIP considera “decisivo para empresas nacionais conseguirem dinheiro para se recapitalizarem e poderem investir sem somarem nova dívida à dívida que já têm, de forma a continuarem a exportar produtos fabricados em Portugal, porque 44% do PIB português é assegurado por exportações”.
O Governo apresentará em breve o fundo com capacidade para satisfazer as necessidades das empresas, que não deverá ser inferior à proposta de três mil milhões de euros feita pela CIP, mas que deverá responder ao tipo de apoio para capitalização que não se traduza num agravamento dos encargos das empresas, porque se o fundo for construído por mecanismos que não satisfaçam as necessidades empresariais, certamente que os empresários não vão estar interessados nele”, referiu o presidente da CIP, António Saraiva, em resposta ao Jornal Económico.
O universo deste estudo quantitativo dirigido a decisores empresariais com resposta online, da responsabilidade da CIP/ISCTE, envolve 150 mil empresas, a amostra foi de 1.034 empresas e o erro máximo da amostra é de aproximadamente 3,05%.
A repartição da amostra revela maior peso do sector da indústria e energia, com 46%, seguindo-se o grupo de empresas dos outros serviços com 22% e o comércio, responsável por 13%. A amostra é constituída em 80% por micro e pequenas empresas, sendo 42% micro empresas e 38% pequenas empresas. As grandes empresas são 4%, enquanto 16% são médias empresas.
80% das empresas dizem que “programas do Estado estão aquém do que necessitam”
Também 80% das empresas inquiridas na semana de 18 de maio consideram que os programas de apoio do Estado estão aquém (ou muito aquém) do que necessitam (57% dizem que estão aquém do que é preciso e 23% dizem que estão muito aquém do que é preciso). Apenas 1% dizem que superam as expectativas e 19% dizem que estão à altura das dificuldades.
O número de empresas que já pediu financiamento bancário aumentou face à semana passada, crescendo de 38% em 11 de maio para 42% em 18 de maio. O número de empresas que não pediu mas pensa vir a pedir mantêm-se nos 16% e o número de empresas que não pediu nem pensa vir a pedir diminuiu de 46% em 11 de maio para 42% em 18 de maio. No entanto, 68,8% dos inquiridos dizem que ainda não receberam o financiamento bancário, enquanto 31,2% dizem que já receberam o financiamento bancário.
Por outro lado, o número de empresas que já pediu lay-off simplificado reduziu-se ligeiramente em relação à semana passada, caindo de 43% para 41%, enquanto 52% das empresas inquiridas não pensa pedir lay-off simplificado e 7% dizem que não pediram mas pensam vir a pedir.
56% consideram medidas da UE pouco ou nada adequadas
Quanto aos apoios da União Europeia para a retoma económica, 56% dos responsáveis das empresas considera que as medidas da UE são pouco ou nada adequadas, enquanto 39% das empresas consideram os apoios razoavelmente adequados e 5% dizem que são adequados. As empresas em funcionamento total ou parcial aumentaram 4 pontos percentuais em relação à semana anterior – passaram de 53% para 56% em pleno funcionamento e de 37% para 38% no caso das que estão parcialmente encerradas. As empresas encerradas baixaram de 10% para 6%.
As empresas previam investir principalmente em aumento da capacidade produtiva (foi a resposta dada por 25,7% dos inquiridos), em instalações (16,1%), inovação de produtos e processos (13,9%) e tecnologias digitais (11,9%). Ainda não tinham investimentos programados 20,1% dos inquiridos (para 2020).
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