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Audição parlamentar ao governador do Banco de Portugal sobre EuroBic foi “muito pouco esclarecedora”, diz Mariana Mortágua

A deputada do Bloco de Esquerda disse que ficaram por perceber certos pontos relativos ao EuroBic, nomeadamente a falta de informação sobre as consequências de uma inspeção que o Banco de Portugal realizou àquela instituição financeira em 2015 e sobre como é feito o registo de bancos em Portugal ligados a Angola.
5 Março 2020, 07h55

“Foi muito pouco esclarecedora”, eis a reação da deputada do Bloco de Esquerda (BE), Mariana Mortágua, à audição do governador do Banco de Portugal (BdP), Carlos Costa, na Comissão de Orçamento e Finanças, sobre o EuroBic, que se realizou esta quarta-feira.

Para a deputada, ficou por perceber a atuação do supervisor bancário no EuroBic “ao longo de todos estes anos”. “Sabemos que houve uma inspeção em 2015 – é tarde mas existiu – onde foram descobertos problemas de controlo de branqueamento de capitais. Sabemos que há um processo de contra-ordenação que foi iniciado pelo Banco de Portugal, mas depois não compreendemos quais é que foram as consequências, se há responsáveis, se há acusações, se há multas. Não há nenhuma informação sobre a consequência desse processo”, frisou Mariana Mortágua, ao Jornal Económico, depois da audição ao governador do BdP.

Carlos Costa disse aos deputados que, na sequência de uma inspeção sobre sistema de prevenção do branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo (BCFT) no EuroBic pelo BdP, em 2015, foi instaurado “um processo de contraordenação”, além de terem sido emitidas “de imediato um conjunto de 52 determinações específicas e 6 recomendações destinadas a reforçar os mecanismos de prevenção do BCFT daquela instituição”.

Além disso, o BdP determinou a realização de uma auditora externa, realizada por uma entidade independente, para apurar se o EuroBic estava a dar cumprimento às medidas impostas pelo supervisor da banca.

Mariana Mortágua referiu que desta inspeção resultou a identificação de “falhas” no EuroBic, não compreendendo, depois, como é o BdP entendeu como “normais” determinadas operações financeiras em que o banco liderado por Teixeiras dos Santos participou e que foram reveladas no âmbito do Luanda Leaks.

A deputada do BE referia-se à transferência de 115 milhões de dólares da petrolífera estatal angolana, a Sonangol, para uma empresa offshore sediada no Dubai, entre maio e novembro de 2017, quando Isabel dos Santos estava no último terço de mandato da empresa angolana. Isabel dos Santos é a acionista maioritária do EuroBic, detendo uma participação de 42,5% do banco.

“Não se compreende – e o senhor governador não conseguiu explicar isso – como é que depois de se terem identificado as falhas em 2015, que incluem o não controlo de transferências, o não controlo de pessoas politicamente expostas, depois de o Banco de Portugal saber que havia um problema de conflitos de interesses entre Isabel dos Santos administradora e Isabel dos Santos acionista, o EuroBic faz transferências de dinheiro para uma entidade no Dubai com características muito duvidosas, com faturas emitidas no próprio dia, com diretores que eram diretores de empresas de Isabel dos Santos. Não entendemos como é que o Banco de Portugal entende que estas operações são normais quando estava identificado que havia ali um ponto sensível”, realçou Mariana Mortágua.

O problema vai mais além da idoneidade dos acionistas do EuroBic

Na sua intervenção inicial na audição, Mariana Mortágua disse que “Portugal foi um ponto de lavagem de dinheiro da cleptocracia angolana”, um contexto que pode suscitar dúvidas não apenas quanto à idoneidade de acionistas e administradores de instituições financeiras ligadas a Angola, mas também sobre o registo destas entidades em Portugal.

“O problema vai mais além da idoneidade dos administradores. Tem a ver com o próprio registo destes bancos”, vincou a bloquista. “Nós estamos com um conjunto de pessoas que têm vindo a registar bancos em Portugal na altura em que a economia angolana começou a dar problemas. E isto diz respeito ao EuroBic, como diz respeito ao BNI, como diz respeito ao Atlântico”.

No caso do BNI, Mariana Mortágua lembrou a não comunicação ao BdP do investidor José Guilherme, incluído num grupo de seis investidores que ficaram ocultos na altura ao supervisor bancário, que efetuou uma transferência através de uma conta na Caixa Geral de Depósitos para participar no capital do BNI Europa, filial do angolano BNI.

“No caso do BNI, ficámos a saber que houve acionistas que não foram comunicados ao Banco de Portugal, e entre eles estava o construtor José Guilherme, que está envolvido em tudo quanto é escândalo neste país. O Banco de Portugal soube desta ocultação e ainda assim permitiu o registo do BNI. Hoje o BNI está envolvido no escândalo do Montepio porque se desconfia que tenha havido um problema na capitalização do BNI com crédito do Montepio. Por isso, para nós não é muito claro como é que estes registos foram feitos e como é que o Banco de Portugal autorizou estes registos”, salientou.

A deputada referia-se às buscas que a Polícia Judiciária realizou este ano no Banco Montepio e no BNI Europa no âmbito de uma investigação sobre o aumento de capital do Banco Montepio, em 2013, a constituição do capital social do BNI Europa e a origem do dinheiro usado por um grupo de clientes para a aquisição de unidades de participação do fundo.

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