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Autarcas pedem mais autonomia e apoios para enfrentar Covid-19

Flexibilização do regime de ajuste direto e fundo de solidariedade são reivindicações das câmaras para enfrentar Covid-19. Necessidade de reforçar poder local é vista como “ensinamento” da pandemia.
11 Abril 2020, 12h00

As câmaras municipais reclamam medidas urgentes para agilizarem o apoio às famílias, instituições e empresas locais numa altura de emergência económica e social. Chamando a si o estatuto de “face mais visível do Estado para as populações”, os autarcas pedem ao Governo uma flexibilização da contratação pública e novas regras de ajuste direto bem como a criação de linhas de crédito para as empresas municipais e notam que, em alguns casos, as autarquias têm tomado a dianteira ao Governo no combate à pandemia.

Para a Associação dos Autarcas Social Democratas (ASD), “um dos grandes ensinamentos que esta pandemia poderá trazer” é que “as autarquias têm capacidade de avançar de forma célere e substituir o Estado central”. O presidente da comissão política dos ASD, Hélder Sousa Silva, diz ao JE que “o pacote legislativo tem dado primazia ao mundo civil e empresarial” e que a força autárquica tem sido “esquecida” no combate à Covid-19, o que obrigou as câmaras a tornarem avançarem com medidas concretas para responder aos problemas locais urgentes.

Hélder Sousa Silva exige, no entanto, “soluções coordenadas e estruturais” a nível nacional.

Entre as propostas que vai apresentar ao Governo estão a flexibilização da contratação pública e dos ajustes diretos, que permitem às câmaras convidar diretamente uma entidade a apresentar uma proposta para determinado projeto. Segundo o líder dos ASD, o limite de 50 mil euros dos contratos celebrados por ajuste direto (desce para 30 mil no caso de obras públicas e para 20 mil na aquisição de bens e serviços ou locação de bens móveis) são “restritivos” e não se coadunam com os preços de aquisição de equipamentos de proteção individual, testes e de outros materiais necessário ao combate ao novo coronavírus. Rejeita, no entanto, que a proposta sirva para aproveitamento político na “compra de outras coisas pelo meio”.

O também autarca de Mafra sugere ainda que sejam criadas linhas de crédito “com juro zero” para municípios que têm “compromissos inadiáveis, como a recolha de resíduos, e vão ter de desviar agora verbas para isso. Hélder Sousa Silva defende ainda que tal crédito “não deve relevar para o endividamento municipal, desde que devidamente justificado”. Considera ainda que as atuais linhas de crédito devem abranger também as empresas municipais porque, “para bem da economia local e nacional, há investimentos públicos que devem continuar”.

Um pedido unânime
Também o líder da Associação Nacional de Autarcas do PS, Rui Santos, não poupa críticas ao Governo e diz que, até agora, não houve “nada de substancial” aprovado para apoiar as autarquias no combate à Covid-19. O autarca de Vila Real concorda que o combate à pandemia vai mostrar que o poder local é crucial no apoio de proximidade às famílias e que “cada euro investido em quem está no terreno vale por quatro”. Sugere, por isso, a implementação de uma medida semelhante à adotada pelo Estado italiano, que desbloqueou 4.300 milhões de euros de um fundo de solidariedade para os municípios. “Esta medida deveria ser adaptada à nossa escala”, diz ao JE.

Rui Santos confessa estar “incomodado” com o facto de os municípios que se antecipam ao Estado central na compra de material de proteção e prevenção da Covid-19 estarem a pagar IVA e taxas alfandegárias, o que, segundo ele, seria uma questão relativamente fácil de o Governo resolver. Rui Santos diz ainda que apoia “todos os mecanismos que permitam uma autonomia responsável”, incluindo novas regras de contratação e ajuste direto. Tudo isso, ressalva, numa lógica de “máxima de confiança, máxima responsabilidade”.

O coordenador autárquico do CDS-PP, Fernando Barbosa, defende que deve ser assegurado o apoio àqueles que estão na linha da frente do combate à pandemia, como médicos e enfermeiros, e sugere ao Governo que “autorize as câmaras a fornecer-lhes o equipamento necessário”. Para isso, indica, a despesa deve ser justificada e o Governo deve assumi-la a posteriori. Pede também ao Executivo que “autorize as câmaras a facilitar o pagamento do IMI das famílias” e permita a isenção de IVA.

Fernando Barbosa aprova ainda uma maior flexibilização dos contratos públicos e do ajuste direto, com a possibilidade de serem ultrapassados plafonds estabelecidos por lei, mas sublinha que tal deve servir para situações específicas, como “a compra de medicamentos, máscaras, viseiras, testes e outros equipamentos de combate à Covid-19”, a fim de evitar “aproveitamentos” por parte das autarquias. Os autarcas democratas-cristãos pedem ainda um reforço dos apoios sociais, sobretudo na educação, para que as câmaras possam dotar os alunos do material necessário para o ensino à distância.

O JE contactou os autarcas do PCP, mas não obteve resposta até ao fecho da edição. Os comunistas têm defendido a necessidade de reforçar apoios aos municípios e esta quarta-feira sugeriram que os empréstimos de curto prazo aprovados esta semana no Parlamento deven ter prazo de amortização de até 12 meses, e não até ao final do ano civil de 2020. O PCP quer ainda que este ano “seja excluída a aplicação do princípio do equilíbrio orçamental” previsto na Lei das Finanças Locais.

Despesa extra com Covid-19
Esta semana foi também publicada em Diário da República uma lei que permite às autarquias colocar fora dos limites de endividamento, previstos na Lei das Finanças Locais, as despesas com o combate à Covid-19. A lei abrange municípios sujeitos a programas de ajustamento municipal ou de recuperação e tem efeito a 12 de março, dez dias após o primeiro caso de infeção de Covid-19 em Portugal.

São aprovadas despesas das autarquias no combate à pandemia como a isenção ou aplicação de descontos nas tarifas da água e saneamento, isenção de juros de mora nos pagamentos em atraso, criação ou reforço dos fundos sociais de emergência, alteração dos prazos ou concessão de isenções temporárias de cobrança de taxas, apoio ao setor social e solidário e pessoas mais vulneráveis, reforço da higienização dos transportes coletivos, bem como estacionamento gratuito, criação de condições para o ensino à distância e novos prazos de pagamento das rendas mensais de habitação social.

As medidas aplicam-se a todos os municípios até 30 de junho, incluindo os 13 que estão em situação de desequilíbrio financeiro, através de programas de ajustamento municipal: Alandroal, Alfândega da Fé, Aveiro, Cartaxo, Fornos de Algodres, Fundão, Nazaré, Nordeste, Paços de Ferreira, Portimão, Vila Franca do Campo, Vila Nova de Poiares e Vila Real de Santo António.

Artigo publicado no Jornal Económico de 09-04-2020. Para ler a edição completa, aceda aqui ao JE Leitor

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