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Banco de Portugal, mais pessimista que o Governo, vê recessão de 9,5% este ano

A projeção compara com a recessão de 6,9% que o Governo apresentou no Orçamento Suplementar. Num cenário mais adverso, com uma segunda vaga da epidemia a causar novas medidas rigorosas, a recessão poderá atingir os 13,1%, alerta o banco central.
16 Junho 2020, 13h00

O impacto negativo muito acentuado da pandemia de Covid-19 na economia portuguesa deverá levar a uma recessão de 9,5% este ano, mas num cenário mais severo de uma segunda vaga de infeções a nível nacional e global com nova medidas de contenção rigorosa a contração poderá atingir os 13,1%, segundo as projeções divulgadas pelo Banco de Portugal esta terça-feira.

“A redução projetada para o Produto Interno Bruto (PIB) em 2020 é muito significativa, excedendo largamente as quedas observadas nas recessões mais recentes, sendo necessário recuar aos anos 20 do século passado para encontrar uma queda desta magnitude”, sublinhou a instituição governada por Carlos Costa.

“Em 2020, a economia portuguesa deverá contrair-se de forma muito acentuada, num contexto de reduções do PIB mundial e do comércio internacional apenas comparáveis às registadas na Grande Depressão de 1929”, referiu, no Boletim Económico. “As projeções apontam para uma diminuição do PIB de 9,5% em 2020, refletindo um impacto negativo muito acentuado da pandemia durante o primeiro semestre”.

O banco central recordou que no primeiro trimestre de 2020, o PIB reduziu-se 3,8% face ao trimestre anterior, a maior queda desde que existem séries trimestrais para a economia portuguesa. No segundo trimestre de 2020, mais afetado pela pandemia e pelo impacto das respetivas medidas de contenção, a taxa de variação em cadeia da atividade deverá diminuir numa magnitude sem precedente histórico. Embora rodeada de elevada incerteza, estima-se que esta redução possa atingir um valor em torno de 15%.”

Adiantou que o gradual levantamento das medidas de contenção, num contexto de relativo controlo da pandemia, deverá traduzir-se numa retoma da atividade económica a partir do terceiro trimestre de 2020.

“As atuais projeções implicam uma recuperação relativamente mais rápida do que a observada na sequência da recessão de 2011-13”, vincou o banco central.

Assim, projeta-se que o PIB cresça 5,2% em 2021 (face aos 4,3% estimados pelo Governo) e 3,8% em 2022. No final do horizonte de projeção, a atividade deverá situar-se num nível próximo do registado em 2019, mas consideravelmente abaixo do esperado antes da pandemia.

“Esta recuperação caracteriza-se por uma retoma mais célere do investimento – assumindo que as medidas de política adotadas limitam o impacto da crise sobre o tecido empresarial e que o investimento público se mantém relativamente dinâmico”,  acrescentou.

Em contraste, a recuperação esperada das exportações é mais lenta do que a observada na sequência das recessões anteriores, “o que reflete as tensões comerciais existentes e, sobretudo, o comportamento das exportações de turismo, cujo peso aumentou significativamente nos últimos anos e que deverão ser particularmente afetadas e de forma persistente pela crise pandémica”.

No Boletim Económico de março, o Banco de Portugal projetava uma recessão de 3,7% este ano no cenário base, antes de crescer 0,7% em 2021 e 3,1% em 2022.

Exportações podem cair 25,3% 

Nas projeções apresentadas esta terça-feira, o Banco de Portugal estima uuma redução de 8,9% do consumo privado em 2020, mais acentuada do que a quebra do rendimento disponível real, e à qual deverão seguir-se crescimentos de 7,7% em 2021 e de 3,0% em 2022.

A taxa de poupança deverá aumentar substancialmente em 2020, “refletindo a dificuldade de consumir alguns bens e serviços durante o estado de emergência e a elevada incerteza prevalecente”.

O banco central estima que o consumo público aumente 0,6% em termos reais em 2020, em resultado do efeito conjugado de uma maior despesa em saúde pública no contexto da crise pandémica e da diminuição da atividade das administrações públicas, relacionada com uma redução do número de horas trabalhadas.

O investimento deverá recuperar mais rapidamente do que em ciclos anteriores, após uma queda significativa em 2020, embora seja esperado que, em 2022, permaneça aquém dos níveis registados em 2019. A formação bruta de capital fixo (FBCF) deverá reduzir-se 11,1% em 2020, refletindo a queda acentuada da componente empresarial, e crescer 5,0% em 2021 e 4,5% em 2022.

Nas exportações de bens e serviços o Banco de Portugal prevê um de 25,3% em 2020, seguida por crescimentos de 11,5% em 2021 e de 11,2% em 2022, que serão insuficientes para recuperar o nível registado em 2019.

“A queda nas exportações reflete, sobretudo, uma descida muito acentuada das exportações de serviços associados ao turismo, com efeitos persistentes até ao final do horizonte de projeção”, salientou, explicando que as importações de bens e serviços deverão apresentar uma trajetória relativamente similar à das exportações.

A capacidade de financiamento da economia, medida pelo saldo conjunto da balança corrente e de capital, deverá reduzir-se para 0,3% do PIB em 2020 e assim permanecer nos dois anos seguintes. Em 2020, a balança de bens e serviços deverá ser deficitária, o que acontece pela primeira vez desde 2011, refletindo uma redução do excedente da balança de serviços, associada sobretudo à queda das exportações de turismo.

Cenário adverso: segunda vaga e insolvências

O Banco de Portugal salientou que as projeções económicas apresentadas no Boletim estão rodeadas de um elevado grau de incerteza. A principal fonte dessa incerteza diz respeito à evolução da pandemia e ao alcance das medidas necessárias para a sua contenção, em termos de duração, restritividade e composição sectorial, bem como do seu impacto no curto e médio prazo adiantou.

“A materialização de um cenário mais adverso relativamente à propagação do vírus – em Portugal e no resto do mundo – é um risco cujas potenciais consequências sobre a economia portuguesa importa avaliar”, vincou.

O banco central explicou que o cenário mais severo assume que ocorre uma segunda vaga de infeções a nível global, que obriga à reintrodução de medidas de contenção rigorosas, incluindo a possibilidade de um novo período de confinamento geral. As medidas para conter esta segunda vaga do vírus implicariam novas perdas significativas da atividade nos diversos setores da economia, ainda que eventualmente menores do que as observadas no período recente de estado de emergência.

O cenário engloba também um enquadramento externo mais desfavorável, assumindo que as medidas de contenção se mantêm por mais tempo ou são reintroduzidas na generalidade dos países devido a uma escalada nas infeções. Tal implica um impacto mais negativo sobre a atividade mundial e sobre os fluxos de comércio internacional.

Na área do euro, que concentra os principais parceiros comerciais de Portugal, a redução do PIB em 2020 atinge 12,6% (o compara com uma queda de 8,7% nas projeções centrais do Eurosistema)

O banco central frisou que neste cenário adverso, após estas fortes paragens da atividade e a recessão de 13,1%, a recuperação tenderá a ocorrer de forma mais contida comparativamente ao assumido nas projeções base, com o crescimento limitado a 1,7% em 2021 e 3,5% em 2022.

“As medidas, bem como a elevada incerteza e insegurança, mantêm-se por um período mais prolongado, afetando os processos de produção, as decisões de investimento e os padrões de consumo”, adiantou.

“Tal implica que mais empresas serão obrigadas a encerrar definitivamente e num contexto de elevados níveis de endividamento público e privado, este cenário mais severo prevê ainda que o aumento das insolvências tenha um impacto adverso sobre os custos de financiamento dos agentes económicos, apenas parcialmente mitigado pelas medidas de política”, concluiu.

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