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Brasil: Evolução da economia assusta investidores estrangeiros

A proposta dos economistas liberais é clara: o Brasil tem de seguir os passos do ‘milagroso’ Javier Milei, presidente da Argentina. Cortes nos gastos sociais é o primeiro mandamento.
Ueslei Marcelino/Reuters
9 Janeiro 2025, 10h18

As duas grandes potências da América do Sul, Argentina e Brasil, estão a enfrentar situações económicas completamente opostas. Segundo a análise do jornal espanhol ‘El Economista’, de um lado, está a Argentina, onde os cortes nos gastos públicos levaram o país a desfrutar de 11 superávites fiscais consecutivos, estabilizando o peso, reduzindo a taxa de juros paga pela dívida argentina e eliminando o risco de insolvência – sem recordar que mais de 50% da população foi subitamente transferida para o lado negro do índice de pobreza. Do outro lado, está o Brasil, onde o défice público disparou, a taxa de câmbio do real disparou para mínimos históricos em relação ao dólar e os juros pagos sobre a dívida não pararam de subir (14% atualmente, em comparação com os 10% há menos do que há um ano). “A falta de controlo das finanças públicas do governo de Lula da Silva diante da extrema austeridade de Javier Milei parece estar por trás deste fenómeno que põe em risco a economia brasileira”.

O ‘El Economista’ escuda-se numa reportagem do homónimo britânico ‘The Economist’, que terá estado na Argentina para descobrir as virtudes economicistas do homem que, quando fez campanha para as presidenciais, era apontado como um bizarro economista de ideias ortodoxas, populista e perigosamente seguidor de Donald Trump. Agora, uns meses depois e muitos milhares de despedimentos mais tarde, Javier Milei é apresentado como uma espécie de mago cuja determinação verga qualquer índice económico mais rebelde.

“O real brasileiro tem um título ignominioso este ano: é a moeda com pior desempenho, caindo mais de 20% para uma baixa histórica de quase 6,3 reais por dólar (ou 0,163 dólares por real). A situação tornou-se ainda pior nas últimas semanas, com a liquidação acelerando apesar de várias intervenções do banco central”, explicou a jornal britânico citado pelo espanhol.

Segundo o primeiro, “Em novembro, o governo de Lula da Silva anunciou um programa há muito aguardado para conter os gastos, incluindo tetos para os rendimentos dos trabalhadores do setor público. Ao mesmo tempo, no entanto, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, prometeu cortes de impostos abrangentes para trabalhadores de baixos e médios salários. Os investidores interpretaram o anúncio como evidência de compromisso insuficiente com a disciplina fiscal. Dado o défice orçamentário do Brasil de quase 10% do PIB e a dívida bruta de quase 90% do PIB, o nervosismo é compreensível”.

O défice a 12 meses das contas públicas do Brasil aumentou em novembro para 9,5% do PIB, informou o Banco Central na semana passada. O défice fiscal do Brasil acumulado nos onze primeiros meses de 2024 subiu para o equivalente a 8,54% do PIB, um ponto acima do registado no mesmo período de 2023. O défice fiscal dobrou durante os dois anos do mandato de Lula da Silva, passando de 4,57% do PIB no final de 2022 para 9,5% do PIB atualmente, devido ao aumento dos gastos públicos, principalmente em programas sociais.

A previsão é que a maior economia da América Latina termine 2024 com défice próximo de 10%. O desequilíbrio nas contas públicas obrigou o governo Lula a anunciar este mês um pacote de ajuste fiscal com o qual espera uma economia de 71 mil milhões de reais (cerca de 10 milhões de euros) nos próximos dois anos.

Em meados de dezembro, o banco central vendeu mais de três mil milhões de dólares em reservas cambiais numa tentativa fracassada de sustentar o real. Também aumentou drasticamente as taxas de juros três vezes desde setembro, incluindo um aumento inesperado de um ponto percentual em 11 de dezembro. Embora muitos bancos centrais de mercados emergentes tenham começado a cortar as taxas, seguindo o exemplo do Reserva Federal norte-americana, os investidores esperam mais aperto monetário no Brasil no próximo ano. Os títulos do Estado a dois anos rendem agora a um nível próximo a 15%, ante pouco menos de 10% no final de 2023. No caso da Argentina, observou-se uma queda acentuada do risco-país, consequência da diminuição dos juros pagos pelos títulos soberanos argentinos, que caíram para níveis próximos a 10%.

Enquanto na Argentina as reservas brutas em dólares estão a crescer, no Brasil está a acontecer o contrário. O saldo do fluxo de dólares no Brasil em dezembro passado foi negativo em 24,314 mil milhões de dólares, com o qual o país sofreu a maior fuga de divisas num mês desde que começou a medir o indicador em 2008. Apesar de em dezembro 1.728 milhões de dólares terem entrado no Brasil por meio de transações comerciais, os investidores retiraram do país 26.042 milhões de dólares em recursos que estavam no mercado de ações ou em títulos financeiros. Resultado: se o Brasil não começar a cortar gastos do setor público, o real continuará a depreciar, enquanto se o banco central continuar a aumentar as taxas de juros para tentar estancar a sangria, a economia acabará por contrair.

 

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