Um humorístico lugar-comum do século XVIII afirma que “a história é uma velhota que se repete sem cessar” e, passados 300 anos, os tempos atuais parecem querer dar-lhe razão, em particular com a vitória de Donald Trump, do Brexit e com o crescimento assustador dos partidos xenófobos e populistas na Europa.
Quem recorda este aforismo setecentista é um dos maiores escritores portugueses, Eça de Queiroz, logo na abertura de “Cartas de Inglaterra”, coletânea de crónicas escritas há mais de um século em Inglaterra, onde o autor viveu entre 1874 e 1878, após dois anos como cônsul em Havana – cargo que viria a ocupar também naquele país, primeiro em Newcastle e depois em Bristol.
Estas crónicas, publicadas no Diário de Notícias, no jornal portuense A Actualidade e, mais tarde, no brasileiro Gazeta de Notícias, resultam em parte das viagens que realizou, em particular no Médio Oriente, num périplo de seis semanas pela Palestina, Síria e Egipto, onde assistiu à inauguração do Canal de Suez. Mas encontramos também crónicas sobre o Afeganistão, onde a análise da intervenção inglesa em 1847 poderia ter sido copiada para registar a invasão norte-americana do país, em 2001; e sobre a Irlanda e o seu sistema semifeudal de propriedade, que serviu de explicação para muitos dos seus males até à independência.
E, claro, como não podia deixar de ser, sobre a Inglaterra e os ingleses, como se pode antever pelo título do livro. Diz Eça: “A verdade é que o inglês não se diverte no continente: não compreende as línguas, estranha as comidas; tudo o que é estrangeiro, maneiras, toilettes, modos de pensar, o choca”.
Eça lembra também a especificidade da celebração do Natal em Inglaterra que, por influência do príncipe Alberto, marido da rainha Vitória, se tinha tornado uma festa familiar, contrastando com os países católicos onde o 25 de Dezembro era apenas uma festividade importante do calendário litúrgico, sem nenhuma outra conotação que não fosse a religiosa. E faz igualmente referência a artigos do jornal Time, em que é manifesto o desdém europeu por Portugal e o espanto pela dimensão do antigo império português.
Aquele que é considerado o primeiro e principal escritor realista português nasceu na Póvoa do Varzim há quase 171 anos, a 25 de Novembro de 1845, foi também um renovador profundo e perspicaz da nossa prosa literária. Morreu a 16 de Agosto de 1900, em Paris.
“Cartas de Inglaterra” é editado pela Alêtheia.
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