As alterações legislativas ao diploma que estabelece a compensação à EDP pelo fim antecipado dos CAE foram ‘desenhadas’ entre o Ministério da Economia, a sociedade de advogados Morais Leitão e a sede da elétrica, segundo a acusação do Ministério Público.
Segundo a acusação do processo EDP/CMEC a que a Lusa teve acesso, a EDP teve oportunidade de aceder aos projetos de diplomas em que os três arguidos – Miguel Barreto, João Conceição e Rui Cartaxo (à data diretor geral de Energia e os dois assessores do Ministério da Economia) – e, mais, a EDP “conseguiu condicionar, através em especial do advogado Rui Oliveira Neves, todo o processo legislativo”.
“A sociedade de advogados Morais Leitão, em especial o seu advogado Rui Oliveira Neves, que tinha como cliente a EDP, era usada por ordem dos arguidos António Mexia, João Manso Neto e Manuel Pinho como assessora jurídica do Ministério da Economia, […] o que facilitou a execução do pacto corruptivo desses três arguidos e dos restantes três, Miguel Barreto, João Conceição e Rui Cartaxo”.
O Ministério Público (MP) reúne na acusação, com mais de 1.000 páginas, a troca de ‘emails’ entre a rua da Horta Seca, o Marques de Pombal – à época a sede da EDP – e o advogado Rui Oliveira Neves com as sucessivas propostas de alteração ao decreto-lei n.º 240/2004, que determina a cessação antecipada dos contratos de aquisição de energia (CAE) e enquadra a atribuição do direito a compensação do regime que lhe sucede, os Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC).
Nesses ‘emails’ são ‘afinadas’ as propostas legislativas que depois são enviadas para a Presidência do Conselho de Ministros, para aprovação pelo Governo, e preparada a argumentação sobre as modificações legislativas, nomeadamente para tentar convencer a Comissão Europeia, que conclui que os CMEC incluem auxílios de Estado.
Até à sua efetiva entrada em vigor, em 01 de julho de 2007, foram feitas alterações ao diploma – em maio e julho de 2007 -, já com Manuel Pinho como ministro da Economia (desde 12 de março de 2005), com a tutela da Energia, e com António Mexia como presidente executivo da EDP e João Manso Neto como administrador da Comissão Executiva.
De acordo com a agenda do ministro Manuel Pinho, em setembro de 2005, reuniu-se na Horta Seca com António Mexia para delinear a substituição de João Talone, que tinha manifestado vontade de continuar na liderança da EDP. Ao todo, durante o mandato de Manuel Pinho, contam-se mais de “80 reuniões, a título oficial, com António Mexia”, das quais 52 foram a sós, e muitas delas à mesa, ao almoço.
Ainda antes da eleição de Mexia como CEO da elétrica, o gestor e o governante acordam que João Conceição, da consulta BCG, prestaria apoio ao gabinete do Ministério da Economia, “sendo os respetivos encargos suportados pela EDP, o que permitiria executar da melhor forma o pacto firmado entre ambos”.
Catorze dias após a eleição de António Mexia, o que aconteceu em 30 de março de 2006, chega ao Ministério da Economia Rui Cartaxo para adjunto de Manuel Pinho. Antes, tinha integrado o Conselho de Administração da Gás de Portugal e da Petrogal com o novo líder da EDP.
“Durante todo o tempo em que os arguidos António Mexia e João Manso Neto foram administradores da EDP e os arguidos Manuel Pinho, Miguel Barreto, Rui Cartaxo e João Conceição exerceram funções públicas, a EDP conseguiu, por ordem dos dois primeiros e sob a capa de uma ‘mera’ colaboração com o Governo e a Administração Pública, influenciar indevidamente em seu benefício diversa legislação que foi sendo produzida e diversos despachos que foram sendo emitidos”, entende a acusação do MP.
O novo regime não “assegura o equilíbrio económico”, sendo que “o aumento dos valores dos CAE efetuou-se em benefício dos produtores de energia elétrica em contrapartida do prejuízo dos consumidores” de eletricidade e do Estado, estimando mil milhões de euros de prejuízo.
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