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Catalunha em estado de sítio

Tal como se esperava: a notícia das penas de prisão impostas aos independentistas que estavam a ser julgados em Madrid reacenderam os protestos na Catalunha. A poucas semanas das eleições, Pedro Sánchez pode ter o seu futuro político entalado nas portas de entrada do Aeroporto de Barcelona.
15 Outubro 2019, 07h40

A todo o instante alastra a onda de violência que se abateu sobre a Catalunha depois de conhecidas as duras penas de prisão que o Supremo Tribunal espanhol decretou a nove dos doze arguidos no caso dos independentistas que estiveram por trás do referendo à independência – que o governo de Madrid, então liderado pelo popular Mariano Rajoy considerou ilegal.

Mal foram conhecidas as penas aplicadas – que, apesar de tudo, não contemplaram a figura de rebelião, que o tribunal deixou cair e que poderia ter agravado ainda mais as penas (entre 13 e nove anos de prisão) – e tal como esperavam todos os analistas, os catalães saíram às ruas, principalmente em Barcelona, e com eles chegou a violência.

Parte das manifestações dirigiu-se para o Aeroporto de Barcelona – na tentativa de ‘internacionalizar’ o protesto – que em pouco tempo não tinha condições para operar, tendo os seus responsáveis cancelado dezenas e dezenas de voos. Para as imediações confluíram as forças policiais da Catalunha, que se mostraram incapazes de suster os protestos. Os ‘moços de esquadra’, como são conhecidos, tiveram de pedir reforços às forças policiais nacionais.

Foi o bastante para os protestos subirem de tom, e os relatos vindos de Barcelona começaram a endurecer: bastonadas, investidas contra os aglomerados e, como não podia deixar de ser, tiros de balas de borracha, fizeram crescer rapidamente os números dos feridos (perto das cinco centenas ao início da noite de ontem) e dos detidos (mais de 200).

Entretanto, na frente política – e enquanto o primeiro-ministro ainda em funções, o socialista Pedro Sánchez, clamava pela derrota do independentismo – as principais personalidades catalãs agitavam-se: Carles Puigdemont, exilado e um dos personagens que estaria no tribunal juntamente com os acusados se não tivesse fugido para a Bélgica, foi dos primeiros a condenar as penas e a afirmar que a decisão do tribunal era um atentado à democracia.

Também o presidente do Parlamento da Catalunha, Roger Torrent – militante da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC), o mesmo partido de parte dos acusados, entre eles Oriol Junqueras – protestou contra as penas aplicadas e pediu uma reunião urgente tanto com Pedro Sánchez como com o rei Filipe VI, para debater a situação criada e a urgência de estancar os conflitos na Catalunha.

Para os observadores, contudo, nada indica que os conflitos venham a descer de tom: os manifestantes, entre espontâneos e outros, citados por várias reportagens de rua, afirmam que não vão desistir das manifestações e prometem manter os protestos até que as penas decretadas sejam suspensas.

Na fase de pré-campanha eleitoral com vista às eleições novembro, um conflito em curso na Catalunha era tudo o que Pedro Sánchez não precisava. Os partidos independentistas foram parceiros de Sánchez até ao debate do Orçamento de Estado para 2019 e o primeiro-ministro está por isso ‘entalado’ num dossiê de que não tem forma de sair airosamente.

O conflito não tem como deixar de estender as suas consequências às eleições e tudo indica que serão os partidos do lado direito do espectro político que sairão a ganhar. Recorde-se que o independentismo está em ‘baixa’ em toda a Espanha – as últimas sondagens indicam que até na Catalunha está a perder adeptos – e que a direita defendeu sempre uma resposta bem mais musculada que a esquerda às tentações separatistas, tanto na Catalunha como no País Basco.

Nas últimas semanas, Albert Rivera, presidente do Ciudadanos e ele próprio um catalão, pediu repetidamente a Pedro Sánchez que recuperasse o famoso Artigo 115 – que na prática suspende a autonomia regional e que Rajoy decretou na sequência do referendo de outubro de 2017. Sánchez não lhe fez a vontade, mas o ainda primeiro-ministro tem vindo a traçar uma rota de cada vez maior distanciamento com os independentistas, precisamente, dizem os analistas, na tentativa de não sair ‘chamuscado’ com a revolta que haveria de resultar, como sucedeu, das penas de prisão que, todos sabiam, iriam sair do tribunal.
Bruxelas, entretanto, faz o mesmo que tem feito desde que a questão da Catalunha regressou – se é que algum dia saiu – das agendas políticas: não comenta. Sendo certo que as últimas palavras sobre a matéria, arrancadas ‘a ferros’ quando foram feitas as prisões, devem manter-se atuais: a União não apoia qualquer separatismo dado que é um caso de política nacional e, a acontecer uma secessão, quem decidir sair deixará de imediato de ser membro da União.

Por outro lado, o tribunal decidiu ainda avivar ou recordar que sobre Carles Puigdemont impende um mandato de captura internacional, pelo que aquele órgão de poder espanhol fica à espera que as autoridades competentes do país onde o antigo presidente da Generalitat está exilado proceda em conformidade.

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