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Comissão de inquérito à Caixa ouve hoje Eduardo Paz Ferreira

A nova comissão de inquérito à Caixa vai ouvir nesta quarta-feira, 3 de abril, o antigo presidente do conselho fiscal do banco. Eduardo Paz Ferreira incluiu nos seus pareceres alertas de risco de “fraudes e erros”, mas considera que não tiveram grande tradução de medidas, nomeadamente do Ministério das Finanças, para quem estes relatórios eram enviados.
Cristina Bernardo
3 Abril 2019, 07h45

O antigo presidente do conselho fiscal da Caixa Geral de Depósitos (CGD), vai hoje ao Parlamento para ser ouvido na II Comissão de Inquérito à Gestão da CGD, criada após divulgação de relatório à gestão da Caixa entre 2000 e 2015, que concluiu por negócios ruinosos que geraram perdas superiores a 1,6 mil milhões devido, nomeadamente, a decisões de crédito pouco fundamentadas. Eduardo Paz Ferreira é ouvido pelos deputados na sequência de alertas do Revisor Oficial de Contas (ROC), em 2007, para riscos de “fraudes e erros” no controlo interno em áreas como a concessão de crédito, que constam consta do parecer do conselho fiscal (CF) da Caixa, então liderado por Paz Ferreira.

É sobre estes alertas que foram ignorados pelo regulador, banco e tutela, que a nova CPI à gestão de Caixa vai ouvir hoje Eduardo Paz Ferreira que incluiu estes avisos nos pareceres do órgão de fiscalização do banco público que liderou, tal como o Jornal Económico revelou a 1 de fevereiro. Segundo este responsável,  a tutela, o ministério das Finanças, não tomou a devida atenção para os riscos assinalados. Segundo Paz Ferreira, que na CGD presidiu ao conselho fiscal entre 2007 e 2010 e, posteriormente, à comissão de auditoria entre 2011 e 2015, os alertas “não tiveram grande tradução de medidas, nomeadamente do Ministério das Finanças, para quem estes relatórios eram enviados”.

Em causa estão os alertas da sociedade de revisores oficiais de contas (SROC), Oliveira Rego e Associados, cujo responsável foi ontem ouvido na nova CPI à Caixa, para o risco de “fraudes e erros” sem serem detectados devido a “limitações” no controlo interno em áreas como a concessão de crédito, e que perduraram durante sete anos, não tendo tido a devida atenção e acompanhamento do supervisor e dos sucessivos governos até 2014, de acordo com os relatórios e contas do banco do Estado.

Foi em 2007 que o ROC da Caixa, Oliveira Rego, alertou para o risco de “fraudes ou erros” poderem ocorrer sem serem detectados devido às limitações do sistema de controlo interno (SCI) do banco público nas áreas de gestão de risco, compliance e auditoria interna.

Este alerta surgiu na administração da Caixa liderada por Carlos Santos Ferreira que ao Jornal Económico recusou qualquer comentário. O aviso do ROC acabou também por não merecer a devida atenção do governo da altura, chefiado por José Sócrates e pelo Banco de Portugal (BdP), então liderado por Vítor Constâncio. Neste caso, apesar de instruções do supervisor, em 2008, para reforço do SCI, no final de 2015 permaneciam ainda falhas nos procedimentos internos do banco que se traduziram num aumento grave da exposição da CGD ao risco, tal como a EY assinalou na auditoria  à gestão da Caixa.

O aviso do ROC terá ainda caído em saco roto na  administração da Caixa ao não se ter traduzido em medidas concretas que resolvessem as deficiências de controlo, nomeadamente nos procedimentos de concessão de crédito, detectadas em 2007. Após esta data, seguiram-se sete anos de recomendações à CGD para melhorar e acompanhar a evolução do controlo interno.

No parecer do órgão social responsável pela fiscalização da CGD, que consta do relatório e contas do banco, Paz Ferreira começa por reproduzir que, em termos gerais, o ROC considera que o ambiente de controlo interno existente no banco “é adequado à dimensão e à natureza e risco das actividades desenvolvidas”. Mas acaba por deixar um aviso claro: “no entanto, o ROC salienta que foram identificadas algumas situações de excepção e apresentadas recomendações resultantes da percepção que obteve do sistema de controlo interno e alerta para o facto de, tendo em conta as limitações inerentes aos sistemas de controlo interno, fraudes ou erros podem ocorrer em serem detectados”.

 

Paz Ferreira critica tutela

O JE questionou Eduardo Paz Ferreira sobre o seguimento que teve o alerta do ROC em 2007, tendo o então presidente do CF considerado que a tutela, o ministério das Finanças, não tomou a devida atenção para os riscos assinalados.

“Cumprimos os nossos deveres, fazendo os alertas”, afirma Paz Ferreira, acrescentando que, no entanto, “não tiveram grande tradução de medidas, nomeadamente do Ministério das Finanças, para quem estes relatórios eram enviados”. Uma crítica refutada pelo então ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, que remeteu para o seu ex-secretário de Estado das Finanças o acompanhamento da CGD. Já Carlos Costa Pina diz a este respeito que “tudo que eram recomendações à época que vieram ao conhecimento do acionista, não eram desconsideradas, mas eram dirigidas à administração do banco”.

O então líder do órgão de fiscalização da CGD vai, no entanto, mais longe ao afirmar que, na sua percepção, “os relatórios eram depositados numa pilha de uma qualquer secretária nas Finanças sem ser lidos”.

 

ROC diz que alertas foram enviados ao BdP

O JE questionou Oliveira Rego, responsável pela SROC da Caixa até 2015, sobre se houve alguma resposta em concreto da administração do banco após o alerta que fez para o risco de “fraudes e erros” sem serem detetados. Em resposta, o responsável limitou-se a avançar que a sua opinião era comunicada anualmente ao órgão fiscalizador do banco e ao BdP.

“No âmbito das suas atribuições, a nossa sociedade comunicava ao Conselho Fiscal e ao Banco de Portugal, anualmente e até ao dia 30 de junho, a sua opinião sobre o Sistema de Controlo Interno da entidade fiscalizada”, afirmou ao JE Oliveira Rego. Este responsável  recusou-se a esclarecer que “situações de excepção” foram detectadas. A este respeito afirma apenas: “o conteúdo da nossa opinião destinava-se àquelas entidades, é confidencial, e só elas poderão fazer utilização do mesmo”.

O JE sabe, porém, que os alertas do ROC incidiram sobre os circuitos de controlo interno e procedimentos de operações relacionadas com a análise de risco, nomeadamente a concessão de crédito. A este respeito, fonte próxima ao processo assegura: ”não existiam circuitos com fiabilidade necessária para evitar, por exemplo, créditos ruinosos, como aqueles assinalados na auditoria da EY”.

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