Em 2015, os países da ONU aprovaram a Agenda 2030 da qual constam 17 Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS). Entre estes encontram-se a erradicação da pobreza, a redução das desigualdades, a produção e consumo sustentáveis, a promoção da igualdade de género, o acesso a energia verde a um preço razoável, o acesso a água e saneamento, o combate às alterações climáticas, entre outros.

Tratando-se de desígnios prosseguidos, em primeira linha, por governos e organizações intergovernamentais, a consciência de que o esforço e o compromisso destes não basta, levou a ONU a incluir entre os ODS, as parcerias para o desenvolvimento, apelando ao envolvimento do setor privado. Uma parte destes objetivos reflete, pois, uma expetativa de colaboração empresarial, incluindo entre concorrentes, com vista a ultrapassar desafios tão exigentes como o da preservação dos oceanos ou a erradicação do tráfico humano para trabalho escravo ou trabalho infantil em determinadas indústrias.

Sucede que embora diversos estudos sugiram que as empresas estão disponíveis para colaborar na concretização da Agenda 2030, não é claro que as regras de concorrência permitam certas parcerias entre concorrentes para tornar o mundo mais sustentável. Imagine-se que duas empresas concorrentes celebram um acordo para aumentar o preço de um produto particularmente poluente, desincentivando assim a sua produção e consumo. Ou que um fabricante de um produto proíbe os seus distribuidores de o comercializarem fora do território que lhes foi atribuído alegando a redução de emissões de CO2 associadas aos transportes. Questionadas pelas autoridades de concorrência estas alegariam que o seu único objetivo era o de tornar o mundo mais sustentável. Seria uma justificação aceitável e compatível com as normas aplicáveis? As opiniões dividem-se.

É sabido que o normal funcionamento da concorrência num mercado garante aos consumidores mais inovação, melhores produtos e preços mais baixos. Num mercado onde não é possível competir ou em que as empresas celebrem pactos para não concorrer, é provável que a inovação e a qualidade diminuam e os preços subam. As normas de concorrência servem para garantir que o mercado funciona e que os consumidores colhem os respetivos benefícios. Por isso, estas regras têm sido interpretadas tomando em consideração os efeitos do comportamento das empresas no mercado em questão. Outros possíveis impactos, nomeadamente na sociedade em geral (por exemplo, o contributo para combater as alterações climáticas) não são, em princípio, atendidos.

Refira-se porém que uma crescente corrente de académicos, advogados e até de autoridades de concorrência tem defendido que as normas de concorrência não impedem parcerias para promover a sustentabilidade, até porque a correta leitura dos Tratado Europeus obriga já a aplicar estas regras tendo em conta os objetivos da União, onde se incluem o desenvolvimento sustentável e a melhoria da qualidade do ambiente. Assim, a consideração dos efeitos dos comportamentos na sociedade estaria já prevista e cooperações para a sustentabilidade teriam já cabimento válido à luz das normas de defesa da concorrência, não sendo necessárias adaptações de maior.

Em qualquer caso, e ainda que as leis de concorrência não tenham que necessariamente ser vistas como um obstáculo incontornável a pactos para a sustentabilidade, importa não perder de vista que estas foram concebidas para endereçar efeitos em determinados mercados e não na sociedade em geral. A utilização das regras de concorrência para endereçar acordos desta natureza sem outras ferramentas normativas, terá, por isso, um claro prejuízo para empresas e consumidores. Para empresas porque aumenta a incerteza sobre a admissibilidade de certos comportamentos, dada a inexistência de regras claras aplicáveis. Para consumidores, porque não existindo uma moldura analítica adequada para distinguir as parcerias que merecem proteção das restantes, o risco de surgirem cartéis disfarçados de pactos de promoção da sustentabilidade aumentará exponencialmente (greenwashing).

O caminho passará, pois, por regular e criar awareness. Regular porque a existência de regras claras que forneçam às empresas a certeza jurídica necessária para contribuírem para um mundo mais sustentável é indispensável. Criar awareness porque, com esta, o normal funcionamento do mercado pode contribuir para o desenvolvimento sustentável. Como? Levando consumidores e investidores a “votar com a sua carteira”, escolhendo as empresas com maior compromisso com a sustentabilidade, colocando assim o tema da sustentabilidade nas suas agendas.

Com regras claras e o reforço da consciência social será possível o setor público, em conjunto com o setor privado e a sociedade civil contribuírem de forma significativa para a concretização dos ODS. E qual o papel das normas de concorrência? Aplicam-se aos pactos de sustentabilidade não previstos e admitidos pela regulação. Assim, promove-se a sustentabilidade, mas não se sacrifica a concorrência.