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Credores ameaçam tomar controlo da Brisal

Credores exigem 326 milhões à Brisal e uma redução do ‘fee’ anual de 12 milhões que a Brisa recebe pela manutenção da A17. Estado terá de validar ‘step in’. Brisa rejeita estratégia dos fundos – que pretendem retorno de 269% – e quer acordo que garanta viabilidade económica da concessão.
24 Março 2019, 16h00

Os credores da Brisal, subsidiária da Brisa que detém a concessão da A17, admitem pedir autorização ao Estado para assumirem o controlo desta concessão, à semelhança do que já foi feito na Auto-Estradas do Douro Litoral (AEDL), apurou o Jornal Económico. Este será o caminho escolhido se não for possível um acordo com o grupo liderado por Vasco de Mello.

O grupo de credores da Brisal é constituído pelo Deutsche Bank, JP Morgan e os fundos SVP Global e Cross Ocean, entidades que estão também na guerra em torno da dívida da AEDL. Estes investidores compraram a dívida de 592 milhões de euros que a Brisal tinha para com vários bancos, com um desconto de 79,9%, o que significa que pagaram 121 milhões de euros. Ao que o Jornal Económico apurou, propõem à Brisal um desconto de 45% sobre a dívida inicial, o que representa um encaixe de 326 milhões de euros. O mesmo é dizer que esperam um retorno de 269% sobre o montante investido.

Além disso, os credores exigem uma redução significativa do fee anual de 12 milhões de euros que a Brisa recebe como contrapartida da manutenção da autoestrada gerida pela Brisal, que liga a Marinha Grande a Mira, numa extensão de 92,7 quilómetros. “É com este valor anual relativo à manutenção que a Brisa ganha dinheiro com a concessão. É um valor superior aos que são praticados em concessões no estrangeiro, o que pode ser entendido como uma forma de dividendo encapotado”, disse ao Jornal Económico uma fonte próxima das negociações, que pediu para não ser identificada.

O Jornal Económico tentou obter esclarecimentos junto do grupo de credores, mas tal não foi possível até ao fecho da edição. Igualmente contactada, fonte oficial da Brisa admitiu a existência de negociações com este grupo de credores, mas não confirmou os valores e escusou-se a fazer quaisquer comentários adicionais.

Porém, a posição da concessionária, ao longo dos últimos meses, tem sido clara. A Brisa considera que os valores exigidos pelos fundos – tanto no caso da AEDL como da Brisal – não são economicamente viáveis nem razoáveis, face à situação atual de ambas as concessões. Daí entender que está a lidar com fundos “abutre”, que se aproveitaram da crise em Portugal e da saída de cena apressada da banca, nos últimos anos, para tentar obter retornos elevados.

O grupo, que neste tema tem sido representado pelo administrador Daniel Amaral, partner do fundo Arcus (acionista de referência da Brisa), está disponível para um entendimento que passe pela redução do fee anual e pelo pagamento de parte do valor exigido pelos credores, assegurando-lhes algum retorno face ao valor investido, mas defende que tal deve ser feito com números razoáveis, que permitam manter a viabilidade económica da concessão e defender o interesse público.

Estado será chamado a intervir em caso de impasse

Persistindo o impasse, os credores da Brisal admitem adotar as mesmas medidas que foram tomadas na AEDL, assumindo o controlo da concessão, sabe o Jornal Económico. Porém, ao contrário do que sucede na Douro Litoral, o contrato de concessão da Brisal só permite o chamado step in com a autorização do Estado.

Ao que o Jornal Económico apurou, os credores da Brisal ainda não falaram com a tutela a este respeito, mas admitem fazê-lo se as negociações com a Brisa não derem frutos e consideram que têm todas as capacidades técnicas, financeiras e de gestão necessárias para assumirem a concessão, pelo que não deverão existir, em seu entender, argumentos jurídicos que impeçam o step in.

Posição oposta tem a Brisa. A 18 de janeiro, Daniel Amaral afirmou ao Jornal Económico que “o Estado é o concedente e é a ele que cabe decidir sobre estas concessões, por isso nunca será simples assumir as concessões que nos foram atribuídas”. E adiantou: “Se isso acontece nos EUA, em Portugal as coisas não funcionam assim, nem há registo de comportamentos semelhantes por parte de fundos abutre”. Seguindo esta argumentação, a Brisa colocou uma providência cautelar para tentar reverter o step in na AEDL, aguardando-se ainda a decisão do tribunal. Nesta concessão, que inclui as autoestradas A32, A41 e A43, está em causa uma dívida bancária de mil milhões de euros, que foi comprada pelo SVP, Cross Ocean e outros fundos com um desconto de 79,9%. Estes credores exigem 400 milhões à AEDL, bem como a redução do fee de 11 milhões de euros que a Brisa recebe, todos os anos, como contrapartida pela manutenção das auto stradas.

Entretanto, os fundos nomearam uma nova administração para a AEDL, liderada por José Custódio dos Santos, ex-CEO da MSF Concessões e ex-CEO da Auto-Estradas do Atlântico e Auto-Estradas do Litoral Oeste. Para presidente do conselho de administração foi nomeado Andy Pearson, ex-CEO da autoestrada M6, no Reino Unido. A escolha destes dois nomes com créditos firmados no setor é vista, no mercado, como uma forma de combater a ideia, transmitida pela Brisa, de que se trata de uma estratégia à “abutre”. Apesar de a gestão ter mudado, a operação e manutenção continua a ser responsabilidade da Brisa, no âmbito do contrato que permanece em vigor.

Artigo publicado na edição nº1979 de 8 de março do Jornal Económico

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